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sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Espreita


As habilidades da espreita e do sonhar são os dois pilares do caminho de evolução dos toltecas do Antigo México. A espreita se relaciona fortemente, além do sonhar, com muitas outras “unidades de significado” deste conhecimento a saber: o tonal, o ponto de aglutinação, o pequeno tirano, a impecabilidade, a importância pessoal, os hábitos e rotinas, a loucura controlada, a energia sexual, a consciência intensificada, a recapitulação, e por aí afora...
A arte da espreita, já que lida com pessoas e comportamento, por um lado é aparentemente exterior, mas por outro lado tem raízes profundas com o lado “oculto” do ser humano, incompreensível à razão habitual, que é o corpo energético. A arte da espreita está ligada ao coração, assim como a mestria da consciência está ligada á mente, e a mestria do intento ao espírito. O seu propósito é deslocar gradual, firme e seguramente o ponto de aglutinação e fixá-lo além do chamado inventário humano. A espreita pode ser aplicada a tudo, mas espreitar a sí mesmo é a sua expressão mais fina e valiosa.
Se fôssemos resumir os pontos importantes das considerações sobre a espreita, diríamos:
- É a habilidade de fixar o ponto de aglutinação numa nova posição
- É uma batalha silenciosa para “conseguir os objetivos” da melhor forma em cada situação.
- É um controle sistemático do comportamento
- É uma forma de relacionar-se com as pessoas, mas sua atuação objetiva “afinar o próprio praticante”.
- É colocar-se em situações limite (perigo, medo, saturação sensorial, agressão)
- A espreita é ligada ao tonal, corpo direito, primeira atenção. O sonho é o oposto (nagual, corpo esquerdo, segunda atenção)
- Ela move devagar e mantém o ponto de aglutinação na nova posição (coesão). O sonho é o oposto
- As mulheres são naturalmente mais afeitas á espreita que os homens
- É regida por 7 princípios (vide abaixo)
- Tem 4 passos de aprendizado: implacabilidade, esperteza, paciência e doçura
- Sua estratégia mais eficaz tem 6 pontos: controle, disciplina, paciência, oportunidade, vontade e o pequeno tirano
- Espreita-se tudo, até as próprias fraquezas, mas o “estado da arte” é espreitar a sí mesmo
- Seus resultados são: rir de si mesmo, não se levar a sério, capacidade infinita de improvisação
- A espreita é o enigma do coração; a consciência é o da mente; o intento é o do espírito
- É um comportamento secreto, furtivo e enganoso para produzir um choque (em si mesmo)
- Para espreitar é preciso ter um propósito, ser impecável, sair da auto-importância, banir hábitos e praticar a loucura controlada (fingir-se imerso na ação, mas sem se identificar, nem ser notado)
- A recapitulação é o ponto forte dos espreitadores. É uma forma especializada de espreitar as rotinas internas.
- A espreita é melhor aprendida em consciência intensificada, sem o inconveniente do inventário
- Liga-se á energia sexual de forma individual. O sonhador usa a energia sexual para sonhar. O espreitador é o oposto

· “A arte da espreita é um conjunto de procedimentos e atitudes que possibilita a um guerreiro conseguir o melhor de qualquer situação concebível. “
A Roda do Tempo, pág. 198

1. “O primeiro princípio da arte da espreita é que os guerreiros escolhem o campo de batalha. Um guerreiro nunca vai para a batalha sem saber o que o cerca.
2. Descartar tudo que não é necessário é o segundo princípio da arte da espreita. Um guerreiro não complica as coisas. Seu objetivo é ser simples.
3. Ele aplica toda a concentração que tem para decidir se entra ou não na batalha, pois qualquer batalha é uma batalha por sua vida. Este é o terceiro princípio da arte da espreita. Um guerreiro deve estar disposto e pronto para travar sua última batalha aqui e agora. Mas não de uma maneira descuidada.
4. Um guerreiro relaxa e se abandona; ele nada teme. Só então os poderes que guiam os seres humanos abrem o caminho para o guerreiro e o ajudam. Só então. Este é o quarto princípio da arte da espreita.
5. Quando diante de dificuldades com as quais não podem lidar, os guerreiros recuam por um momento. Eles deixam a mente vagar. Ocupam seu tempo com alguma outra coisa. Qualquer coisa serve. Este é o quinto princípio da arte da espreita.
6. Os guerreiros comprimem o tempo este é o sexto princípio da arte da espreita. Mesmo um instante conta. Numa batalha por sua vida, um segundo é uma eternidade, uma eternidade que pode decidir o resultado final. Os guerreiros visam ao sucesso, portanto comprimem o tempo. Os guerreiros não desperdiçam um só instante.
7. Para aplicara sétimo princípio da arte da espreita, é preciso aplicar os outros seis; um espreitador nunca se lança para a frente. Ele sempre olha para frente por detrás das cenas.”
A Roda do Tempo, págs. 217 a 221
.
· “Disse que seu benfeitor considerava as três técnicas básicas da espreita - o engradado, a lista de acontecimentos a serem recapitulados, e a respiração do espreitador - como sendo as tarefas talvez mais importantes de um guerreiro. Ele achava que uma recapitulação profunda era o meio mais eficiente para se perder a forma humana. Portanto, seria fácil para os espreitadores, depois de recapitularem suas vidas, fazer uso de todos os não fazeres do seu eu, tais como apagar sua história pessoal, perder a auto-importância, quebrar as rotinas, e assim por diante.
Informou que seu benfeitor deu a todos eles exemplos do que queria dizer, primeiro demonstrando suas premissas, e depois expondo os princípios do guerreiro nas suas ações. No seu caso, como ele era um mestre na arte de espreitar, engendrou o plano da sua doença e sua cura, que não só foi coerente com o método do guerreiro mas também foi uma introdução magistral aos sete princípios da arte de espreitar. Primeiro atraiu Florinda a seu próprio campo de batalha, onde ela ficou à sua mercê; forçou-a a descartar-se do que não fosse essencial; ensinou-lhe a colocar sua vida nos eixos, através de uma decisão; ensinou-lhe a relaxar; fez com que ela desenvolvesse um espírito diferente de otimismo e autoconfiança para que pudesse reorganizar seus recursos; ensinou-lhe a condensar o tempo; e finalmente mostrou-lhe que um espreitador nunca se põe à frente das coisas.
Florinda se impressionava muito com o último princípio. Para ela ele resumia tudo o que ela queria dizer a mim nas suas instruções de última hora.
- Meu benfeitor era o chefe - disse Florinda. - Assim mesmo, olhando para ele ninguém acreditaria. Sempre usava uma de suas guerreiras como fachada, misturando-se livremente entre os doentes, fingindo ser um deles, ou fazendo-se passar por um velho idiota varrendo as folhas secas com uma vassoura improvisada.
Florinda explicou que para aplicar o sétimo princípio da arte de espreitar, tem-se de aplicar os outros seis. Assim, seu benfeitor ficava sempre por trás dos bastidores. Graças a isso ele era capaz de evitar ou aparar conflitos. Se houvesse discórdia, nunca era com ele e sim com a guerreira que estivesse servindo de fachada.
- Espero que você tenha percebido a essa altura - continuou ela - que só um mestre em espreita pode ser um mestre em loucura controlada. A loucura controlado não significa o estudo das pessoas. Significa, como meu benfeitor explicou, que os guerreiros aplicam os sete princípios básicos da arte de espreitar a tudo o que fazem, desde os atos mais simples até situações sérias de vida e de morte. A aplicação desses princípios redunda em três resultados. O primeiro é que os espreitadores aprendem a nunca se levarem a sério; aprendem a rir de si próprios. Se não se importam de parecer bobos, podem enganar a qualquer um. O segundo é que aprendem a ter uma paciência sem fim. Nunca estão com pressa, nunca se desesperam. E o terceiro é que aprendem a desenvolver uma capacidade infinita de improvisação.”
O Presente da Águia, pág. 230

· “Em seu esquema de ensino, o qual foi desenvolvido por feiticeiros de tempos antigos, havia duas categorias de instrução. Uma era chamada "ensinamentos para o lado direito", desenvolvida no estado normal de consciência. A outra era chamada "ensinamentos para o lado esquerdo" , posta em prática apenas em estados de consciência intensificada.
Essas duas categorias permitiam que os professores ensinassem a seus aprendizes em três áreas de habilidades: a mes­tria da consciência, a arte da espreita e a mestria do intento.
Essas três áreas de habilidade, são os três enigmas que os feiticeiros encontram em sua busca ao conhecimento.
A mestria da consciência é o enigma da mente, a perplexi­dade que os feiticeiros experimentam quando reconhecem o es­pantoso mistério e propósito da consciência e da percepção.
A arte da espreita é o enigma do coração o desconcerto que os feiticeiros sentem ao se tornarem conscientes de duas coi­sas: primeiro, que o mundo parece para nós inalteravelmente objetivo e factual, por causa das peculiaridades de nossa cons­ciência e percepção segundo, que se diferentes peculiaridades de percepção entram em jogo, as próprias coisas do mundo que parecem tão inalteravelmente objetivas e factuais mudam.
A mestria do intento é o enigma do espírito, ou o paradoxo do abstrato - os pensamentos e ações dos feiticeiros projeta­dos além de nossa condição humana.
A instrução de Don Juan quanto à arte da espreita e à mes­tria do intento dependia de sua instrução sobre a mestria da consciência, que era a pedra fundamental de seus ensinamen­tos, que consistem das seguintes premissas básicas:
1. O universo é uma aglomeração infinita de campos de energia, semelhantes a filamentos de luz
2. Esses campos de energia, chamados de "emanações da Águia" , radiam de uma fonte de proporções inconcebíveis, me­taforicamente denominada Águia
3. Os seres humanos também são compostos de um nú­mero incalculável dos mesmos campos de energia filamento­sos. Essas emanações da Águia formam uma aglomeração encapsulada que se manifesta como uma bola de luz do tama­nho do corpo da pessoa com os braços estendidos lateralmente, como um ovo luminoso gigante
4. Apenas um grupo muito pequeno de campos de ener­gia no interior dessa bola luminosa são acesos por um ponto de intenso brilho localizado na superfície da bola
5. A percepção ocorre quando os campos de energia desse pequeno grupo imediatamente ao redor do ponto de brilho es­tendem sua luz para iluminar campos de energia idênticos no exterior da bola. Uma vez que os únicos campos de energia per­ceptíveis são aqueles iluminados pelo ponto brilhante, esse ponto é chamado "o ponto onde a percepção é aglutinada" , ou simplesmente "o ponto de aglutinação"
6. O ponto de aglutinação pode ser movido de sua posi­ção usual sobre a superfície da bola luminosa para outra posi­ção na superfície ou no interior. Uma vez que o brilho do ponto de aglutinação pode iluminar qualquer campo de energia com o qual entrar em contato, quando se move para uma nova po­sição ilumina de imediato novos campos de energia, tornando-os perceptíveis. Esta percepção é conhecida como ver
7. Quando o ponto de aglutinação se desloca, torna pos­sível a percepção de um mundo inteiramente diferente – tão objetivo e factual como aquele que normalmente percebemos. Os feiticeiros entram nesse outro mundo para obter energia, po­der, soluções para problemas gerais e particulares, ou para en­carar o inimaginável
8. Intento penetrante que nos faz perceber. Não nos tor­namos conscientes porque percebemos antes, percebemos como resultado da pressão e intrusão do intento
9. O objetivo dos feiticeiros é atingir um estado de cons­ciência total de modo a experimentar todas as possibilidades de percepção disponíveis ao homem. Esse estado de consciên­cia implica mesmo uma maneira alternativa de morrer.”
O Poder do silêncio, pág. 16

· “- O primeiríssimo princípio da espreita é que um guer­reiro espreita a si mesmo. Espreita a si mesmo implacavelmente, com esperteza, paciência e docilmente.
Eu queria rir mas ele não me deu tempo. De modo muito sucinto definiu a espreita como a arte de usar o comportamento de maneiras novas para propósitos específicos. Disse que o com­portamento humano normal no mundo da vida cotidiana era rotina. Qualquer comportamento que escapava à rotina cau­sava um efeito incomum em nosso ser total. Esse efeito inco­mum era o que os feiticeiros buscavam, porque era cumulativo.
Explicou que os feiticeiros videntes dos tempos antigos, através de sua visão, primeiro haviam notado que o compor­tamento incomum produzia um tremor no ponto de aglutina­ção. Breve descobriram que se o comportamento incomum era praticado sistematicamente e dirigido com sabedoria, forçava no final o movimento do ponto de aglutinação.
- O desafio real para aqueles feiticeiros videntes - con­tinuou Don Juan - era encontrar um sistema de comporta­mento que não fosse mesquinho nem caprichoso, mas que combinasse a moralidade e o senso de beleza que diferencia os videntes feiticeiros das bruxas comuns.
Parou de falar, e todos olharam para mim como que bus­cando sinais de fadiga em meus olhos ou rosto.
- Qualquer um que tenha sucesso em mover seu ponto de aglutinação para uma nova posição é um feiticeiro - continuou Don Juan. - E a partir dessa nova posição, pode fazer todos os tipos de coisas boas e más aos seus semelhantes. Ser um feiticeiro, portanto, pode ser o mesmo que ser um sapateiro, ou um padeiro. A causa dos feiticeiros videntes é ir além dessa posição. E para fazê-lo necessitam de moralidade e beleza.
Disse que, para os feiticeiros, a espreita era o alicerce sobre o qual tudo o mais que faziam era construído.”
O Poder do Silêncio, pág. 92

· “- A espreita é uma das duas maiores realizações dos novos videntes. Eles decidiram que deveria ser ensinada ao nagual dos dias modernos quando seu ponto de aglutinação já se tivesse deslocado bem profundamente para o lado esquerdo. O motivo desta decisão é que um nagual precisa aprender os princípios da espreita sem o incômodo do inventário humano. Afinal, o nagual é o líder de um grupo, e para liderá-lo deve agir rapidamente, sem ter que pensar primeiro.
"Outros guerreiros podem aprender a espreitar em sua consciência normal, embora seja aconselhável que o façam em consciência intensificada... não tanto por causa do valor da consciência intensificada, mas porque isto imbui a espreita de um mistério que ela na verdade não possui; espreitar é meramente um comportamento diante das pessoas."
Disse ainda que eu podia agora compreender que mudar o ponto de aglutinação era a razão pela qual os novos videntes atribuíam um valor tão alto à interação com os pequenos tiranos. Os pequenos tiranos forçavam os videntes a usar os princípios da espreita e, ao fazê-lo, ajudavam-nos a deslocar seus pontos de aglutinação. .
Perguntei-lhe se os antigos videntes sabiam alguma coisa sobre os princípios da espreita.
- A espreita foi desenvolvida exclusivamente pelos novos videntes - falou, sorrindo. - São os únicos videntes que tiveram de lidar com pessoas. Os antigos estavam tão enredados em seu sentido de poder que só foram perceber que as pessoas existiam quando elas começaram a bater-lhes nas cabeças. Mas você já sabe de tudo isso. .
Dom Juan disse em seguida que o domínio da intenção, juntamente com o domínio da espreita são as duas obras-primas dos novos videntes, que marcam o advento dos videntes dos dias de hoje.”
O Fogo Interior, pág. 164


· "Uma das grandes manobras dos espreitadores é contrapor o mistério à estupidez que há em cada um de nós." Explicou que as práticas da espreita não são coisas para alguém se rejubilar; na verdade, são completamente censuráveis. Sabendo disso, os novos videntes percebem que seria contra o interesse geral discutir ou praticar os princípios de espreita em consciência normal. Apontei-lhe uma incongruência. Ele dissera que não há meios de os guerreiros agirem no mundo enquanto se encontram em consciência intensificada, e também que espreitar é simples­mente comportar-se diante de pessoas de maneiras específicas. As duas afirmações contradiziam-se mutuamente.
- Por não ensiná-la em consciência normal referia-me apenas a ensiná-la a um nagual - disse ele. - O propósito de espreitar é duplo: primeiro, deslocar o ponto de aglutinação tão firmemente e a salvo quanto possível, e nada pode fazê-lo tão bem quanto a espreita; segundo, imprimir seus princípios a um nível tão profundo que o inventário humano seja ultrapassado, assim como a reação natural de recusar e julgar algo que possa ser ofensivo à razão.
Falei que duvidava sinceramente que eu conseguisse julgar ou recusar algo dessa forma. Riu e disse que eu não podia ser uma exceção, que iria reagir como todos os outros quando ouvisse sobre os feitos de um mestre espreitador, como seu benfeitor, o nagual Julian.
- Não estou exagerando quando lhe digo que o nagual Julian era o mais extraordinário espreitador que jamais conheci ­disse Dom Juan. - Você já ouviu de todos sobre seus talentos de espreita. Mas nunca lhe contei o que ele fez comigo.”
O Fogo Interior, pág. 178

· “- A arte de espreitar é aprender todos os truques de seu disfarce - retrucou Belisário, não dando atenção ao que Don Juan lhe dizia. - E devem ser apreendidos com tanta eficiên­cia que ninguém perceba o seu disfarce. Para isso, você precisa ser implacável, esperto, paciente e agradável.”
O Poder do Silêncio, pág. 78

· “- Essa sensação de estar arrolhado é experimentada por todo ser humano. É um lembrete da existência de nossa conexão com o intento. Para os feiticeiros essa sensação é ainda mais aguda, precisamente porque seu objetivo é sensibilizar seu elo de conexão até que possam fazê-lo funcionar à vontade.
"Quando a pressão de seu elo de conexão é grande demais, os feiticeiros aliviam-na espreitando a si mesmos.”
- Ainda acho que não compreendo o que quer dizer por espreitar - falei. - Mas em certo nível penso que sei exatamente o que quer dizer.
- Tentarei ajudar você a esclarecer o que sabe, então. Espreitar é um procedimento, um procedimento muito simples. Espreitar é comportamento especial que segue certos princípios.
É um comportamento secreto, furtivo, enganoso, designado a provocar um choque. E quando você espreita a si mesmo, você choca a si mesmo, usando seu próprio comportamento de um modo implacável e astucioso.
Explicou que quando a consciência de um feiticeiro ficava enredada pelo peso de suas aquisições perceptivas, o que estava acontecendo comigo, o melhor, ou talvez o único remédio, era usar a idéia da morte para proporcionar esse choque de espreita.
- A idéia da morte, portanto, é de importância monumental na vida de um feiticeiro - continuou Don Juan. - Mostrei-lhe coisas inumeráveis a respeito da morte para convencê-lo de que o conhecimento de nosso fim pendente e inevitável é o que nos dá sobriedade. Nosso engano mais caro como homens comuns é não se importar com o senso de imortalidade. É como se acreditássemos que, se não pensássemos a respeito da morte, nos pudéssemos proteger dela.”
O Poder do Silêncio, pág. 115

· “- O primeiro princípio da arte de espreitar é que os guerreiros escolhem seu campo de batalha - disse. - Um guerreiro nunca entra na batalha sem saber o que o cerca. A curandeira tinha me mostrado, na sua batalha com Celestino, o princípio da espreita. Depois ela veio para onde eu me encontrava deitada. Eu estava chorando. Era a única coisa que podia fazer. Ela pareceu preocupada; cobriu meus ombros com o cobertor, sorriu e piscou o olho para mim. "O trato continua - disse. - Volte assim que puder, se quiser viver. Mas não traga seu mestre com você, sua putinha. Venha com os que forem absolutamente necessários".
Florinda fixou os olhos em mim por algum tempo. Pelo seu silêncio concluí que ela esperava comentários da minha parte.
- Descartar tudo o que for necessário é o princípio da arte de espreitar - disse ela, sem me dar tempo de dizer nada.
O Presente da Águia, pág. 221

· “- Ela está treinando a arte de espreitar - disse Lídia. – O Nagual ensinou-nos a confundir as pessoas, para elas não nos notarem. Josefina é muito bonita e quando anda sozinha de noite, ninguém a importuna, se for feia e fedorenta, mas se ela sair como realmente é, bem, você mesmo pode dizer o que vai acontecer.
Josefina concordou com a cabeça e depois fez a careta mais feia do mundo.
- Ela consegue ficar com essa cara o dia inteiro - disse Lídia.
Argumentei que se eu morasse por ali, certamente havia de reparar mais depressa em Josefina com o seu disfarce do que se ela não estivesse disfarçada.
- Aquele disfarce foi só para você - disse Lídia, e as três se riram. - E veja como o enganou. Você reparou mais no seu filho do que nela mesma.
Lídia foi para o quarto e trouxe um embrulho de trapos que parecia uma criança embrulhada e jogou-o na mesa diante de mim.
Eu ri às gargalhadas junto com elas.
- Vocês todas têm disfarces especiais? - perguntei.
- Não. Só Josefina. Ninguém por aqui a conhece como ela é mesmo - respondeu Lídia.”
O Segundo Círculo do Poder, pág. 78

· “- Diga-me agora, qual é a arte de espreitar? - perguntei.
- O Nagual era um espreitador - disse ela, e olhou para mim. - Você deve saber disso. Ele lhe ensinou a espreitar desde o prin­cípio.
Ocorreu-me que aquilo a que ela se referia era o que Dom Juan chamava de caçador. Certamente ele me ensinara a ser caçador. Eu lhe disse que Dom Juan me ensinara a caçar e fazer armadilhas. Porém o uso que ela fazia do termo espreitador era mais preciso.
- Um caçador apenas caça - disse ela. - Um espreitador espreita qualquer coisa, inclusive a si mesmo.
- Como é que ele faz isso?
- Um espreitador impecável pode transformar qualquer coisa em presa. O Nagual me disse que podemos espreitar até as nossas próprias fraquezas.
Parei de escrever e procurei lembrar-me se Dom Juan algum dia me apresentara uma possibilidade tão nova: espreitar as minhas fraquezas. Não me recordava que ele jamais tivesse dito a coisa nesses termos.
- Como é que podemos espreitar nossas fraquezas, Gorda? - Do mesmo modo que você espreita a caça. Você estuda os seus hábitos até conhecer todos os atos de suas fraquezas e depois salta sobre elas e as pega como coelhos dentro de uma gaiola.
Dom Juan me ensinara a mesma coisa sobre os hábitos, mas no sentido de um princípio geral de que os caçadores devem ter consciên­cia. Porém a compreensão e a aplicação que ela tinha daquilo eram mais pragmáticas do que as minhas.
Dom Juan dissera que qualquer hábito era, em essência, um "ato" e que um "ato" precisava de todas as suas partes para poder funcionar. Se faltassem algumas partes, um ato se desmoronava. Por ato ele queria dizer qualquer série coerente e significativa de ações. Em outras palavras, um hábito precisava de todas as suas ações com­ponentes para poder ser uma atividade viva.”
O Segundo Círculo do Poder, pág. 167

· “Depois a Gorda descreveu como ela espreitara a sua própria fraqueza de comer exageradamente. Disse que o Nagual sugerira que ela primeiro atacasse a parte maior desse hábito, que se ligava ao seu trabalho como lavadeira; ela comia tudo o que os fregueses lhe da­vam, enquanto ia de casa em casa entregando a roupa lavada. Ela es­perava que o Nagual lhe dissesse o que devia fazer, mas ele apenas riu e caçoou dela, dizendo que assim que ele disse para ela fazer alguma coisa, ela havia de lutar para não fazê-lo. Ele disse que os seres humanos são assim; adoram que se diga o que devem fazer, mas adoram mais ainda lutar e não fazer o que se manda, e assim se con­fundem e detestam aquele que lhes falou em primeiro lugar.
Durante muitos anos ela não conseguiu pensar em nada para espreitar sua fraqueza. Mas um dia ela ficou tão farta de ser gorda que se recusou a comer durante 23 dias. Aquele foi o ato inicial que rompeu a sua fixação. Depois ela teve a idéia de meter uma esponja na boca, para fazer os fregueses acreditarem que ela tinha um dente in­feccionado e que não podia comer. O subterfúgio deu certo não apenas com os fregueses, que pararam de lhe dar comida, mas tam­bém com ela mesma, pois ela tinha a impressão de estar comendo, ao mastigar a esponja. A Gorda riu ao contar que passou anos com uma esponja metida na boca, até acabar com o hábito de comer demais.
- Foi só isso que você teve de fazer para perder o hábito? - perguntei.
- Não. Também tive de aprender a comer como uma guerreira. - E como é que uma guerreira come?
- Uma guerreira come com calma e devagar e muito pouco de cada vez. Eu costumava falar enquanto comia e comia muito depressa e uma porção de comida de cada vez. O Nagual me disse que um guerreiro come quatro bocados de comida de cada vez. Um pouco depois ele come mais quatro bocados e assim por diante.
"Um guerreiro também caminha vários quilômetros por dia. A minha fraqueza de comer nunca me deixava caminhar. Eu a venci comendo quatro bocados de hora em hora e caminhando. Às vezes eu caminhava o dia inteiro e a noite inteira. Foi assim que perdi a gor­dura nas minhas nádegas.”
O Segundo Círculo do Poder, pág. 167

· ”- Mas espreitar as suas fraquezas não é suficiente para perdê­-las - disse ela. - Você pode espreitá-las até o dia do juízo e não vai alterar nada. É por isso que o Nagual não quis dizer-me o que fazer.
O que o guerreiro precisa mesmo a fim de ser um espreitador im­pecável é ter um propósito.
A Gorda contou como tinha vivido à-toa antes de conhecer o Nagual, sem nenhum objetivo. Não tinha esperanças, nem sonhos, nem desejo de nada. Porém a oportunidade de comer estava sempre à mão, para ela; por algum motivo que ela não sabia explicar, sempre houvera bastante comida para ela, desde que nascera. Tanta mesmo que em certa ocasião ela chegou a pesar 107 quilos.
- Comer era a única coisa de que eu gostava na vida”
O Segundo Círculo do Poder, pág. 168

· “- Um feiticeiro é um tolteca quando recebeu os mistérios de espreitar e sonhar - disse ela, com displicência. - Nagual e Genaro receberam esses mistérios dos benfeitores deles e depois os conser­varam em seus corpos. Nós estamos fazendo a mesma coisa, e devido a isso somos toltecas como o Nagual e Genaro.
"O Nagual ensinou a você e a mim a sermos igualmente de­sapaixonados. Eu sou mais desapaixonada do que você porque não tenho forma. Você ainda tem a sua forma e é vazio, de modo que fica preso em cada armadilha. Mas um dia você será completo de novo e então compreenderá que o Nagual tinha razão. Ele disse que o mundo dos homens sobe e desce e as pessoas sobem e descem com seu mun­do: como feiticeiros, não temos nada de acompanhá-las em suas su­bidas e descidas.
" A arte dos feiticeiros é estar por fora de tudo e passar despercebido. E mais que tudo, a arte dos feiticeiros é nunca desperdiçar o seu poder. O Nagual me disse que o seu problema é que sempre fica preso em besteiras, como o que está fazendo agora. Tenho certeza de que vai perguntar a todos nós a respeito dos tolteca, mas não vai per­guntar a nenhum de nós sobre a nossa atenção.
O riso dela era cristalino e contagioso. Confessei que ela tinha razão. Os pequenos problemas sempre me fascinaram. Também lhe disse que não compreendia o uso que ela fazia da palavra atenção.
- Já lhe disse o que o Nagual me ensinou sobre a atenção - disse ela. - Seguramos as imagens do mundo com a nossa atenção. Um feiticeiro homem é muito difícil de treinar porque a atenção dele está sempre fechada, focalizada sobre alguma coisa. A mulher, ao con­trário, está sempre aberta porque a maior parte do tempo ela não focaliza sua atenção sobre nada. Especialmente durante a mens­truação.”
O Segundo Círculo do Poder, pág. 180

· “A aprendizagem do ensonho não ofende, o máximo que você pode fazer é não acreditar que tal coisa é possível. Por outro lado, a espreita, da maneira como praticam os bruxos, é muito ofensiva para a razão. Muitos guerreiros evitam falar sobre isso, porque não têm estômago para agüentá-lo. Na fase inicial, o aprendiz fica no fogo cruzado e se sente frustrado, não consegue sair do seu ego.
"A espreita é como uma moeda, tem duas caras. Por um lado, é a coisa mais fácil que há, e por outro, é uma técnica muito difícil, não porque seja complexa, mas porque trata de aspectos sobre si mesmas que as pessoas normalmente não querem tratar.
"A espreita induz movimentos minúsculos, mas muito sólidos, do ponto de aglutinação; não é como o ensonho que o move profundamente; mas retrai como um elástico e volta imediatamente ao que você era. Quando espreita, você segue vendo tudo igual como sempre, por isso você tentará aplicar critérios cotidianos às coisas. Se em uma dada circunstância como esta, você é forçado a alguma mudança por seu instrutor, a coisa mais certa é que você ficará ofendido ou ferido em seu orgulho e se afastará do ensino".
Perguntei qual era, então, o modo como os bruxos transmitiam essa arte.
Respondeu que, tradicionalmente, é ensinado em estado de consciência acrescentada e é deixada para o fim.
"Isso não é algo que possa ser dito logo de cara. É necessário entendê-lo nas entrelinhas. Esta parte da aprendizagem pertence aos ensinamentos para o lado esquerdo. Leva muitos anos para ser lembrado em que consiste, e outros tantos mais para poder levá-lo à prática.
"No nível em que você está agora, a única coisa que lhe permite agüentar a espreita é abordar isto com métodos de ensonho. Se em algum momento você sente que estou tocando tópicos demasiado pessoais ou as suspeitas o tomam, olhe para suas mãos ou use qualquer outro convocador que você tenha escolhido. A atenção dos ensonhos ajudará a mover sua fixação".
Encontros com o Nagual, pág. 140

· "A espreita é a atividade central de um rastreador de energia. Embora possa ser aplicado com resultados surpreendentes a nosso tratamento com as pessoas, está desenhado principalmente para afinar o próprio praticante. Manipular e dominar os outros é uma tarefa árdua, mas é incomparavelmente mais difícil dominar a nós mesmos. Por isso a espreita é a técnica que distingue o nagual.
"A espreita pode ser definida como a habilidade de fixar o ponto de aglutinação em novas posições.
"O guerreiro que espreita é um caçador. Mas, ao contrário do caçador ordinário que tem a visão fixa em seus interesses materiais, o guerreiro persegue uma presa maior: sua importância pessoal. Isso o prepara para enfrentar o desafio de lidar com seus semelhantes - algo que o ensonho não pode resolver por si só. Os bruxos que não aprendem a espreitar se transformam em pessoas mal humoradas".
"Porque?"
"Porque eles não têm a paciência para tolerar as bobagens das pessoas.
"A espreita é natural para nós devido a uma característica.de nossa herança animal: para sobreviver, todos desenvolvemos hábitos de comportamento que moldam nossa energia e nos adaptam ao meio. Estudando essas rotinas, um observador atento pode predizer com precisão o comportamento de um animal ou um ser humano em um determinado momento.
"Os guerreiros sabem que toda forma de hábito é um vício. Pode amarrá-lo ao consumo de drogas ou ir para a igreja todos os domingos; a diferença é de forma, não de essência. Da mesma maneira, quando pensamos que o mundo é razoável ou que as coisas em que acreditamos é a única verdade, estamos sendo as vítimas de um hábito que oblitera nossos sentidos, fazendo com que só vejamos o que nos seja familiar.
"As rotinas são padrões de comportamento que seguimos de um modo mecânico, embora já não tenham sentido. Para espreitar é necessário sair do imperativo da sobrevivência.
"Devido ao fato de que ele é o dono de suas decisões, um guerreiro espreitador é uma pessoa que baniu da vida dele todo o vestígio de hábito. Só tem que recuperar sua integridade energética para ser livre. E como ele tem liberdade de escolher, pode envolver-se em formas calculadas de comportamento, seja para tratar com as pessoas ou com outras entidades conscientes.
Encontros com o Nagual, pág. 142

· "Não se complique. Você está tentando caricaturizar o ensinamento. Se você quiser espreitar, observe-se a si mesmo. Todos nós somos uns excelentes caçadores, a espreita é nosso dom natural. Quando a fome aperta, ficamos mais atentos; as crianças choram e alcançam o que querem; as mulheres enrodilham os homens e os homens se vingam entre si, enganando-se em seus negócios. Espreitar é conseguir seu objetivo.
"Se você se dá conta do mundo em que vive, entenderá que manter-se atento a ele, é um tipo de espreita. Considerando que nós aprendemos isso antes que a nossa capacidade de discriminação se desenvolvesse, o damos como um fato natural e quase nunca o questionamos. Porém, todas as nossas ações, até mesmo as mais altruístas, estão, no fundo, impregnadas do instinto do caçador.
"O homem comum não sabe que espreita porque seu caráter foi subjugado pela socialização. Está convencido de que sua existência é importante; dessa forma, suas ações estão a serviço de sua importância pessoal, não do aumento de sua consciência"-
Encontros com o Nagual, pág. 145

· “Não é possível viver estrategicamente o tempo todo - respondi. - Imagine que alguém o esteja esperando, com uma carabina possante, de mira telescópica; ele poderia avistá-lo com precisão a cem metros de distância. O que você faria?
Dom Juan olhou para mim com um ar de descrença e depois deu uma gargalhada.
- O que você faria? - insisti.
- Se alguém me estiver esperando com uma carabina de mira telescópica? - disse ele, evidentemente zombando de mim.
- Se alguém estiver escondido, à sua espreita. Você não terá uma chance. Não pode deter uma bala.
- Não. Não posso. Mas ainda não entendi o que você quer provar.
- Quero provar que toda a sua estratégia não o pode ajudar, numa situação dessas.
- Mas pode, sim. Se alguém estiver à minha espreita com uma carabina possante de mira telescópica, eu simplesmente não vou aparecer.
Uma estranha realidade, pág. 171

· “As Atlantas são o nagual; são sonhadoras. Representam a ordem da segunda atenção transportada; é por isso que são tão ameaçadoras e misteriosas. São criaturas em conflito, mas não des­troem. A outra fileira de colunas, as retangulares, representa a ordem da primeira atenção, a tonal. São espreitadoras, por isso são cobertas de inscrições. São muito pacíficas e sábias, o oposto da fileira da frente.”
O Presente da Águia, pág. 18

· “As espreitadoras eram as que recebiam o impacto do mundo diário; as gerentes de negócios, as que lidavam com as pessoas. Tudo que se relacionava ao mundo de assuntos comuns passava por elas. As espreitadoras eram praticantes da loucura controlado, assim como as sonhadoras eram praticantes do sonho. Em outras palavras, a loucura controlado é a base da espreita, e os sonhos são a base do sonhar. Dom Juan disse que, de um modo geral, a maior realização de um guerreiro na segunda atenção era sonhar, e na primeira aten­ção, espreitar”
O Presente da Águia, pág. 169

· “Explicou que a recapitulação é o ponto forte dos espreitadores, como o corpo sonhador é o ponto forte dos sonhadores. Consistia em recordar sua vida até os mínimos detalhes. Para isso seu benfeitor lhe tinha dado aquele engradado como um instrumento e um símbo­lo. Era um instrumento que lhe permitia aprender a Se concentrar, pois tinha de se sentar lá durante anos até que toda sua vida tivesse passado diante dos seus olhos. E era um símbolo dos estreitos limi­tes da nossa pessoa. Seu benfeitor lhe disse que quando terminasse a recapitulação quebrasse o engradado para simbolizar que não mais mantinha as limitações da sua pessoa.
Ela disse que os espreitadores usam engradados ou caixões de terra a fim de se trancarem dentro enquanto estão revivendo, mais que simplesmente rememorando, todos os momentos de suas vidas. Os espreitadores devem recapitular suas vidas completamente, por­que a dádiva da Águia ao homem inclui a disposição de aceitar uma conscientização substituta, em vez de verdadeira, se tal substituição for uma réplica perfeita. Florinda explicou que como a consciência é o alimento da Águia, ela pode se satisfazer com uma recapitulação perfeita em lugar da consciência.
Florinda me deu então os fundamentos da recapitulação. Disse que o primeiro estágio é um breve relato de todos os incidentes da nossa vida, que se apresentam de uma maneira óbvia para exame.
O segundo estágio é uma recordação mais detalhada, que sistematicamente vai desde a época anterior ao espreitador ter se sentado dentro do engradado, e teoricamente se estende ao momento do nas­cimento.
Ela me assegurou que uma recapitulação perfeita pode mudar um guerreiro tanto, se não mais, quanto o controle total do corpo sonhador. Nesse particular, o sonho e a espreita têm a mesma finalidade, entrar na terceira atenção. É importante, entretanto, que o guer­reiro saiba e pratique os dois. Disse que para a mulher há configu­rações diferentes do corpo luminoso para se aperfeiçoar em uma ou em outra. Os homens, ao contrário, podem realizar os dois com facilidade, mas ao mesmo tempo não podem nunca chegar ao grau de eficiência que as mulheres atingem em cada arte.”
O Presente da Águia, pág. 228

· “Teoricamente, os espreitadores têm de se lembrar de cada sentimento que tiveram na vida, e esse processo se inicia com uma respiração. Ela me avisou que o que estava me ensinando eram apenas preliminares, que mais tarde, em condições diferentes, me ensinaria as complexidades do processo.
Florinda disse que seu benfeitor lhe orientou a escrever uma lista de acontecimentos a serem revividos. Falou que a técnica se iniciava com uma respirada inicial. Os espreitadores começam com o queixo sobre o ombro direito e lentamente inspiram à medida que viram a cabeça num ângulo de cento e oitenta graus. A respirada termina no ombro esquerdo. Uma vez terminada a inspiração, a cabeça volta a ficar relaxada. Eles expiram olhando para a frente.
O espreitador então pega o primeiro acontecimento da lista e se concentra, até que todos os sentimentos que nele se encerram tenham sido recontados. Enquanto se lembram dos sentimentos que tiveram durante o acontecimento recordado, inspiram lentamente, movendo a cabeça do ombro direito para o esquerdo. A função dessa respiração é restaurar energia. Florinda disse que o corpo luminoso está cons­tantemente criando filamentos semelhantes a teias de aranha, que são projetados para fora da massa luminosa, impulsionados por qualquer tipo de emoções. Portanto, cada situação de interação ou cada situa­ção que envolve sentimentos é potencialmente drenada para o corpo luminoso. Respirando da direita para a esquerda enquanto se lem­bram de um sentimento, os espreitadores, através da mágica da respi­ração, pegam os filamentos que foram deixados para trás. A próxima respirada imediata é da esquerda para a direita e é uma expiração. Com ela os espreitadores soltam os filamentos deixados neles por outros corpos luminosos envolvidos no acontecimento que está sendo recordado.
Ela declarou que essas eram as preliminares essenciais da espreita”
O Presente da Águia, pág. 229

· “Dom Juan disse então que, nas listas estratégicas dos guerreiros, a vaidade figura como atividade que consome a maior quantidade de energia, daí seu esforço para erradicá-la.
- Uma das primeiras preocupações dos guerreiros é libertar aquela energia para poder encarar o desconhecido com ela ­continuou Dom Juan. - A ação de recana1izar aquela energia é a impecabilidade.
Disse, ainda, que a estratégia mais eficaz foi elaborada pelos videntes da Conquista, mestres inquestionáveis da espreita. Consiste de seis elementos que interagem entre si. Cinco deles são chamados de atributos do guerreiro: controle, disciplina, paciência, oportunidade e vontade. Estes dizem respeito ao mundo do guerreiro que está lutando para perder a vaidade. O sexto elemento, talvez o mais importante de todos, pertence ao mundo exterior, e é chamado de pequeno tirano.
Olhou-me como se perguntasse silenciosamente se eu compreendera ou não.
- Estou realmente intrigado - disse eu. - Você está sempre dizendo que La Gorda é o pequeno tirano de minha vida.
O que é exatamente um pequeno tirano?
- Um pequeno tirano é um atormentador - explicou. - Alguém que ou mantém poder de vida e morte sobre guerreiros ou simplesmente os perturba, levando-os à distração.”
O Fogo Interior, pág. 27

· “Dom Juan parou de falar, e olhou-me fixamente. Houve um silêncio desajeitado; então começou a falar sobre a espreita. Disse que a espreita teve origens muito humildes e acidentais. Partiu da observação feita pelos novos videntes de que, quando os guerreiros se comportam por algum tempo de modo fora do habitual, as emanações não usadas no interior de seus casulos começam a brilhar. E seus pontos de aglutinação se deslocam de maneira suave, harmoniosa, muito pouco perceptível.
Estimulados por essa observação, os novos videntes começaram a praticar o controle sistemático do comportamento. Chamaram a essa prática arte da espreita. Dom Juan comentou que, embora discordasse do nome, ele era apropriado, porque a espreita envolvia um tipo específico de comportamento diante das pessoas, um comportamento que poderia ser categorizado como sub-reptício.
Os novos videntes, armados com essa técnica, sondaram o conhecido de uma maneira sóbria é frutífera. Pela prática contínua, fizeram seus pontos de aglutinação se deslocar constantemente.
- A espreita é uma das duas maiores realizações dos novos videntes. Eles decidiram que deveria ser ensinada ao nagual dos dias modernos quando seu ponto de aglutinação já se tivesse deslocado bem profundamente para o lado esquerdo. O motivo desta decisão é que um nagual precisa aprender os princípios da espreita sem o incômodo do inventário humano. Afinal, o nagual é o líder de um grupo, e para liderá-lo deve agir rapidamente, sem ter que pensar primeiro.
"Outros guerreiros podem aprender a espreitar em sua consciência normal, embora seja aconselhável que o façam em consciência intensificada... não tanto por causa do valor da consciência intensificada, mas porque isto imbui a espreita de um mistério que ela na verdade não possui; espreitar é meramente um comportamento diante das pessoas."
Disse ainda que eu podia agora compreender que mudar o ponto de aglutinação era a razão pela qual os novos videntes atribuíam um valor tão alto à interação com os pequenos tiranos. Os pequenos tiranos forçavam os videntes a usar os princípios da espreita e, ao fazê-lo, ajudavam-nos a deslocar seus pontos de aglutinação. .
O Fogo Interior, pág. 163

· “Assim que as mulheres partiram, Dom Juan retomou abrup­tamente sua explicação. Disse que à medida que o tempo passava e os novos videntes estabeleciam suas práticas, perceberam que, sob as condições prevalecentes da vida, espreitar deslocava muito pouco os pontos de aglutinação. Para efeito máximo, a espreita necessitava de uma localização ideal; necessitava de pequenos tiranos em posições de grande autoridade e poder. Tomou-se cada vez mais difícil para os novos videntes se colocarem a si próprios em tais situações; a tarefa de improvisá-las ou procurá-las tomou­ se uma carga insuportável.
Os novos videntes julgaram imperativo ver as emanações da Águia para encontrar uma maneira mais adequada de deslocar o ponto de aglutinação. Quando tentaram ver as emanações, foram confrontados com um problema sério. Descobriram que não há maneira de ver as emanações sem correr um risco mortal, e no entanto tinham de vi-las. Essa foi a época em que usaram a técnica de sonhar dos antigos videntes como um escudo para proteger-se do golpe mortal das emanações da Águia. E, ao agir assim, perceberam que sonhar era na verdade o modo mais eficiente de deslocar o ponto de aglutinação.”
O Fogo Interior, pág. 166

· "Os novos videntes perceberam que em nosso estado normal de consciência temos incontáveis defesas que podem resguardar­-nos contra a força de emanações inusuais, que subitamente se alinham durante o sonho."
Dom Juan explicou que sonhar, assim como espreitar, começava com uma simples observação. Os antigos videntes tiveram consciência de que nos sonhos o ponto de aglutinação se desloca ligeiramente para a esquerda; de maneira natural. Com efeito, o ponto de aglutinação relaxa quando o homem dorme, e todos os tipos de emanações inusuais começam a brilhar.
Os antigos videntes ficaram imediatamente intrigados com esta observação e começaram a trabalhar com esse deslocamento natural até se tomarem capazes de controlá-lo. Chamaram esse controle de sonhar, ou a arte de manejar o corpo sonhador.
O Fogo Interior, pág. 167

· “Você é um sonhador. Se não tiver cuidado com sua energia sexual, pode muito bem se acostumar à idéia de movi­mentos erráticos de seu ponto de aglutinação. Há um momento você estava espantado por suas reações. Bem, seu ponto de aglu­tinação move-se quase erraticamente, porque sua energia se­xual não está equilibrada.
Fiz um comentário estúpido e inoportuno sobre a vida se­xual dos machos adultos.
- Nossa energia sexual é o que governa sonhar - expli­cou. - O nagual Elias ensinou-me, e eu ensinei a você, que você ou faz amor com sua energia sexual ou sonha com ela. Não há outra maneira. A razão pela qual menciono tudo isto é porque você está encontrando grande dificuldade em mover seu ponto de aglutinação para aprender nosso último tópico: o abstrato.
"A mesma coisa aconteceu comigo. Só depois que minha energia sexual foi libertada do mundo é que tudo se encaixou no lugar. Esta é a regra para sonhadores. Os espreitadores são o oposto. Meu benfeitor era, você poderia dizer, um libertino sexual tanto como homem comum quanto como nagual.”
O Poder do Silêncio, pág. 53

· “Explicou a Don Juan que espreitar era uma arte aplicável a tudo, e que havia quatro passos para aprendê-la: implacabilidade, esperteza, paciência e doçura.
Senti-me compelido a interromper seu relato mais uma vez. - Mas a espreita não é ensinada em profunda consciência intensificada? - perguntei.
- É claro - replicou com um sorriso. - Mas você pode compreender que para alguns homens usar roupas de mulhe­res é a porta para a consciência intensificada. Com efeito, tais meios são mais efetivos que empurrar o ponto de aglutinação, mas são muito difíceis de arranjar.
Don Juan contou que seu benfeitor afiava-o diariamente nas quatro disposições da espreita e insistia que Don Juan com­preendesse que implacabilidade não deveria ser rudeza, esper­teza não deveria ser crueldade, paciência não deveria ser negligência e doçura não deveria ser tolice.”
O Poder do Silêncio, pág. 80

· “Numa voz muito baixa, Don Juan disse que por eu estar num estado de consciência intensificada, podia compreender mais de imediato o que ia contar-me acerca das duas mestrias: espreita e intento. Chamou-as a glória culminante dos feiticei­ros antigos e novos, a própria coisa com a qual os feiticeiros estavam preocupados atualmente, preocupação semelhante à dos feiticeiros há milhares de anos. Assegurou que espreitar era o princípio, e que antes de tudo ser tentado no caminho do guer­reiro, os guerreiros precisam aprender a espreitar em seguida devem aprender a intentar, e apenas então podiam mover seu ponto de aglutinação à vontade.”
O Poder do Silêncio, pág. 91

· “Na arte de espreitar - continuou Don Juan - há uma técnica que os feiticeiros usam muito: loucura controlada. Segundo eles, a loucura controlada é a única maneira que têm de
lidar consigo mesmos, em seu estado de consciência e percepção expandidas, e com todos e tudo no mundo dos afazeres diários.
Don Juan explicou a loucura controlada como a arte do engano controlado ou a arte de fingir estar profundamente imerso na ação - fingindo tão bem que ninguém pudesse distingui-lo da coisa real. A loucura controlada não é um engano direto, mas um modo sofisticado, artístico, de estar separado de tudo permanecendo ao mesmo tempo uma parte de tudo.
- A loucura controlada é uma arte - continuou Don Juan. - Uma arte que causa muitas preocupações, e muito difícil para se aprender. Muitos feiticeiros não suportam isso, não porque haja alguma coisa inerentemente errada com a arte, mas porque é preciso muita energia para exercê-la.
Don Juan admitiu que a praticava conscienciosamente, embora não gostasse particularmente de fazê-lo, talvez porque seu benfeitor fosse tão adepto a ela. Ou talvez fosse porque sua personalidade - que ele disse ser basicamente tortuosa e mesquinha - simplesmente não tinha agilidade necessária para praticar a loucura controlada.
Olhei para ele com surpresa. Parou de falar e fixou-me com seus olhos maliciosos.
- Na época em que chegamos à feitiçaria, nossa personalidade já está formada - disse, e encolheu os ombros em sinal de resignação -, e tudo que podemos fazer é praticar a loucura controlada e rir de nós mesmos.”
O Poder do Silêncio, pág. 233

· “Dom Juan mostrou seu espanto com o fato de, dentre todas as coisas maravilhosas que os feiticeiros antigos aprenderam explo­rando esses milhares de posicionamentos, somente a arte de sonhar e a arte de espreitar permanecem hoje em dia. Reiterou que a arte de sonhar tem a ver com o deslocamento do ponto de aglutinação. E então definiu a espreita como a arte que lida com a fixação do ponto de aglutinação em qualquer posicionamento para o qual ele foi deslocado.
- Fixar o ponto de aglutinação em qualquer novo posicio­namento para o qual foi deslocado significa adquirir coesão ­falou. - Você esteve fazendo exatamente isso em seus exercícios de sonhar.
- Achei que estava aperfeiçoando minha atenção sonhadora - falei, um tanto surpreso com sua afirmação.
- Você está fazendo isso e muito mais; está aprendendo a ter coesão. Sonhar faz isso forçando os sonhadores a fixar o ponto de aglutinação. A atenção sonhadora, o corpo energético, a segun­da atenção, o relacionamento com seres inorgânicos, o emissário do sonho, são apenas subprodutos do processo de adquirir coesão; em outras palavras, são todos subprodutos de fixar o ponto de aglutinação em várias posições do sonhar.
- O que é uma posição do sonhar, Dom Juan?
- Qualquer novo posicionamento para onde o ponto de aglutinação tenha se deslocado durante o sono.”
A Arte do Sonhar, pág.86

· "A arte de espreitar, como já disse, tem a ver com a fixação do ponto de aglutinação. Através da prática os feiticeiros antigos descobriram que ainda mais importante do que deslocar o ponto de aglutinação é fazer com que ele fique no novo posicionamento, onde quer que seja.
Explicou que, se o ponto de aglutinação não ficar estacionário, não há possibilidade de percebermos coerentemente. O que per­ceberíamos seria um caleidoscópio de imagens desassociadas. Por isso os feiticeiros antigos punham tanta ênfase no sonhar quanto na espreita. Uma arte não pode existir sem a outra, especialmente para o tipo de atividade em que eles estavam envolvidos.
- Quais eram essas atividades?
- Os feiticeiros antigos chamavam-nas de complexidades da segunda atenção e de grande aventura do desconhecido.
Dom Juan disse que essas atividades eram resultantes dos deslocamentos do ponto de aglutinação. Os feiticeiros antigos aprenderam não somente a deslocar seu ponto de aglutinação para milhares de posicionamentos na superfície ou no interior de sua massa energética, como também a fixar o ponto de aglutinação nessas posições, e assim manter indefinidamente a coesão.
- Qual é o benefício disso, Dom Juan?
- Não podemos falar sobre benefícios. Só podemos falar sobre resultados finais.
Explicou que a coesão dos feiticeiros antigos era tamanha a ponto de permitir que se tornasse perceptivo e fisicamente tudo que fosse ditado pelo posicionamento específico de seu ponto de aglutinação. Podiam transformar-se em qualquer coisa para a qual tivessem um inventário específico. Segundo ele um inventário era a relação de todos os detalhes de percepção envolvidos em tornar­-se, por exemplo, jaguares, pássaros, insetos etc. etc.
A Arte do Sonhar, pág.94

· Explicou que, como tudo que é relacionado ao corpo energético depende do posicionamento adequado do ponto de aglutina­ção, e como o sonhar nada mais é do que um meio de deslocá-lo, espreitar - conseqüentemente - é o meio de fazer o ponto de aglutinação fixar-se na posição ideal; neste caso, a posição onde o corpo energético pode ser consolidado, e da qual ele finalmente emerge.
Dom Juan disse que, no momento em que o corpo energético consegue se movimentar sozinho, os feiticeiros presumem que foi encontrado o posicionamento ideal do ponto de aglutinação. O passo seguinte é espreitá-lo, isto é, fixá-lo naquela posição para completar o corpo energético. Observou que o procedimento é de uma simplicidade total. Basta intentar espreitá-lo.
Silêncio e olhares de expectativa seguiram-se a essa afirma­ção. Esperei que ele dissesse mais, e ele esperou que eu tivesse compreendido o que dissera. Não tinha.
- Deixe seu corpo energético intentar a chegada ao melhor posicionamento de sonhar - ele explicou. - Em seguida, deixe seu corpo energético intentar a permanência naquele posiciona­mento, e você estará espreitando.
A Arte do Sonhar, pág.181

· “- Vou propor uma linha de ação para você- falou num tom cortês, quando terminamos o almoço. - É a última tarefa do terceiro portão do sonhar, e consiste em espreitar os espreitadores; uma manobra misteriosíssima. Espreitar os espreitadores significa que você deliberadamente retira energia do mundo dos seres inorgânicos com o objetivo de realizar um ato de feitiçaria.
- Que tipo de ato de feitiçaria, Dom Juan?
- Uma viagem; uma viagem que usa a consciência como um elemento do ambiente. No mundo da vida cotidiana a água é um elemento do ambiente que usamos para viajar. Imagine a consciência como um elemento semelhante, que pode ser usado para viajar. Através da consciência batedores de todo o universo vêm até nós. E através da consciência os feiticeiros vão aos confins do universo.
Havia alguns conceitos, dentre a enorme quantidade de conceitos que Dom Juan me fizera conhecer no decorrer de seus ensinamentos, que não precisavam de insistência para atrair meu interesse total. Esse era um deles.
- A idéia de que a consciência é um elemento físico é uma coisa revolucionária - falei espantado.
- Não falei que ela é um elemento físico - ele me corrigiu. - É um elemento energético. Você precisa fazer essa distinção. Para os feiticeiros que vêem, a consciência é um brilho. Eles podem atrelar seu corpo energético àquele brilho e viajar com ele.
- Qual é a diferença entre um elemento físico e um elemento energético? - perguntei.
- A diferença é que os elementos físicos são parte de nosso sistema de interpretação, mas os elementos energéticos não. Os elementos energéticos, como a consciência, existem em nosso universo. Mas nós, como pessoas comuns, só percebemos os elementos físicos porque nos ensinaram isso. Os feiticeiros percebem os elementos energéticos pelo mesmo motivo: porque lhes ensinaram a fazê-lo.”
A Arte do Sonhar, pág.205

· Dom Juan me dizia o tempo todo que os feiticeiros estavam divididos em dois grupos: um grupo de sonhadores; o outro de espreitadores. Os sonhadores eram aqueles que tinham grande fa­cilidade de deslocar o ponto de aglutinação. Os espreitadores eram aqueles que tinham grande facilidade em manter o ponto de aglutinação fixado naquela nova posição. Sonhadores e esprei­tadores complementavam uns aos outros, e trabalhavam em pa­res, afetando uns aos outros com suas inclinações inatas.
Dom Juan assegurou-me que o deslocamento e a fixação do ponto de aglutinação poderiam ser alcançados à vontade, por meio da disciplina férrea dos feiticeiros. Disse que os feiticeiros de sua linhagem acreditavam que havia pelo menos seiscentos pontos na esfera luminosa que nós somos, e que quando alcançados à vontade pelo ponto de aglutinação pode nos dar um mundo totalmen­te inclusivo; o que significa que, se o nosso ponto de aglutinação é deslocado para qualquer desses pontos e permanecer fixo nele, perceberemos um mundo como inclusivo e total, como o mundo da vida cotidiana, porém, mesmo assim, um mundo diferente.
O Lado Ativo do Infinito, pág. 223

· “Dom Juan dissera que a arte dos espreitadores entra em jogo depois que o ponto de aglutinação foi deslocado. Manter o ponto de aglutinação fixo na nova posição assegura aos feiticeiros a per­cepção do novo mundo que eles entraram em sua absoluta ple­nitude, exatamente como nós fazemos no mundo dos assuntos corriqueiros. Para os feiticeiros da linhagem de Dom Juan, o mun­do da vida cotidiana não é mais do que uma camada de um mun­do total consistindo em pelo menos seiscentas camadas.”
O Lado Ativo do Infinito, pág. 224

· “Nós podemos aprender a avaliar o mundo de um ponto de vista desapegado, da mesma maneira que nós aprendemos, quando crianças, a avaliá-lo a partir da razão. Só que o desapego, como ponto de enfoque da atenção, está muito mais próximo da realidade energética das coisas.
"Sem essa precaução, a convulsão emocional resultante do exercício de espreitar a nossa auto-importância pode ser tão dolorosa que o aprendiz pode ficar louco ou ser levado ao suicídio. Quando ele aprender a contemplar o mundo a partir da não compaixão, intuindo que por trás de toda a situação que implique um desgaste energético há um universo impessoal, o aprendiz deixa de ser um nó de sentimentos e se torna um ser fluido.
Encontros com o Nagual, pág. 39

· "Recapitular é espreitar nossas rotinas, submetendo-a a um escrutínio sistemático e impiedoso. É a atividade que nos permite visualizar nossa vida como totalidade e não como uma sucessão eventual de momentos. Porém, e ainda que isto possa parecer estranho, só os bruxos recapitulam como norma; o resto das pessoas apenas o faz por casualidade.
"A recapitulação é a herança dos antigos videntes, a prática básica, a essência da bruxaria. Sem ela não há nenhum caminho.”
Encontros com o Nagual, pág. 79

· “A recapitulação é uma forma especializada de espreita e vocês devem empreender isto com um alto sentido de estratégia. Trata-se de entender e pôr em ordem nossas existências, vendo-as tal e qual são, sem remorsos, repreensões ou felicitações, com desapego total e um ânimo leve, até de humor, porque nada em nossa história é mais importante que nada e todas as relações, afinal, são efêmeras.
"O importante é começar, porque a energia que nós recuperamos desde o primeiro intento nos dará forças para continuar recapitulando aspectos mais e mais intrincados de nossas vidas. Primeiro, é necessário começar pelo investimento mais forte que são os sentimentos mais desgarrados. Depois seguimos por aquelas memórias tão profundas que nós já acreditávamos esquecidas, mas que estão ali.
Encontros com o Nagual, pág. 82

· “Carlos continuou dizendo que os bruxos antigos usavam plantas de poder para parar o diálogo interno. Mas os guerreiros atuais preferem condições menos arriscadas e mais controladas.
"Podemos obter os mesmos resultados produzidos pelas plantas quando nos colocamos contra a parede. Ao enfrentar situações limite, como o perigo, o medo, a saturação sensorial e a agressão, algo em nós reage e toma o controle. A mente se põe em alerta e suspende a tagarelice automaticamente. Colocar-se a si mesmo deliberadamente nessas situações se chama espreita.”
Encontros com o Nagual, pág. 95

· "Fui com meu dilema ver Don Juan. Ele riu do assunto e falou que um princípio dos espreitadores é não se confrontar com ninguém, e menos ainda com pessoas mais poderosas que eles.
Encontros com o Nagual, pág. 120

· "Talvez você não tenha tido boa sorte. Meu mestre dizia que cada ser humano traz sua tendência de nascença. Nem todos são bons ensonhadores; alguns têm maior facilidade para a espreita. A questão importante é que você insista".
Encontros com o Nagual, pág. 125

Apontando as pessoas que voltavam do trabalho, falou: "O que você acha que eles foram fazer? Essas pessoas foram viver seu último dia! A coisa triste é que, provavelmente, poucos deles sabem disto. Cada dia é único e o mundo não é só como nos falaram. Cancelar a força do hábito é uma decisão que se toma de uma vez. A partir desse ato, o guerreiro se torna um espreitador"-
Encontros com o Nagual, pág. 143

· "E não pode acontecer que o guerreiro acabe fazendo do seu propósito algo cotidiano?"
Não. Isto é algo que você tem que entender muito bem, pois do contrário sua busca por impecabilidade perderá seu frescor e você terminará traindo-a. Romper rotinas não é o propósito do caminho, mas apenas um meio. A meta é estar consciente. Tendo isso em consideração, outra definição da espreita é: 'uma atenção inflexível sobre um resultado total”
"Esse tipo de atenção sobre um animal dá como resultado um pedaço de carne.(???) Se o aplicarmos isto sobre outra pessoa, produz um cliente, um discípulo ou um enamoramento. E sobre um ser inorgânico, nos proporciona o que os bruxos chamam 'um aliado.' Mas só se aplicarmos a espreita em nós mesmos, pode ser considerada uma arte tolteca, porque então produz algo precioso: a consciência".
Encontros com o Nagual, pág. 144

· "O método do bruxo consiste em focalizar de uma maneira nova a realidade em que vivemos. Mais que acumular informação, o que se busca é recompactar a energia. Um guerreiro é alguém que aprendeu a espreitar-se a si mesmo e já não carrega uma pesada imagem para mostrar aos outros. Ninguém pode descobri-lo se ele não o desejar, porque não tem apegos. Está além do caçador, pois aprendeu a rir de si mesmo".
Contou como sua instrutora, dona Florinda Matus, o ensinou a passar despercebido.
Exatamente no momento em que meus livros me transformaram em um homem rico, ela me enviou a fritar hambúrgueres em um restaurante de estrada! Durante anos trabalhei vendo meu dinheiro sem poder usá-lo. Disse que isso me ensinaria a não perder a perspectiva adequada. E aprendi minha lição!
Encontros com o Nagual, pág. 146

A Recapitulação 1


A Travessia das Feiticeiras - Taisha Abelar - Ed. Nova Era

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[Clara Grau]


A recapitulação é o ato de trazer de volta a energia que já despendemos em ações passadas. Ela inclui recordar todas as pessoas que conhecemos, todos os lugares que vimos e todos os sentimentos que tivemos em toda nossa vida - começando pelo presente e voltando às lembranças mais antigas - para então purifica-las com a vassoura da respiração. Instruiu-me para inspirar pelo nariz quando ela virasse minha cabeça para a esquerda e expirasse quando ela a virasse para a direita. Em seguida, eu devia virar a cabeça para a esquerda e a direita em um único movimento, sem respirar. Explicou ser esta uma misteriosa maneira de respirar e a chave para a recapitulação, pois a inspiração nos permite puxar a energia perdida de volta, e a expiração nos permite expelir a energia estranha e indesejável, acumulada em nós através da interação com nossos semelhantes. Para viver e interagir precisamos de energia. Normalmente a energia despendida nos é retirada para sempre. Não fosse a recapitulação, jamais teríamos a oportunidade de nos renovarmos. Recapitular nossas vidas e varrer nosso passado com a respiração funcionam como uma unidade. Quando fizer a recapitulação, tente sentir alguns filamentos longos distendendo-se, e que partem da parte média de seu corpo. Alinhe então o movimento de giro de sua cabeça com o movimento desses filamentos impalpáveis. Eles são os condutores que trarão de volta a energia que você deixou para trás. Para recuperarmos nossa força e unidade, precisamos liberar nossa energia aprisionada no mundo e puxa-la de volta para nós. Durante a recapitulação, nós estendemos esses filamentos de energia preguiçosos através do espaço e do tempo, até as pessoas, locais e acontecimentos que vamos examinar. Como resultado, podemos retornar a cada momento de nossas vidas e agira como se realmente estivéssemos lá. Fazer uma lista de todas as pessoas que havia conhecido, iniciando pelo presente e retrocedendo até minhas primeiras lembranças. É parte necessária da recapitulação. A lista é uma matriz à qual a mente pode fixar-se. Explicou então que o estágio inicial da recapitulação compõe-se de duas coisas. A primeira é a lista, e a segunda é criar a cena. Criar a cena consiste em visualizar todos os detalhes relativos aos acontecimentos que vão ser lembrados. Quando tiver todos os elementos no lugar, use a vassoura da respiração; o movimento de sua cabeça é como um leque que agita tudo nessa cena. Se você lembrar de um quarto, por exemplo, respire nas paredes, no teto, na mobília, nas pessoas que visualizar. E não pare até ter absorvido a última porção de energia que você deixou para trás. Seu corpo lhe dirá quando chegar o momento de acabar. Lembre-se, tenha a intenção de inspirar a energia que você deixou na cena que estiver recapitulando, e expirar a energia alheia lançada em você pelas pessoas.


[Clara Grau]


Devemos iniciar a recapitulação concentrando nossa atenção em nossa atividade sexual passada. Grande parte de nossa energia fica aprisionada aí. Por isso temos que liberar essas memórias em primeiro lugar. Início da manhã e o fim da tarde eram as horas mais propícias para iniciar um empreendimento tão amplo. Pegue a primeira pessoa da sua lista e trabalhe sua lembrança para recordar tudo que vivenciou com essa pessoa, desde o momento em que vocês se conheceram até a última vez em que se encontraram. Ou, se você preferir, você pode trabalhar ao inverso, partindo da última vez que encontrou essa pessoa até o primeiro encontro.


[Taisha]


De posse da lista, eu ia a caverna todos os dias. A princípio a recapitulação foi bastante difícil. Eu não conseguia me concentrar, pois me apavorava vasculhar o passado. Minha mente vagava daquilo que eu considerava um fato traumático para o próximo, ou eu simplesmente repousava ou devaneava. Contudo, algum tempo depois, intrigou-me a clareza e os detalhes que minhas recordações iam adquirindo. Comecei inclusive a ser mais objetiva em relação à experiência que sempre considerara tabu. Surpreendentemente, também me sentia cada vez mais forte e otimista. Às vezes, quando respirava, era como se a energia estivesse voltando para meu corpo, tornando meus músculos ativos e volumosos. Envolvi-me tanto com a recapitulação que não precisei de um mês inteiro para comprovar sua eficácia.


[Clara Grau]


Existe uma maneira de mudar. Chama-se recapitulação. Uma recapitulação completa e profunda nos permite tomar consciência daquilo que queremos mudar, possibilitando-nos ver nossas vidas sem ilusão. Ela nos proporciona uma pausa momentânea, na qual podemos optar por aceitar nosso comportamento habitual ou modifica-lo, tendo a intenção de eliminá-lo antes que ele nos aprisione por completo. Para mudarmos, precisamos satisfazer três condições. Primeiro, temos que enunciar em voz alta nossa decisão de mudar, para que o intento nos ouça. Segundo, temos que direcionar nossa percepção por determinado período de tempo: não podemos simplesmente começar alguma coisa e abandoná-la tão logo nos sentimos desencorajados. Terceiro, temos de visualizar o resultado de nossos atos com uma sensação de completo desapego. Isso significa que não podemos nos envolver com a idéia de sucesso ou fracasso. Siga essas três etapas e você poderá mudar quaisquer sentimentos e desejos em você. À medida que você der continuidade a recapitulação, a entrada na esfera onde a humanidade não é importante lhe irá aparecer. Este será o convite para você atravessar o olho do dragão. É o que chamamos de vôo abstrato. Na verdade, ele implica a travessia de enorme abismo para chegar a uma esfera que não pode ser descrita porque o homem não é a sua medida. A finalidade da recapitulação é romper com pressupostos básicos que aceitamos ao longo de nossas vidas. Enquanto não forem rompidos, não poderemos impedir que o poder da recordação obscureça nossa percepção. O mundo é uma enorme tela de lembranças; se determinadas pressuposições são rompidas, o poder da recordação não é apenas controlado, mas até mesmo cancelado.


[Taisha lembra que quando pequena via as sombras se movendo]


Nunca ficar de sapatos enquanto estivesse recapitulando, pois comprimindo os pés, a circulação energética é interrompida.


[Taisha]


Movi a cabeça da direita para a esquerda, inspirando a energia que ainda estava irremediavelmente presa no auditório. Quando virei a cabeça novamente para a direita, expirei todo o constrangimento e autopiedade que havia tomado conta de mim. Movimentei a cabeça repetidamente, realizando uma respiração de varredura após a outra, até que todo o turbilhão emocional foi liberado. Então virei a cabeça da direita para a esquerda e voltei sem respirar rompendo dessa maneira todos os laços com aquele momento específico de meu passado. [recapitulação da pratica de karatê]


[Clara Grau]


Seu inventário está mudando muito natural e harmoniosamente. Não se preocupe demais. Simplesmente concentre-se na recapitulação, e todo o resto virá por si mesmo. As pessoas que criaram a recapitulação viveram há centenas, senão milhares, de anos. Você não deve, portanto, considerar este milenar processo de renovação como uma psicanálise moderna. A recapitulação é um ato mágico, no qual o intento e a respiração representam um papel fundamental. Respirar concentra energia e promove sua circulação. Ela é então conduzida pelo intento preestabelecido da recapitulação, que é libertar-nos de nossas amarras biológicas e sociais. O intento da recapitulação é uma dádiva que nos é concedida por aqueles videntes da antiguidade que criaram esse método e transmitiram-no a seus ancestrais. Cada pessoa que realiza a recapitulação precisa acrescentar seu próprio intento, mas este intento é simplesmente o desejo ou a necessidade de fazer a recapitulação. O intento de seu resultado final, que é a liberdade total, foi estabelecido pelos videntes da antiguidade. E como foi estabelecida independentemente de nós, constitui uma dádiva inestimável. A recapitulação revela-nos uma faceta crucial de nosso ser: a possibilidade de, por um instante, pouco antes de mergulharmos em qualquer ato, avaliar acuradamente seu resultado, nossas chances, motivações e expectativas. Este conhecimento nunca é conveniente ou satisfatório para nós, por isso nós suprimimos imediatamente. Esse momento de conhecimento direto foi chamado de O VIDENTE pelas pessoas que formularam pela primeira vez a recapitulação, pois ele nos permite ver diretamente as coisas com olhos límpidos. No entanto, não obstante a clareza e a precisão das avaliações do vidente, nunca prestamos atenção a ele, nem lhe damos a oportunidade de se fazer ouvido. Com a contínua repressão, paralisamos seu crescimento e o impedimos de desenvolver todo o seu potencial. Ao final, o vidente dentro de nós se enche de amargura e ódio. Os sábios da antiguidade que inventaram a recapitulação acreditavam que, como nunca paramos de reprimir o vidente, ele finalmente nos destrói. Mas esses sábios também nos asseguraram que, por meio da recapitulação, podemos permitir ao vidente crescer e desenvolver-se como deveria ocorrer originalmente. A finalidade da recapitulação é assegurar ao vidente a liberdade de ver. Dando-lhe espaço, podemos deliberadamente transformar o vidente em uma força que é ao mesmo tempo misteriosa e eficaz, uma força que eventualmente nos conduzirá até a liberdade, em vez de nos matar. Por esta razão peço-lhe sempre para relatar o que descobriu através de sua recapitulação. Você deve trazer o vidente até a superfície e dar-lhe a oportunidade de falar e dizer o que está vendo.


[Taisha]


Sabia perfeitamente bem que existe algo dentro de mim que sempre sabe o que é o quê. Sempre soube que eu reprimia sua capacidade de aconselhamento, pois o que ele me diz em geral é contrário àquilo que espero ou quero ouvir. A única ocasião em que invoquei a orientação do vidente dói quando contemplei o horizonte sul e busquei seu auxílio deliberadamente, embora jamais tivesse conseguido explicar porque fizera aquilo.


[Clara Grau]


Para nos esvaziarmos temos de mergulhar em um estado de recapitulação profunda e permitir que a energia flua através de nós livremente. Apenas na quietude podemos conceder ao vidente pleno domínio, ou a energia impessoal do universo pode transformar-se na própria força pessoal do intento. Quando nos esvaziamos suficientemente de nosso inventário obsoleto e obstaculizante, recebemos a energia que se acumula naturalmente; quando uma quantidade suficiente se aglutina, ela se transforma em poder. Qualquer coisa pode anunciar sua presença: um ruído alto, uma voz suave, um pensamento que não é nosso, uma onda inesperada de vigor e bem-estar. Não faz diferença se o poder desce sobre nós em estado de vigília ou em estado onírico; ele é igualmente válido em ambos os casos, sendo o último, contudo, mais impalpável e poderoso. Aquilo que experimentamos na vigília, em termos de poder, deve ser colocado em prática nos sonhos e todo poder que vivenciamos nos sonhos deve ser usado enquanto estamos acordados. O que realmente importa é estarmos consciente, estejamos nós acordados ou adormecidos. O que importa é estar consciente. Quando crianças freqüentemente fazemos promessas e depois ficamos presos a elas, embora não consigamos mais nos lembrar de que as fizemos. Ela disse que existem momentos na vida de cada pessoa, sobretudo na tenra infância, nos quais queremos tanto alguma coisa que automaticamente fixamos todo nosso intento nesse alvo que, uma vez fixado, permanece o mesmo até realizarmos nosso desejo. Votos, juramentos e promessas aprisionam nosso intento de tal modo que, a partir deles, nossos atos, sentimentos e pensamentos são sistematicamente direcionados para a realização ou manutenção desses compromissos, não importa se lembramos ou não que os fizemos. Rever, durante a recapitulação, todas as promessas que já se tenha feito na vida, especialmente aquelas feitas às pressas, fruto do desconhecimento ou de julgamento errôneo, pois, a menos que se retire o intento das mesmas, este intento jamais poderá surgir para expressar-se livremente no presente.


[Dom Juan]


Inspirar profundamente, girando suavemente a cabeça para a esquerda. Então expirar até o fim, girando bem suave a cabeça para a direita. Por último, girar a cabeça do ombro direito até o esquerdo e de volta para o direito sem respirar, voltando depois ao centro. Quando expirar, jogue fora todos os pensamentos e sentimentos que estiver revendo. Não fique apenas girando a cabeça com os músculos do pescoço. Conduza-a com as linhas de energia invisíveis de seu abdômen. Estimular essas linhas a sair é uma das tarefas da recapitulação. Bem abaixo do umbigo há um centro de poder fundamental e que todos os movimentos do corpo, incluindo a respiração, tinham de envolver esse ponto energético. Sincronizar o ritmo da respiração com o movimento da cabeça, de modo que juntos eles estimulem as linhas energéticas invisíveis do abdômen ampliar-se rumo ao infinito. Essas linhas invisíveis são parte do corpo sutil, o duplo. Quanto mais energia você estimula com a manipulação dessas linhas, mais forte se torna o duplo. O corpo físico é um revestimento, um recipiente. Quando crianças, tínhamos plena consciência de nosso duplo; à medida que fomos crescendo, aprendemos a valorizar cada vez mais o lado físico e menos o etérico. O corpo sutil é uma massa de energia. Temos consciência apenas de seu revestimento externo e sólido. Nós nos tornamos conscientes de nosso lado etérico permitindo que nosso intento volte até ele. Nosso corpo físico está inseparavelmente ligado a sua contraparte etérea, mas eu este elo tem sido toldado por nossos pensamentos e sentimentos. Para transferir a percepção de nossa aparência concreta para sua contraparte fluida, precisamos em primeiro lugar dissolver a barreira que separa os dois aspectos de nosso ser. A recapitulação ajuda a dissolver nossas preconcepções, mas é preciso habilidade e concentração para alcançar o duplo. É perigoso liberar a energia aprisionada dentro de nós, pois o duplo é vulnerável e pode prejudicar-se facilmente durante o processo de mudança de nossa percepção para ele. Você pode criar uma abertura na rede etérica e perder grandes quantidades de energia. Energia preciosa, necessária para manutenção de um certo nível de clareza e controle em sua vida. A rede etérica é a luminosidade que envolve o corpo físico. Esta rede de energia é feita em pedaços durante a vida cotidiana. Grandes porções se perdem ou se entrelaçam nas faixas de energia de outras pessoas. Se uma pessoa perde excessivamente a força vital, ela adoece ou morre. A respiração atua nos níveis físico e etérico. Ela repara qualquer dano existente na rede etérica e a mantém forte e maleável. É isso o que se faz na recapitulação. Retirando filamentos de energia da rede etérica, os quais se perderam ou emaranharam em conseqüência da vida cotidiana. Você estará trazendo de volta tudo o que dispersou ao longo dos anos e em milhares de lugares.


[Nélida Abelar]


A respiração purificadora realizada durante a recapitulação acabará permitindo recordar tudo o que já se fez, incluindo os sonhos. O futuro não existe. É tempo de você perceber isso. E quando concluir a recapitulação e apagar completamente o passado, tudo que restará será o presente. Então você saberá que o presente é apenas um instante, nada mais.


[Taisha]


Sentada sobre um galho robusto, as costas apoiadas no tronco da árvore, minha recapitulação assumiu um tom completamente diferente. Eu conseguia recordar os menores detalhes das experiências de minha vida, sem medo de qualquer envolvimento emocional inferior. Eu ria a plenos pulmões de coisas que outrora tinham sido traumas profundos para mim. Minhas obsessões não mais despertavam autopiedade. Enxergava tudo sob uma perspectiva diferente, não como a pessoa urbana que sempre fora, mas como o habitante de árvore despreocupada e livre que eu me tornara.

A Recapitulação 2


Recapitular é uma atividade especializada dos espreitadores pela qual suas rotinas de vida e relacionamento são impiedosamente expostas. A componente da socialização em nossas vidas, ao fixar o ponto de aglutinação numa posição específica, nos torna padronizados e monotonamente repetitivos no nosso relacionamento com as pessoas e com o mundo que nos cerca.. É um círculo vicioso sem fim. A recapitulação traz isso à tona e inicia gradualmente o processo de transformação.
Já que é um trabalho “para a vida inteira e mais além”, a recapitulação exige no início muita energia, determinação e paciência. Nossa tendência é sempre adiar, procurar uma ocasião mais propícia para iniciar a prática, mas o Nagual deixa claro que o melhor momento para começar é agora..
Ele diz abaixo que “a totalidade de um caminho se resume em seu primeiro passo. Isso significa que as condições ideais são aqui e agora".
Se atentarmos para o fato de que através da recapitulação o espreitador engendra um meio de atender uma exigência inexorável do ”mar escuro da consciência” dando a ele as experiências pessoais reivindicadas e espertamente ficando com a vida (consciência), não há dúvida de que essa é a atividade mais importante de nossas vidas, ou seja, manter a sua consciência individual em evolução mesmo sem o organismo humano.
Com a passagem dos anos, o inevitável sentimento de urgência que sutilmente começa a aparecer, vai deixar claro que não estamos atendendo nesta vida a nossa mais alta vocação e potencialidade de “ser humano” que é levar nossa consciência ao infinito.
A recapitulação é uma oportunidade e como tal não deve ser ignorada ou subestimada, pois é um privilégio ter tido nesta existência contato com tal ensinamento.
De acordo com o que Dom Juan ensinava a seus discípulos, a recapitulação era uma técnica descoberta pelos feiticeiros do antigo México e usada por todos os xamãs praticantes dali por diante, de examinar e reviver todas as experiências de suas vidas para alcançar dois objetivos transcendentais:
- o objetivo abstrato de cumprir um código universal que exige que a consciência seja abandonada no momento da morte e
- o objetivo extremamente pragmático de adquirir fluidez perceptiva.
Ele dizia que a formulação do primeiro objetivo era o resultado de observações que os feiticeiros fizeram através da sua capacidade de ver a energia diretamente como ela flui no universo. Eles tinham visto que no universo existe uma força gigantesca, um imenso conglomerado de campos de energia que eles chamaram a águia ou o mar escuro da consciência Eles observaram que o mar escuro da consciência é a força que empresta consciência a todos os seres vivos, do vírus ao homem. Acreditavam que a força empresta consciência a um ser recém-nascido e que este ser aumenta aquela consciência através das suas experiências de vida até um momento em que a força exige sua devolução.
No entendimento dos feiticeiros, todos os seres vivos morrem porque são forçados a devolverem a consciência que lhes foi emprestada. Através das eras, os feiticeiros têm entendido que não existe nenhuma maneira do que o homem moderno chama de o nosso modo linear de pensamento explicar um fenômeno como esse, porque, para uma linha de raciocínio de causa e efeito, não há como explicar por que e como a consciência é emprestada e depois retomada. Os feiticeiros do antigo México viam isso como um fato energético do universo, um fato que não pode ser explicado em termos de causa e efeito ou em termos de um propósito que pudesse ser determinado a priori.
Os feiticeiros da linhagem de Dom Juan acreditavam que recapitular significava dar ao mar escuro da consciência o que ele estava buscando: as suas experiências de vida. Entretanto acreditavam que, através da recapitulação, poderiam adquirir um grau de controle que lhes permitiria separar as experiências de vida da sua força vital. Para eles, as duas não estavam insoluvelmente entrelaçadas; só estavam unidas circunstancialmente.
Esses feiticeiros afirmavam que o mar escuro da consciência não quer tirar a vida dos seres humanos; só quer as experiências de vida. A falta de disciplina nos seres humanos os impede de separar as duas forças e, no final, eles perdem suas vidas, onde se esperava que perdessem apenas a força das experiências de vida. Os feiticeiros viam a recapitulação como o procedimento através do qual eles poderiam dar ao mar escuro da consciência um substituto para as suas vidas. Eles abriam mão das suas experiências de vida relatando-as, mas retinham a sua força vital.
Quando examinadas em termos dos conceitos lineares do nosso mundo ocidental, as alegações perceptivas dos feiticeiros não fazem absolutamente nenhum sentido. A civilização ocidental tem estado em contato com os xamãs do Novo Mundo há quinhentos anos e nunca houve, por parte dos acadêmicos, uma tentativa genuína de formular um discurso filosófico sério baseado nas declarações feitas pelos xamãs. Por exemplo, para qualquer membro do mundo ocidental, a recapitulação pode parecer coerente com a psicanálise, algo na linha de um procedimento psicológico, uma espécie de técnica de auto-ajuda. Nada poderia estar mais distante da verdade.
De acordo com Dom Juan Matus, o homem sempre perde por negligência. No caso das premissas da feitiçaria, ele acreditava que o homem ocidental está perdendo uma tremenda oportunidade para intensificar a sua consciência e que a maneira como o homem ocidental se relaciona com o universo, a vida e a consciência é apenas uma entre múltiplas opções.
Para os xamãs praticantes, recapitular significava dar a uma força incompreensível - o mar escuro da consciência - a própria coisa que ela parecia estar procurando: as suas experiências de vida, isto é, a consciência que eles ampliaram através daquelas próprias experiências de vida. Já que provavelmente Dom Juan não poderia me explicar esses fenômenos em termos de lógica clássica, ele dizia que tudo o que os feiticeiros podiam desejar fazer era realizar a façanha de reter sua força vital sem saber como isso era feito. Também dizia que havia milhares de feiticeiros que tinham conseguido fazer isso. Tinham conservado a sua força vital após terem dado ao mar escuro da consciência a força das suas experiências de vida. Para Dom Juan, isso significava que esses feiticeiros não morreram no sentido usual como entendemos a morte, mas transcenderam-na retendo sua força vital e desaparecendo da face da terra, embarcando em uma viagem definitiva de percepção.
A crença dos xamãs da linhagem de Dom Juan era que, quando a morte acontece dessa forma, todo o nosso ser transforma-se em energia, um tipo especial de energia que conserva a marca da nossa individualidade. Dom Juan tentava explicar isso em um sentido metafórico dizendo que nós somos compostos de um número de nações unitárias: a nação dos pulmões, a nação do coração, a nação do estômago, a nação dos rins e assim por diante. Às vezes cada uma dessas nações funciona independentemente das outras, mas no momento da morte todas elas são unificadas em uma única entidade. Os feiticeiros da linhagem de Dom Juan chamavam esse estado de liberdade total. Para os feiticeiros, a morte é uma unificadora e não uma exterminadora, como ela o é para o homem comum.
- Esse estado é a imortalidade, Dom Juan? - perguntei.
- Isso de modo algum é a imortalidade - respondeu ele. - É simplesmente a entrada em um processo evolucionário, usando o único meio para a evolução que o homem tem à sua disposição: a consciência. Os feiticeiros da minha linhagem estavam convencidos de que, biologicamente, o homem não poderia evoluir mais; conseqüentemente, consideravam a consciência do homem o único meio para evoluir. No momento de morrer os feiticeiros não são aniquilados pela morte, mas transformados em seres inorgânicos: seres que têm consciência, mas não um organismo. Para eles, serem transformados em um ser inorgânico era evolução e isso significava que um novo tipo indescritível de consciência lhes era emprestado, uma consciência que permaneceria por verdadeiramente milhões de anos, mas que algum dia também precisaria ser devolvida ao doador: o mar escuro da consciência.
Uma das descobertas mais importantes dos xamãs da linhagem de Dom Juan foi que, como todas as outras coisas no universo, o nosso mundo é uma combinação de duas forças opostas e ao mesmo tempo complementares. Uma dessas forças é o mundo que conhecemos, que os feiticeiros chamavam o mundo dos seres orgânicos. A outra força é algo que eles chamavam o mundo dos seres inorgânicos.
- O mundo dos seres inorgânicos - dizia Dom Juan - é povoado por seres que possuem consciência, mas não um organismo. Eles são conglomerados de campos de energia, exatamente como nós o somos. Aos olhos de um vidente, em vez de seres luminosos, como os seres humanos o são, eles são bastante opacos. Não são configurações energéticas arredondadas, mas sim alongadas, como uma vela. Em essência, são conglomerados de campos de energia que, assim como nós, têm coesão e limites. São mantidos unidos pela mesma força aglutinadora que mantém os nossos campos de energia unidos.
- Onde fica esse mundo inorgânico, Dom Juan? - perguntei.
- É o nosso mundo gêmeo - respondeu ele. - Ocupa o mesmo tempo e o mesmo espaço que o nosso mundo, mas o tipo de consciência do nosso mundo é tão diferente do tipo de consciência do mundo inorgânico que nós nunca notamos a presença dos seres inorgânicos, embora eles notem a nossa.
Os seres inorgânicos são seres humanos que evoluíram? perguntei.
- Absolutamente não! - exclamou ele. - Os seres inorgânicos do nosso mundo gêmeo têm sido intrinsecamente inorgânicos desde o início, do mesmo modo como temos sido sempre intrinsecamente seres orgânicos, também desde o início. Eles são seres cuja consciência pode evoluir exatamente como a nossa, e sem dúvida o faz, mas não tenho nenhum conhecimento direto de como isso acontece. Entretanto o que sei é que um ser humano cuja consciência evoluiu é um ser inorgânico brilhante, luminescente e arredondado de um tipo especial.
Dom Juan me deu uma série de descrições desse processo evolucionário, que eu sempre assumi como metáforas poéticas. Eu escolhia a que me agradava mais, que era a da liberdade total. Imaginava um ser humano que entra em liberdade total como sendo o ser mais corajoso, mais imaginativo possível. Dom Juan dizia que eu não estava fantasiando absolutamente nada - que, para entrar em liberdade total, um ser humano deve invocar o seu lado sublime que, dizia ele, os seres humanos têm mas que nunca lhes ocorre usar.
Dom Juan descrevia o segundo, o objetivo pragmático da recapitulação, como a aquisição de fluidez. O fundamento lógico dos feiticeiros por trás disso tinha a ver com um dos assuntos mais evasivos da feitiçaria: o ponto de aglutinação, um ponto de intensa luminosidade, do tamanho de uma bola de tênis, perceptível quando os feiticeiros vêem um ser humano como um conglomerado de campos de energia.
Feiticeiros como Dom Juan vêem que trilhões de campos de energia na forma de filamentos de luz vindos de todo o universo convergem ao ponto de aglutinação e o atravessam. Essa confluência de filamentos dá ao ponto de aglutinação a sua luminosidade. O ponto de aglutinação possibilita que um ser humano perceba aqueles trilhões de filamentos de energia transformando-os em dados sensoriais. Depois o ponto de aglutinação interpreta esses dados como o mundo da vida cotidiana, isto é, em termos da socialização e do potencial humano.
Recapitular é reviver todas ou quase todas as experiências que tivemos e, fazendo isso, deslocar o ponto de aglutinação, ligeiramente ou bastante, impelindo-o pela força da memória a adotar a posição que tinha quando o acontecimento que está sendo recapitulado ocorreu. Esse ato de ir de um lado para o outro de posições anteriores à atual proporciona aos xamãs praticantes a fluidez necessária para suportarem diferenças extraordinárias em suas viagens pelo infinito. Para os praticantes da Tensegridade, a recapitulação proporciona a fluidez necessária para suportarem diferenças que não fazem parte, de modo algum, de sua cognição habitual.
Como um procedimento formal, a recapitulação era feita nos tempos antigos recordando-se de cada pessoa que os praticantes conheciam e de cada experiência em que tomaram parte. Dom Juan sugeria que, no meu caso, que é o caso do homem moderno, eu fizesse uma lista por escrito de todas as pessoas que eu tinha conhecido em minha vida, como um estratagema mnemônico. Uma vez que eu tivesse escrito a lista, ele continuaria a me dizer como usá-la. Eu precisava pegar a primeira pessoa da minha lista, que retrocedia no tempo do presente até a época da minha primeiríssima experiência de vida, e, na minha memória, estabelecer a minha última interação com aquela primeira pessoa. Essa ação é chamada de organizar o acontecimento a ser recapitulado.
Uma detalhada recordação de minúcias é requerida como o meio apropriado de afiar a capacidade de lembrar. Essa recordação envolve obter todos os detalhes físicos pertinentes, tal como o ambiente no qual o acontecimento recordado ocorreu. Uma vez que o acontecimento está organizado, a pessoa deve realmente entrar no local em si, prestando especial atenção a quaisquer configurações físicas relevantes. Por exemplo, se a interação aconteceu em um escritório, o que deve ser lembrado é o chão, as portas, as paredes, os quadros, as janelas, as mesas, os objetos sobre as mesas, todas as coisas que poderiam ter sido observadas em um relance e depois esquecidas.
Como um procedimento formal, a recapitulação deve começar pelo relato minucioso de acontecimentos que acabaram de ocorrer. Dessa forma, a primazia da experiência tem precedência. Alguma coisa que acabou de ocorrer é algo que a pessoa pode se lembrar com grande precisão. Os feiticeiros sempre confiaram no fato de que os seres humanos são capazes de armazenar informações detalhadas das quais não estão conscientes e de que aquele detalhe é o que o mar escuro da consciência procura.
A verdadeira recapitulação do acontecimento requer que a pessoa respire profundamente, abanando a cabeça, por assim dizer, muito lenta e delicadamente, de um lado para o outro, começando por qualquer que seja o lado, esquerdo ou direito. Esse abano da cabeça era feito tantas vezes quantas fossem necessárias, enquanto a pessoa se lembrava de todos os detalhes acessíveis. Dom Juan dizia que os feiticeiros falavam sobre esse ato como inalar todos os sentimentos que a pessoa teve no acontecimento sendo recordado e expelir todos os humores indesejáveis e os sentimentos irrelevantes que permaneceram nela.
Os feiticeiros acreditam que o mistério da recapitulação reside no ato de inalar e exalar. Uma vez que a respiração é uma função de manutenção da vida, os feiticeiros têm certeza de que através dela a pessoa também pode entregar ao mar escuro da consciência o fac-símile das suas experiências de vida. Quando eu pressionava Dom Juan por uma explicação racional sobre essa idéia, sua posição era que coisas como a recapitulação só podiam ser experimentadas e não explicadas. Ele dizia que no ato de fazer a pessoa pode encontrar a libertação e que explicar isso era dissipar nossa energia em esforços infrutíferos. Seu convite era coerente com todas as coisas relacionadas ao seu conhecimento: o convite para entrar em ação.
Na recapitulação, a lista de nomes é usada como um estratagema mnemônico que impele a memória em uma viagem inconcebível. A posição dos feiticeiros a esse respeito é que relembrar acontecimentos que acabaram de ocorrer prepara o solo para a recordação de acontecimentos mais distantes no tempo com a mesma clareza e proximidade. Recordar experiências desse modo é revivê-las e extrair dessa recordação um ímpeto extraordinário que é capaz de despertar a energia dispersada dos nossos centros de vitalidade e fazê-la retornar para eles. Os feiticeiros se referem a essa redistribuição de energia que a recapitulação causa como obter fluidez após dar ao mar escuro da consciência o que ele está procurando.
Em um nível mais mundano, a recapitulação proporciona aos praticantes a capacidade de examinar a repetição em suas vidas. A recapitulação pode convencê-los, além de qualquer sombra de dúvida, de que todos nós estamos à mercê de forças que definitivamente não fazem nenhum sentido, embora à primeira vista pareçam perfeitamente razoáveis; como, por exemplo, ficar à mercê do galanteio. Parece que para algumas pessoas o galanteio é a busca de toda uma existência. Pessoalmente, tenho ouvido falar de pessoas com idade avançada cujo único ideal era encontrar uma companhia perfeita e cuja aspiração era terem talvez um ano de felicidade no amor.
Dom Juan Matus costumava me dizer, sob meus veementes protestos, que o problema era que ninguém queria realmente amar alguém, mas que cada um de nós queria ser amado. Ele dizia que para nós essa obsessão pelo galanteio, tomado pelo significado visível, era a coisa mais natural do mundo. Ouvir um homem ou uma mulher de 75 anos dizer que ainda está à procura de um companheiro perfeito é uma afirmação de algo idealista, romântico e belo. No entanto, examinar essa obsessão no contexto das repetições intermináveis de uma existência faz com que ela apareça como realmente é: algo grotesco.
Dom Juan me assegurava que, se alguma mudança comportamental está para ser realizada, precisa ser feita através da recapitulação, já que ela é o único veículo que pode intensificar a consciência liberando a pessoa das exigências não expressas da socialização, que são tão automáticas, tão desvalorizadas, que não são sequer notadas sob condições normais e muito menos examinadas.
O verdadeiro ato de recapitular é um empreendimento de toda uma vida. Demora anos para esgotar a lista de pessoas, especialmente para aqueles que conheceram e interagiram com milhares de indivíduos. Essa lista é aumentada pela lembrança de acontecimentos impessoais nos quais nenhuma pessoa está envolvida, mas que precisam ser examinados porque de algum modo estão relacionados à pessoa sendo recapitulada.
Dom Juan afirmava que o que os feiticeiros do antigo México procuravam avidamente ao recapitularem era a lembrança da. interação porque, na interação, residem os efeitos profundos da socialização, que eles lutavam para superar por quaisquer meios disponíveis.
Passes Mágicos, págs. 112 a 118

· Florinda riu, descrevendo o choque que teve. O velho a tinha levado a uma participação ativa na sua própria cura. Além do mais, com o pretexto da exigência da curandeira, ele a colocava dentro do engradado diariamente durante seis horas pelo menos, a fim de que ela realizasse uma tarefa específica a que ele dava o nome de "recapitulação".
O Presente da Águia, pág. 227

· Por isso seu benfeitor teve de se mudar para outra região do México e ela teve de ficar escondida na casa dele durante anos; essa situação favoreceu Florinda, pois ela tinha de realizar a tarefa de "recapitular" e necessitava de absoluto silêncio e solidão.
Explicou que a recapitulação é o ponto forte dos espreitadores, como o corpo sonhador é o ponto forte dos sonhadores. Consistia em recordar sua vida até os mínimos detalhes. Para isso seu benfeitor lhe tinha dado aquele engradado como um instrumento e um símbo­lo. Era um instrumento que lhe permitia aprender a se concentrar, pois tinha de se sentar lá durante anos até que toda sua vida tivesse passado diante dos seus olhos. E era um símbolo dos estreitos limi­tes da nossa pessoa. Seu benfeitor lhe disse que quando terminasse a recapitulação quebrasse o engradado para simbolizar que não mais mantinha as limitações da sua pessoa.
O Presente da Águia, pág. 228

· Florinda me deu então os fundamentos da recapitulação. Disse que o primeiro estágio é um breve relato de todos os incidentes da nossa vida, que se apresentam de uma maneira óbvia para exame.
O segundo estágio é uma recordação mais detalhada, que sistematicamente vai desde a época anterior ao espreitador ter se sentado dentro do engradado, e teoricamente se estende ao momento do nas­cimento.
Ela me assegurou que uma recapitulação perfeita pode mudar um guerreiro tanto, se não mais, quanto o controle total do corpo sonhador. Nesse particular, o sonho e a espreita têm a mesma finalidade, entrar na terceira atenção. É importante, entretanto, que o guer­reiro saiba e pratique os dois. Disse que para a mulher há configu­rações diferentes do corpo luminoso para se aperfeiçoar em uma ou em outra. Os homens, ao contrário, podem realizar os dois com facilidade, mas ao mesmo tempo não podem nunca chegar ao grau de eficiência que as mulheres atingem em cada arte.
O Presente da Águia, pág. 228

· Florinda explicou que o elemento-chave na recapitulação é a respiração. Respirar para ela era uma mágica, por ser uma função que produz a vida. Disse que essa recordação é fácil se se consegue reduzir a área de estímulo em volta do corpo. Por isso existia o engradado; a partir daí a respiração produz memórias cada vez mais profundas. Teoricamente, os espreitadores têm de se lembrar de cada sentimento que tiveram na vida, e esse processo se inicia com uma respiração. Ela me avisou que o que estava me ensinando eram apenas preliminares, que mais tarde, em condições diferentes, me ensinaria as complexidades do processo.
Florinda disse que seu benfeitor lhe orientou a escrever uma 1ista de acontecimentos a serem revividos. Falou que a técnica se iniciava com uma respirada inicial. Os espreitadores começam com o queixo sobre o ombro direito e lentamente inspiram à medida que viram a cabeça num ângulo de cento e oitenta graus. A respirada termina no ombro esquerdo. Uma vez terminada a inspiração, a cabeça volta a ficar relaxada. Eles expiram olhando para a frente.
O espreitador então pega o primeiro acontecimento da lista e se concentra, até que todos os sentimentos que nele se encerram tenham sido recontados. Enquanto se lembram dos sentimentos que tiveram durante o acontecimento recordado, inspiram lentamente, movendo a cabeça do ombro direito para o esquerdo. A função dessa respiração é restaurar energia. Florinda disse que o corpo luminoso está cons­tantemente criando filamentos semelhantes a teias de aranha, que são projetados para fora da massa luminosa, impulsionados por qualquer tipo de emoções. Portanto, cada situação de interação ou cada situa­ção que envolve sentimentos é potencialmente drenada para o corpo luminoso. Respirando da direita para a esquerda enquanto se lem­bram de um sentimento, os espreitadores, através da mágica da respi­ração, pegam os filamentos que foram deixados para trás. A próxima respirada imediata é da esquerda para a direita e é uma expiração. Com ela os espreitadores soltam os filamentos deixados neles por outros corpos luminosos envolvidos no acontecimento que está sendo recordado.
Ela declarou que essas eram as preliminares essenciais da espreita que todos os membros do seu grupo tinham passado como introdução a exercícios mais apurados da arte. Sem fazer os exercícios prelimi­nares para recuperar os filamentos deixados no mundo, e particular­mente para desprezar os que os outros deixaram neles, não há possi­bilidade de manipular a loucura controlada, pois esses filamentos estranhos são a base da capacidade ilimitada de auto-importância de uma pessoa. Para exercitar a loucura controlado, já que ela não visa a enganar ou punir as pessoas ou se sentir superior a elas, tem-se de ser capaz de rir de si próprio. Florinda disse que um dos resultados de uma recapitulação detalhada é a graça de se ver face a face com a repetição monótona da auto-estima de alguém, que está no cerne de toda a interação humana.
Ela enfatizou que o regulamento definia a espreita e o sonho como artes, portanto, a serem representadas. Disse que a natureza produtora de vida da respiração é também o que dá sua capacidade de limpeza. É essa capacidade que faz da recapitulação uma questão prática.
O Presente da Águia, pág. 229

· “Disse que seu benfeitor considerava as três técnicas básicas da espreita - o engradado, a lista de acontecimentos a serem recapitulados, e a respiração do espreitador - como sendo as tarefas talvez mais importantes de um guerreiro. Ele achava que uma recapitulação profunda era o meio mais eficiente para se perder a forma humana. Portanto, seria fácil para os espreitadores, depois de recapitularem suas vidas, fazer uso de todos os não fazeres do seu eu, tais como apagar sua história pessoal, perder a auto-importância, quebrar as rotinas, e assim por diante.”
O Presente da Águia, pág. 230

· - Recordar não é o mesmo que relembrar - continuou. - Relembrar é ditado pelo tipo de pensamento cotidiano, enquanto recordar é ditado pelo movimento do ponto de aglutinação. Uma recapitulação de suas vidas, que os feiticeiros fazem, é a chave para mover seus pontos de aglutinação. Os feiticeiros começam sua recapitulação pensando, relembrando os atos mais importantes de suas vidas. Após apenas pensar a respeito deles, movem-se então para estar realmente no local do evento. Quando conseguem fazer isso, estar no local do evento, foi porque moveram com sucesso seu ponto de aglutinação ao lugar preciso onde estava quando o evento teve lugar. Trazer de volta o evento total por meio do movimento do ponto de aglutinação é conhecido como a recordação dos feiticeiros.
Olhou para mim por um instante, como se tentando assegurar-se de que eu estava escutando.
- Nossos pontos de aglutinação estão constantemente se movendo, movimentos imperceptíveis. Os feiticeiros acreditam que, para fazer seus pontos de aglutinação se moverem a pontos precisos, devemos empenhar por intento. Uma vez que não há maneira de saber o que é o intento, os feiticeiros deixam que seus olhos o chamem.
- Tudo isso é de fato incompreensível para mim - retruquei.
O Poder do Silêncio, pág. 129

· Morri naquele campo. Senti minha consciência fluindo para fora de mim e dirigindo-se na direção da Águia. Mas como eu havia recapitulado impecavelmente minha vida, a Águia não me devorou a consciência. A Águia cuspiu-me para fora. Por­que meu corpo estava morto no campo, ela não me deixou se­guir diretamente para a liberdade. Era como se me dissesse para voltar e tentar outra vez.”
O Poder do Silêncio, pág. 187

· Eu chegara ao ponto de ter medo de dormir nos dias em que sabia que teria aquele sonho.
- Você ainda não está verdadeiramente pronto para fundir sua realidade de sonho com sua realidade cotidiana. Precisa recapitular mais a sua vida.
- Mas eu já fiz toda a recapitulação possível - protestei.
- Venho recapitulando há anos. Não há mais nada que eu possa lembrar sobre minha vida.
- Deve haver muito mais - ele disse, inflexível. – De outro modo não acordaria gritando.
Não gostei da idéia de ter de recapitular outra vez. Eu tinha feito isso, e acreditava que fizera tão bem que não precisaria nunca mais tocar no assunto.
- A recapitulação de nossa vida nunca termina, não importa que tenhamos recapitulado direito - disse Dom Juan. - O motivo das pessoas comuns não terem vontade própria nos sonhos é nunca terem recapitulado, e suas vidas ficam cheias até a borda de emoções como lembranças, esperanças, medos etc. etc.
"Os feiticeiros, por outro lado, são relativamente livres de emoções pesadas e opressivas, por causa da recapitulação. E se alguma coisa faz com que eles fiquem bloqueados, como está acontecendo com você, a suposição é que ainda existe alguma coisa neles que não está suficientemente clara.”
- Recapitular é um negócio envolvente demais, Dom Juan.
- Talvez exista alguma outra coisa que eu possa fazer.
- Não, não existe. Recapitular e sonhar andam lado a lado. À medida que regurgitamos nossas vidas nós ficamos mais e mais leves.
Dom Juan me dera instruções detalhadas e explícitas sobre a recapitulação. Consistia em reviver a totalidade das experiências de vida lembrando-se de cada detalhe possível. Ele via a recapitulação como o fator essencial na redefinição e reestruturação da energia do sonhador.
- A recapitulação liberta a energia aprisionada dentro de nós, e sem essa energia liberada o sonhar não é possível.
A Arte do Sonhar, pág. 166

· Anos antes Dom Juan me levara a fazer uma lista de todas as pessoas que conhecera na vida, começando no presente. Ele me ajudou a arrumar a lista de modo ordenado, separando-a por áreas de atividade, como os empregos que eu tivera, as escolas onde estudara. Em seguida guiou-me para ir, sem qualquer desvio, da primeira pessoa em minha lista até a última, revivendo cada uma das interações que eu tivera com elas.
Explicou que a recapitulação de um evento começa com a mente arrumando tudo que tem a ver com o que está sendo recapitulado. Arrumar significa reconstruir o evento, peça por peça, começando pela lembrança dos detalhes físicos ao redor, e em seguida passando à pessoa com quem compartilhamos a interação, e em seguida para nós mesmos; para o exame de nossos sentimentos.
Dom Juan me ensinou que a recapitulação é realizada junto com uma respiração natural e rítmica. São feitas longas expirações enquanto a cabeça se move devagar e suavemente da direita para a esquerda; e são tomadas longas inalações quando a cabeça se move da esquerda para a direita. Ele chamava de "arejar o evento", esse ato de mover a cabeça de um lado para o outro. A mente examina o evento do princípio ao fim, enquanto o corpo ventila tudo em que a mente se concentra.
Dom Juan disse que os feiticeiros da antigüidade, os inventores da recapitulação, viam a respiração como um ato mágico, vivificante, e usavam-na como um veículo de magia; a expiração era usada para ejetar a energia estranha deixada neles enquanto a interação era recapitulada, e a inalação servia para recuperar a energia que eles tinham deixado para trás durante a interação.
Devido ao meus estudos acadêmicos eu tomei a recapitulação como o processo de analisar a própria vida. Mas Dom Juan insistiu que havia mais coisa envolvida do que uma psicanálise intelectual. Ele postulava a recapitulação como uma manobra dos feiticeiros para induzir um deslocamento minúsculo, porém firme, do ponto de aglutinação. Disse que, sob o impacto de rever sentimentos e ações do passado, o ponto de aglutinação fica indo e voltando do posicionamento atual para o que ele ocupava quando aconteceu o evento que está sendo recapitulado.”
A Arte do Sonhar, pág. 167

· Dom Juan afirmava que o raciocínio dos feiticeiros antigos, para explicar a recapitulação, era sua convicção de que existe uma inconcebível força de dissolução no universo, que faz os organismos viverem emprestando-lhes consciência. A mesma força também faz os organismos morrerem, para extrair deles a mesma consciência emprestada, que os organismos aprimoraram através de suas experiências de vida. Dom Juan explicou o raciocínio dos feiticeiros antigos. Eles acreditavam que, como essa força estava atrás de nossa experiência de vida, era de suprema importância o fato de que ela poderia se satisfazer com um fac-símile de nossa experiência de vida: a recapitulação. Ao receber o que deseja, a força de dissolução deixa os feiticeiros livres para expandir sua capacidade de perceber e de chegar com ela aos confins do tempo e do espaço.
Quando comecei a recapitular de novo tive a grande surpresa de ver meus treinamentos de sonhar suspensos automaticamente. Perguntei a Dom Juan sobre esse recesso indesejado.
- O sonhar exige toda a energia disponível - respondeu ele. - Se houver uma preocupação profunda em sua vida, não existe possibilidade de sonhar.
- Mas eu já estive profundamente preocupado antes, e meus treinamentos nunca se interromperam.
- Pode ser então que, toda vez que você achou que estava preocupado, estivesse apenas egomaniacamente perturbado - ele disse rindo. - Para os feiticeiros, estar preocupado significa que todas as nossas fontes de energia foram utilizadas. Essa é a primeira vez que você envolve a totalidade de suas fontes de energia. No resto do tempo, mesmo quando recapitulou antes, você não estava completamente absorvido.
Dessa vez Dom Juan me deu outro padrão de recapitulação. Eu deveria construir um quebra-cabeça recapitulando, sem qualquer ordem, diferentes fatos de minha vida.
- Mas vai ser uma confusão - protestei.
- Não, não vai - ele assegurou. - Será uma confusão se você deixar sua mesquinharia escolher os eventos a serem recapitulados. Em vez disso deixe o espírito decidir. Silencie, e em seguida vá até o evento que o espírito escolher.
Os resultados desse padrão de recapitulação foram chocantes em muitos níveis. Achei impressionante descobrir que, toda vez que silenciava meus pensamentos, uma força que parecia independente lançava-me de imediato numa lembrança detalhada de algum evento de minha vida. Mas foi ainda mais impressionante descobrir que daquilo resultava uma configuração bastante ordenada. O que imaginei que seria caótico acabou mostrando-se extremamente eficaz.
Perguntei a Dom Juan por que ele não me fizera recapitular daquele jeito desde o início. Ele respondeu que existem dois ciclos básicos para a recapitulação: o primeiro era chamado de formalidade e rigidez, e o segundo de fluidez.
Eu não tinha a menor idéia de como minha recapitulação seria diferente. A capacidade de concentração, que eu adquirira através dos treinamentos de sonhar, permitiu-me examinar minha vida numa profundidade que nunca imaginaria possível. Demorei mais de um ano para ver e rever tudo que podia sobre minhas experiên­cias. No final precisei concordar com Dom Juan: eu tinha uma imensidão de emoções escondidas tão profundamente a ponto de se tornarem virtualmente inacessíveis.
A Arte do Sonhar, pág. 168

· Tudo que esses feiticeiros faziam girava em torno de cinco preocupações:
- primeira, os passes mágicos;
- segunda, o centro energético no corpo humano chamado de centro para decisões;
- terceira, a recapitulação - as maneiras para aumentar o campo de ação da consciência humana;
- quarta, sonhar, a arte genuína de romper os parâmetros da percepção normal;
- quinta, o silêncio interior - o estágio da percepção humana do qual esses feiticeiros empreendiam cada uma das suas consecuções perceptivas.
Essa seqüência das cinco preocupações foi um conjunto moldado na compreensão que aqueles feiticeiros tinham do mundo ao seu redor.
De acordo com o que Dom Juan ensinava, uma das descobertas estarrecedoras daqueles xamãs foi a existência no universo de uma força aglutinadora que une campos de energia em unidades concretas e funcionais. Os feiticeiros que descobriram a existência dessa força descreveram-na como uma vibração ou condição vibratória que permeia grupos de campos de energia e os mantém unidos.
Em termos desse conjunto de cinco preocupações dos xamãs do antigo México, os passes mágicos preenchem a função da condição vibratória da qual falavam os xamãs. Quando aqueles feiticeiros juntaram essa seqüência xamanística das cinco preocupações, copiaram
O padrão da energia que lhes era revelado quando eles eram capazes de ver a energia como ela flui no universo. A força de ligação eram os passes mágicos. Os passes mágicos eram a unidade que permeava as quatro unidades restantes e as agrupava em um único todo funcional.”
Passes Mágicos, pág. 99

· OS PASSES MÁGICOS PARA A RECAPITULAÇÃO
A recapitulação afeta algo que Dom Juan chamava de corpo energético. Ele explicava formalmente o corpo energético como um conglomerado de campos de energia que são a imagem espelhada dos campos de energia que constituem o corpo humano quando ele é visto diretamente como energia. Dizia que no caso dos feiticeiros o corpo físico e o corpo energético são uma única unidade. Os passes mágicos para a recapitulação trazem o corpo energético para o corpo físico, o que é essencial para navegar no desconhecido:
13. Forjando o Tronco do Corpo Energético
14. Esbofeteando o Corpo Energético
15. Estendendo Lateralmente o Corpo Energético
16. Estabelecendo o Núcleo do Corpo Energético
17. Forjando os Calcanhares e as Panturrilhas do
18. Forjando os Joelhos do Corpo Energético
19. Forjando as Coxas do Corpo Energético
20. Despertando a História Pessoal Tomando-a Flexível
21. Despertando a História Pessoal Batendo Repetidamente com o Calcanhar no Chão
22. Despertando a História Pessoal Sustentando o Calcanhar no Chão
23. As Asas da Recapitulação
24. A Janela da Recapitulação
25. As Cinco Respirações Profundas
26. Extraindo Energia dos Pés
Passes Mágicos, págs.118 a 125

· “No mundo dos xamãs, perceber a energia de tal maneira é o primeiro passo obrigatório para uma visão mais livre, mais abrangente, de um sistema diferente de conhecimento. Para provocar em mim a resposta de ver, Dom Juan utilizou outras estranhas unidades de cognição. Uma das mais importantes chamava-se recapitulação, que consistia em um escrutínio sistemático da própria vida, segmento por segmento, um exame feito não à luz da crítica e da descoberta de falhas, mas à luz de um esforço para entender a própria vida e mudar o seu curso. O argumento de Dom Juan era que, uma vez que o praticante visse sua vida da maneira distanciada que a recapitulação exige, não havia mais a possibilidade de voltar à mesma vida.”
A Roda do Tempo, pág. 11

· Para Dom Juan Matus, recapitular significava reviver e remanejar tudo de nossa vida numa única ação. Ele nunca se preocupou com as minúcias das elaboradas variações daquela antiga técnica. Florinda, por sua parte, tinha uma meticulosidade totalmente diferente. Ela gastava meses treinando-me em aspectos da recapitulação que até hoje sou incapaz de explicar.
- É a vastidão do guerreiro o que você está experimentando - ela explicou. - As técnicas estão aí. Grande coisa. O que é de suprema importância é o homem que as usa e seu desejo de ir até o fim com elas.
A Roda do Tempo, pág. 230

· - A premissa dos feiticeiros é que para se introduzir algo, precisa-se de espaço para colocá-lo - disse ele. - Se você estiver cheio até a borda com itens da vida cotidiana, não há espaço para nada novo. Esse espaço precisa ser construído. Percebe o que eu quero di­zer? Os feiticeiros dos tempos antigos acreditavam que a recapitulação da sua vida abria esse espaço. Ela faz isso e muito mais, claro.
A maneira como os feiticeiros realizam a recapitulação é muito formal. Consiste em fazer uma lista de todas as pessoas que conhe­ceram, desde o presente até o início de suas vidas. Uma vez feita essa lista, pegam a primeira pessoa dela e lembram-se de tudo o que pu­derem sobre essa pessoa. E quero dizer tudo, cada detalhe. É melhor recapitular do presente para o passado, porque as memórias do pre­sente estão frescas e dessa maneira a capacidade de lembrar é afiada. O que os praticantes fazem é lembrar e respirar. Inspiram lenta e deliberadamente, girando a cabeça da direita para a esquerda, num balanço quase imperceptível, e expiram da mesma forma?
Disse que o inspirar e o expirar devem ser naturais; se forem rápidos demais, uma pessoa entraria no que se chama de respira­ção cansativa: respirações que depois precisam de respirações len­tas a fim de acalmar os músculos.
- E o que devo fazer, Dom Juan, com tudo isso? - perguntei. - Comece a fazer a sua lista hoje - disse ele. - Divida-a por anos, por ocupações, organize-a da maneira que quiser, po­rém faça-a em seqüência, com a pessoa mais recente primeiro e terminando com a sua mãe e o seu pai. Depois, lembre-se de tudo sobre elas. Não há mais nada para se fazer além disso. A medida que você pratica, perceberá o que está fazendo.
O Lado Ativo do Infinito, pág. 180

· - O poder da recapitulação - disse Dom Juan - é que revolve todo o lixo das nossas vidas e o traz para a superfície.
Depois Dom Juan delineou as complexidades da consciência e percepção, que eram as bases da recapitulação. Começou dizendo que ia apresentar um conjunto de conceitos que sob nenhuma condição deveriam ser tomados como teorias de feiticeiros, porque era um conjunto formulado pelos xamãs do México antigo como um resultado de ver a energia diretamente enquanto ela flui no universo. Ele me preveniu que iria me apresentar as unidades desse conjunto sem qualquer tentativa de classificá-las ou categorizá-las por qualquer padrão predeterminado.
- Não estou interessado em classificações - continuou ele. - Você tem classificado tudo na sua vida. Agora vai ser forçado a ficar longe das classificações. Outro dia, quando lhe perguntei se sabia alguma coisa sobre nuvens, você me deu os nomes de todas as nuvens e o percentual de umidade que se deve esperar de cada uma delas. Foi um verdadeiro meteorologista. Porém, quando lhe perguntei se sabia o que poderia fazer pessoalmente com as nuvens, não teve a menor idéia do que eu estava falando.
O Lado Ativo do Infinito, pág. 183

· “Explicou que os feiticeiros do México antigo viram que o universo como um todo é composto de campos energéticos na forma de filamentos luminosos. Viram milhões deles, onde quer que se virassem para ver. Também viram que esses campos ener­géticos se organizam em correntes de fibras luminosas, fluxos que são constantes, forças perenes no universo, e que a corrente ou o fluxo de filamentos que está relacionado com a recapitulação foi chamado por esses feiticeiros o mar escuro da consciência, e tam­bém a Águia.”
O Lado Ativo do Infinito, pág. 184

· “- Os feiticeiros acreditam - Dom Juan continuou - que à medida que recapitulamos as nossas vidas, todo o entulho, como lhe disse, chega à superfície. Percebemos as nossas inconsistências, nossas repetições, mas algo em nós coloca uma tremenda resis­tência para recapitularmos. Os feiticeiros dizem que o caminho fica livre somente depois de uma revolução gigantesca, depois de aparecer na nossa tela da memória um evento que mexe com as nossas bases com uma clareza de detalhes aterrorizadora. É o evento que nos arrasta para o momento exato em que o vivemos. Os feiticeiros chamam aquele evento de condutor, porque daí em diante cada evento que mencionamos é revivido, não meramente lembrado.”
O Lado Ativo do Infinito, pág. 186

· Caminhar é sempre algo que precipita as memórias. Os fei­ticeiros do México antigo acreditavam que tudo o que vivemos armazenamos como uma sensação na parte posterior de nossas pernas. Consideravam a parte posterior das nossas pernas como o armazém da história pessoal do homem. Portanto, vamos ago­ra caminhar nas montanhas.
Caminhamos até quase escurecer.
- Acho que já o fiz caminhar longe o suficiente - Dom Juan disse, quando voltamos para a sua casa - para que já esteja pronto para começar essa manobra dos feiticeiros de encontrar um con­dutor: um evento na sua vida que você lembrará com tal clareza que servirá como holofote para iluminar todo o resto da sua recapitulação com a mesma clareza, ou com clareza comparável. Faça o que os feiticeiros chamam de recapitulando peças de um quebra-cabeça. Alguma coisa o levará a se lembrar do evento que servirá como o seu condutor.
Dando-me um último aviso, me deixou só.
- Dedique a isso o seu melhor - disse ele. - Faça o seu melhor.
Fiquei extremamente silencioso por um momento, talvez de­vido ao silêncio à minha volta. Experimentei então uma vibra­ção, um tipo de solavanco em meu peito. Tive dificuldade em respirar, mas de repente algo abriu caminho em meu peito, per­mitindo que eu respirasse profundamente, e uma visão total de um evento esquecido de minha infância irrompeu em minha memória, como se tivesse ficado preso e de repente fosse libertado.
O Lado Ativo do Infinito, pág. 186

· “A claridade do condutor trouxe um novo ímpeto para a minha recapitulação. Uma nova disposição substituiu a anti­ga. Dali em diante, comecei a relembrar eventos de minha vida com uma clareza enlouquecedora. Era exatamente como se uma barreira tivesse sido construída dentro de mim, que me manteve rigidamente preso a lembranças pobres e embaçadas, e o condutor a derrubou.”
O Lado Ativo do Infinito, pág. 199

· - Há uma opção secreta para a recapitulação - disse Dom Juan. - Assim como lhe disse que há uma opção secreta para morrer, uma opção que somente os feiticeiros fazem. No caso de morrer, a opção secreta é que os seres humanos podem reter a sua força vital e renunciar somente à sua consciência, o produto de suas vidas. No caso da recapitulação, a opção secreta que somente os feiticeiros fazem é escolher intensificar as suas mentes verdadeiras.
A memória inquietante de suas recordações só poderia vir de sua mente verdadeira. A outra mente que todos temos e compartilhamos, eu diria, é um modelo barato: um poder econômico, o mesmo tamanho serve para todos. Porém, esse é um assunto que discutiremos mais tarde. O que está em jogo agora é o advento de uma força desintegradora. Mas não a força que o está desintegrando, não é isso que quero dizer. Ela está desintegrando o que os feiticeiros chamam de instalação forânea, que existe em você e em todo o ser humano. O efeito da força que está surgindo em você, que está desintegrando a instalação forânea, é que puxa os feiticeiros para fora da sintaxe delas.
O Lado Ativo do Infinito, pág. 208

· “- As circunstâncias a sua volta fizeram com que fosse possí­vel para você ter mais energia - continuou ele. - Você come­çou a recapitulação de sua vida; olhou para seus amigos pela primeira vez como se estivessem numa vitrine; chegou ao seu ponto de ruptura, completamente sozinho, levado pelas suas pró­prias necessidades; se desfez do seu negócio; e acima de tudo acu­mulou suficiente silêncio interior. Tudo isso fez com que fosse possível para você fazer essa viagem através do mar escuro da cons­ciência.”
O Lado Ativo do Infinito, pág. 219

· “Dom Juan tinha incutido um axioma de feiticeiros em mim: "Os guerreiros-viajantes pagam elegantemente, genero­samente e com inigualável facilidade cada favor, cada serviço prestado a eles. Dessa maneira, livram-se do peso de estar endi­vidados."
Tinha pago, ou estava em processo de pagar, a todos que me
honraram com seus cuidados ou preocupações. Tinha recapitu­lado minha vida a tal ponto que não deixara nem uma pedra sem tocar. Naquela época, acreditava verdadeiramente que não devia nada a ninguém. Expressei minhas crenças e hesitações para Dom Juan.
Dom Juan disse que com certeza eu tinha recapitulado minha vida minuciosamente, mas acrescentou que eu estava longe de estar livre de dívidas.
- E os seus fantasmas? - continuou ele. - Aqueles que não pode mais tocar?
Ele sabia o que estava falando. Durante minha recapitulação, contei-lhe cada incidente de minha vida. Das centenas de inci­dentes que lhe relatei, ele isolara três como exemplos de dívidas que contraí no início de minha vida, e somado a isso minha dívi­da para com a pessoa que tinha sido fundamental para que eu o encontrasse. Agradeci ao meu amigo profusamente, e tive a sen­sação de que algo lá fora reconheceu os meus agradecimentos. Os outros três permaneceram histórias de minha vida, histórias de pessoas que me deram um presente inconcebível, a quem eu nunca agradecera.
O Lado Ativo do Infinito, pág. 295

· "Percebam o que vocês têm e não o desperdicem! O sexo é dinheiro, dinheiro vivo! Nosso destino cósmico é expandir a consciência, por isso fomos dotados com uma porção do poder criativo da águia. O sexo foi feito para ensonhar".
Afirmou que, teoricamente, o intercâmbio sexual dos casais não tem porque afetar a disponibilidade luminosa de cada um dos participantes, já que o homem toma da mulher tanto quanto ela toma dele. E o resultado é um equilíbrio neutro. Em todo caso, o indesejável da operação é que a energia se mistura, razão pela qual são gerados laços de dependência que restringe nossa liberdade e que exigem longos anos de recapitulação para serem desfeitos.”
Encontros com o Nagual, pág. 72

· Em uma determinada ocasião, comentou que apesar da drenagem de energia a que a interação social nos expõem, todos nós temos uma opção, pois a característica lacrada de nossa constituição luminosa nos permite reiniciar continuamente do zero para recuperar nossa totalidade.
"Nunca é tarde afirmou. Enquanto nós estivermos vivos, sempre há um modo de conquistar qualquer tipo de bloqueio. O melhor modo para recuperar as fibras luminosas que temos dissipado é chamando de regresso à nossa energia. A parte mais importante é dar o primeiro passo. Para esses que estão interessados na economia e recuperação da energia, o único caminho aberto é a recapitulação.”
Encontros com o Nagual, pág. 78

· Os compromissos emocionais que contraímos com as pessoas são como investimentos feitos ao longo do caminho. É preciso ser muito insensato para deixar nosso patrimônio jogado por aí!
A única forma através da qual podemos estar completos de novo é recolhendo esse investimento, reconciliando-nos com nossa energia e dissipando a carga dos sentimentos. O melhor método que os bruxos descobriram para isto, é recordando os eventos de nossa história pessoal até a sua completa digestão. A recapitulação nos ajuda a sair do passado e nos insere no agora.
"Não podemos evitar o fato de termos nascido como resultado de sexo aborrecido, e nem ter investido a maioria de nossa luminosidade em fazer filhos ou manter relações extenuantes. Mas nós podemos recapitular; isso cancela o efeito energético desses atos.”
Encontros com o Nagual, pág. 79

· "Recapitular é espreitar nossas rotinas, submetendo-a a um escrutínio sistemático e impiedoso. É a atividade que nos permite visualizar nossa vida como totalidade e não como uma sucessão eventual de momentos. Porém, e ainda que isto possa parecer estranho, só os bruxos recapitulam como norma; o resto das pessoas apenas o faz por casualidade.”
Encontros com o Nagual, pág. 79

· Em outra conferência, Carlos se referiu à estagnação luminosa que descreveu como uma fixação de nossa atenção que bloqueia o fluxo da energia. Ele disse que isto acontece quando nós nos recusamos a enfrentar os fatos e nos escondemos atrás de ações evasivas. E também quando deixamos assuntos pendentes ou contraímos compromissos que nos amarram.
A conseqüência da estagnação é que a pessoa deixa de ser ela mesma. Ao ficar pressionada pela cadeia de decisões pela qual foi tomada durante sua vida, já não pode agir de um modo deliberado e se emaranha nas circunstâncias. Esta situação pode chegar ao ponto de se transformar em uma doença mental ou física, e só se pode resolver isso através da recapitulação.
Encontros com o Nagual, pág. 80

· Sustentou que, em essência, recapitular consiste em fazer uma lista das feridas causadas por nossas interações. O passo seguinte é viajar de retorno ao momento quando aconteceram os fatos para absorver de volta o que nos pertence e devolver o alheio.
O guerreiro começa a rebobinar seu dia. Reconstrói as conversações, decifra os significados, recorda os rostos e os nomes, procura matizes, insinuações, disseca as reações emocionais próprias e das outras pessoas. Não deixa nada ao acaso, agarra as lembranças do dia uma por uma e as limpa através da respiração.
Também examina capítulos e categorias completas de sua vida. Por exemplo, as namoradas que teve, as casas onde viveu, escolas, lugares de trabalho, amigos e inimigos, brigas e momentos felizes, e assim por diante. O ideal é atacar a tarefa por ordem cronológica, da memória mais recente até a mais distante que for possível evocar. Mas, para começar, é mais fácil fazê-lo por tópicos.
"Uma forma muito rentável do exercício, acessível a todos nós, é a recapitulação fortuita. Se vocês perceberem, nós estamos constantemente recapitulando. Todas as recordações que conformam nosso diálogo interno podem ser classificadas como tal. Porém, nós os evocamos de forma involuntária. Em vez de os observar em silêncio, nós os julgamos, interagimos visceralmente com eles. Isso é lamentável. Um guerreiro tira proveito da oportunidade, porque essas recordações, aparentemente ao acaso, são avisos de nosso lado silencioso".
Mostrou que para recapitular não são necessárias condições especiais. A pessoa pode tentar o exercício em qualquer momento e lugar em que se sinta animado a fazê-lo.
"Os guerreiros recapitulam quando vão caminhando, no banheiro, ao trabalhar ou ao comer, quando for possível! O importante é fazê-lo".
Acrescentou que não há uma posição definida. O único requisito é estar confortável, de forma que o corpo físico não demande atenção nem interfira com as recordações.
Encontros com o Nagual, pág. 80

· A recapitulação parte de dentro e se sustenta sozinha. É uma questão de silenciar a mente e então nosso corpo energético toma o controle, fazendo o que para ele é uma delícia fazer. Você se sente bem, confortado; longe de dar trabalho, o deixa descansado. Seu corpo percebe isso como uma ducha inefável de energia.
Mas você deve ter a atitude correta. Não confunda o exercício com uma questão psicológica. Se o que você necessita são interpretações, vá até o psiquiatra! Ele dirá o que fazer para que você continue sendo o idiota que é. E menos ainda você deveria andar atrás de uma lição. As histórias com moral só existem nos contos para crianças.
A recapitulação é uma forma especializada de espreita e vocês devem empreender isto com um alto sentido de estratégia. Trata-se de entender e pôr em ordem nossas existências, vendo-as tal e qual são, sem remorsos, repreensões ou felicitações, com desapego total e um ânimo leve, até de humor, porque nada em nossa história é mais importante que nada e todas as relações, afinal, são efêmeras.
O importante é começar, porque a energia que nós recuperamos desde o primeiro intento nos dará forças para continuar recapitulando aspectos mais e mais intrincados de nossas vidas. Primeiro, é necessário começar pelo investimento mais forte que são os sentimentos mais desgarrados. Depois seguimos por aquelas memórias tão profundas que nós já acreditávamos esquecidas, mas que estão ali.
Encontros com o Nagual, pág. 82

· No princípio, recapitular pode nos dar algum trabalho, porque nossa mente não está acostumada à disciplina. Mas, depois de fechar as feridas mais dolorosas, a energia se reconhece a si mesma e nós vamos ficando viciados no exercício. Dessa maneira, cada partícula de luz que recuperamos nos ajuda a ganhar mais.
"No momento em que vocês se disponham a desemaranhar voluntariamente o enredo das suas histórias pessoais, estarão dando o passo decisivo".
"No momento em que vocês se disponham a desemaranhar voluntariamente o enredo das suas histórias pessoais, estarão dando o passo decisivo".
Respondendo a outra pergunta, ele disse que a recapitulação não tem fim, deve durar até o final de nossos dias e mais adiante.
"Eu estiro minhas fibras ao rememorar cada noite o que ocorreu durante o dia. Assim, minha lista de eventos se mantém atualizada. Mas uma vez por ano eu realizo um exercício mais completo e total, para o qual eu me distancio de tudo durante várias semanas".
Encontros com o Nagual, pág. 83

· Outras das perguntas que lhe fizeram foram concernentes aos efeitos da recapitulação sobre a consciência.
Sustentou que o exercício tem dois efeitos principais.
De imediato, corta nosso diálogo interno. Quando um guerreiro consegue parar seu diálogo está estreitando relações com sua energia. Isso o libera da obrigação da memória e da carga dos sentimentos, e deixa um resíduo energético que pode ser investido no aumento das fronteiras da percepção. O guerreiro começa a apreciar a coisa genuína, não a interpretação. Pela primeira vez, faz contato com o consenso dos bruxos que é a descrição de uma realidade inconcebivelmente integrada.
É normal que um guerreiro nesta fase ria à toa, porque a energia provê alegria. Graças à recapitulação, está contente, transbordante, salta como um menino. Por outro lado, começa a ser uma pessoa temível, já que, ao ter intacta sua luminosidade e sua vida limpa, as decisões já não serão um obstáculo para ele. Vai decidir o que seja necessário no momento em que queira e isso assusta aos outros.
Também é aqui que se requer do guerreiro uma dose extra de sobriedade e sensatez, porque do contrário ele correrá riscos desnecessários, pondo em perigo a segurança dele e de outros.
"Outro efeito da recapitulação é que funciona como um convite ao espirito para que venha e faça morada conosco. Dito em outros termos, relembrar nosso passado é o método mais efetivo para unificar os corpos físico e energético que estiveram separados durante anos".
Continuou dizendo que o bruxo que logra recompactar o mais grosso de sua energia está em condições de se propor uma proeza perceptual: intentar uma cópia de sua experiência vital para enganar a morte.
"Tal é o objetivo final da recapitulação: criar um duplo e se preparar para ir. Não é necessário ser um bruxo para entender a importância de tudo isso. Morrer em dívida é uma forma lamentável de morrer. Por outro lado, ter um duplo para oferecer à águia é a garantia de seguir adiante.”
Encontros com o Nagual, pág. 83

· Em outra de suas conversas, referiu-se a um método desenhado pelos novos videntes que pode ajudar no exercício da recapitulação.
Afirmou:
"Uma das tarefas dos bruxos é analisar constantemente as insinuações do espírito. Para isto, eles costumam elaborar um livro de eventos memoráveis, um mapa das ocasiões em que o espirito interveio em suas vidas, obrigando-lhes a tomarem decisões de um modo voluntário ou involuntário".
Explicou que a vantagem desta técnica é que, ao escrever, nós nos desapegamos um mínimo das coisas e conseguimos focalizá-las com mais objetividade.
"Não se trata de descrever nossa rotina diária, mas de estar atentos aos raros momentos em que o intento se manifesta. Essas são conjunturas mágicas, porque produzem mudanças e nos põem diante do sentido de nossa existência".
A pedidos, apresentou alguns exemplos de eventos desse tipo.
"Embora os sinais do espirito sejam um assunto do mais pessoal, há eventos comuns que em geral marcam a vida das pessoas, como nascer, escolher uma carreira, entrelaçar o destino com o de outra pessoa ou ter filhos. Também as doenças e acidentes graves, porque eles estabelecem uma ligação com a morte. Para aqueles que têm a fortuna de achar um conduto do espírito sob a forma de um nagual, este é sem dúvidas o evento mais memorável de todos.”
Encontros com o Nagual, pág. 85

· Porém, o método favorito dos guerreiros é a recapitulação. A recapitulação para a mente de um modo natural.
O principal combustível de nossos pensamentos são os assuntos pendentes, as expectativas e a defesa do ego. É muito difícil de achar uma pessoa cujo diálogo interno seja sincero; o comum é que nós dissimulemos nossas frustrações indo até o extremo oposto. Deste modo, o conteúdo de nossa mente se torna uma ode ao eu.
Recapitular acaba com tudo isso. Depois de um tempo de esforço contínuo, algo cristaliza aí dentro. O diálogo habitual fica incoerente, incômodo; não existe outro remédio senão pará-lo.
É normal que um aprendiz nesta fase se depare com um fogo cruzado. Por um lado, está a homogeneização do seu ponto de aglutinação; e por outro, uns enormes parênteses de silêncio que se metem em sua mente, fragmentando-a.
Quando se esgota a inércia do diálogo interno, o mundo se refaz novamente. A onda de energia se sente como um insuportável vazio que se abre debaixo dos pés. Por tal motivo, o guerreiro pode passar anos de instabilidade mental. A única coisa que o conforta em tal situação é manter claro o propósito do seu caminho e não perder, de nenhuma maneira, sua perspectiva de liberdade. Um guerreiro impecável jamais perde a sensatez.
Encontros com o Nagual, pág. 95

· Como vai sua recapitulação?
A pergunta dele me pegou desprevenido. Respondi que ainda não havia intentado o exercício porque estava esperando para ter condições favoráveis em minha casa.
Lançou-me um olhar muito sério, quase de repreensão, e comentou que, para os bruxos, a totalidade de um caminho se resume em seu primeiro passo.
"Isso significa que as condições ideais são aqui e agora".
Encontros com o Nagual, pág. 104

· Os bruxos manipulam a mente forasteira tornando-se caçadores de energia. É com essa finalidade que minhas companheiras e eu desenhamos para as massas os exercícios de tensegridade que têm a virtude de nos libertar da mente do voador.
Nesse sentido, o bruxo é um oportunista. Aproveita o empurrão que lhe deram e diz a seu captores: 'Obrigado por tudo, nos vemos por aí! O acordo que vocês fizeram foi com meus antepassados, não comigo!'. Ao recapitular sua vida, literalmente está tirando a comida da boca do voador. É como se você chegasse à uma loja e devolvesse o produto ao negociante, exigindo-lhe: 'Devolva-me o dinheiro!'. Os inorgânicos não gostam disso, mas não podem fazer nada.
Nossa vantagem é que somos dispensáveis, há muita comida por aí! Uma posição de alerta total, que não é outra coisa senão disciplina, cria tais condições em nossa atenção que nós deixamos de ser saborosos para esses seres. Em tal caso, eles dão meia volta e nos deixam tranqüilos.
Encontros com o Nagual, pág. 157

· Considerando que há duas formas de viver e de morrer, há também dois tipos de pessoas: aqueles que pensam que são imortais e aqueles que já estão mortos. Os primeiros guardam esperanças, os últimos não. Um guerreiro é alguém que sabe que o tempo dele já terminou, mas continua lutando, porque essa é sua natureza. Se você olhar nos olhos dele, contemplará o vazio".
Então, em que consiste realmente a alternativa do bruxo?".
Há uma única forma na qual o homem pode se adiantar ao seu fim: através da manipulação de sua energia. Esse trabalho consiste de ensonho, espreita e recapitulação. As três técnicas se fundem em um mesmo resultado: o complemento do corpo energético.
Em um sentido geral, a duração de nossa existência depende em grande medida de como tratamos nossa energia. Nós deixamos a vida por assim dizer 'grudada' nos assuntos diários, vamos nos desgastando nas coisas que vemos e tocamos, e por isso morremos. Mas se nós chamarmos de volta toda essa força vital através da recapitulação, a morte já não poderá ser a mesma, porque teremos nossa totalidade.
Encontros com o Nagual, pág. 173

· Tanto o sonho como a recapitulação torna possível a criação do "duplo" energético, uma entidade praticamente indestrutível, capaz de atuar por conta própria.
Um dos descobrimentos mais relevantes dos videntes toltecas, foi que os seres humanos possuem uma configuração luminosa ou campo de energia ao redor de nosso corpo físico. Eles também viram que algum poucos vinham com uma configuração especial dividida em duas partes. A estes chamaram naguais, quer dizer, "pessoas duplicadas". Por sua particular conformação, o nagual tem maiores recursos do que a maioria das pessoas. Eles também viram que, por causa de sua duplicidade e excepcional energia, eles são líderes naturais.
Encontros com o Nagual, pág. 237