sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

A Recapitulação 1


A Travessia das Feiticeiras - Taisha Abelar - Ed. Nova Era

Índice das Páginas: 62, 63, 66, 67, 75, 76, 80, 81, 83, 85, 91, 109, 116, 117, 118, 121, 122, 137, 138, 155, 156, 157, 203, 206, 276.


[Clara Grau]


A recapitulação é o ato de trazer de volta a energia que já despendemos em ações passadas. Ela inclui recordar todas as pessoas que conhecemos, todos os lugares que vimos e todos os sentimentos que tivemos em toda nossa vida - começando pelo presente e voltando às lembranças mais antigas - para então purifica-las com a vassoura da respiração. Instruiu-me para inspirar pelo nariz quando ela virasse minha cabeça para a esquerda e expirasse quando ela a virasse para a direita. Em seguida, eu devia virar a cabeça para a esquerda e a direita em um único movimento, sem respirar. Explicou ser esta uma misteriosa maneira de respirar e a chave para a recapitulação, pois a inspiração nos permite puxar a energia perdida de volta, e a expiração nos permite expelir a energia estranha e indesejável, acumulada em nós através da interação com nossos semelhantes. Para viver e interagir precisamos de energia. Normalmente a energia despendida nos é retirada para sempre. Não fosse a recapitulação, jamais teríamos a oportunidade de nos renovarmos. Recapitular nossas vidas e varrer nosso passado com a respiração funcionam como uma unidade. Quando fizer a recapitulação, tente sentir alguns filamentos longos distendendo-se, e que partem da parte média de seu corpo. Alinhe então o movimento de giro de sua cabeça com o movimento desses filamentos impalpáveis. Eles são os condutores que trarão de volta a energia que você deixou para trás. Para recuperarmos nossa força e unidade, precisamos liberar nossa energia aprisionada no mundo e puxa-la de volta para nós. Durante a recapitulação, nós estendemos esses filamentos de energia preguiçosos através do espaço e do tempo, até as pessoas, locais e acontecimentos que vamos examinar. Como resultado, podemos retornar a cada momento de nossas vidas e agira como se realmente estivéssemos lá. Fazer uma lista de todas as pessoas que havia conhecido, iniciando pelo presente e retrocedendo até minhas primeiras lembranças. É parte necessária da recapitulação. A lista é uma matriz à qual a mente pode fixar-se. Explicou então que o estágio inicial da recapitulação compõe-se de duas coisas. A primeira é a lista, e a segunda é criar a cena. Criar a cena consiste em visualizar todos os detalhes relativos aos acontecimentos que vão ser lembrados. Quando tiver todos os elementos no lugar, use a vassoura da respiração; o movimento de sua cabeça é como um leque que agita tudo nessa cena. Se você lembrar de um quarto, por exemplo, respire nas paredes, no teto, na mobília, nas pessoas que visualizar. E não pare até ter absorvido a última porção de energia que você deixou para trás. Seu corpo lhe dirá quando chegar o momento de acabar. Lembre-se, tenha a intenção de inspirar a energia que você deixou na cena que estiver recapitulando, e expirar a energia alheia lançada em você pelas pessoas.


[Clara Grau]


Devemos iniciar a recapitulação concentrando nossa atenção em nossa atividade sexual passada. Grande parte de nossa energia fica aprisionada aí. Por isso temos que liberar essas memórias em primeiro lugar. Início da manhã e o fim da tarde eram as horas mais propícias para iniciar um empreendimento tão amplo. Pegue a primeira pessoa da sua lista e trabalhe sua lembrança para recordar tudo que vivenciou com essa pessoa, desde o momento em que vocês se conheceram até a última vez em que se encontraram. Ou, se você preferir, você pode trabalhar ao inverso, partindo da última vez que encontrou essa pessoa até o primeiro encontro.


[Taisha]


De posse da lista, eu ia a caverna todos os dias. A princípio a recapitulação foi bastante difícil. Eu não conseguia me concentrar, pois me apavorava vasculhar o passado. Minha mente vagava daquilo que eu considerava um fato traumático para o próximo, ou eu simplesmente repousava ou devaneava. Contudo, algum tempo depois, intrigou-me a clareza e os detalhes que minhas recordações iam adquirindo. Comecei inclusive a ser mais objetiva em relação à experiência que sempre considerara tabu. Surpreendentemente, também me sentia cada vez mais forte e otimista. Às vezes, quando respirava, era como se a energia estivesse voltando para meu corpo, tornando meus músculos ativos e volumosos. Envolvi-me tanto com a recapitulação que não precisei de um mês inteiro para comprovar sua eficácia.


[Clara Grau]


Existe uma maneira de mudar. Chama-se recapitulação. Uma recapitulação completa e profunda nos permite tomar consciência daquilo que queremos mudar, possibilitando-nos ver nossas vidas sem ilusão. Ela nos proporciona uma pausa momentânea, na qual podemos optar por aceitar nosso comportamento habitual ou modifica-lo, tendo a intenção de eliminá-lo antes que ele nos aprisione por completo. Para mudarmos, precisamos satisfazer três condições. Primeiro, temos que enunciar em voz alta nossa decisão de mudar, para que o intento nos ouça. Segundo, temos que direcionar nossa percepção por determinado período de tempo: não podemos simplesmente começar alguma coisa e abandoná-la tão logo nos sentimos desencorajados. Terceiro, temos de visualizar o resultado de nossos atos com uma sensação de completo desapego. Isso significa que não podemos nos envolver com a idéia de sucesso ou fracasso. Siga essas três etapas e você poderá mudar quaisquer sentimentos e desejos em você. À medida que você der continuidade a recapitulação, a entrada na esfera onde a humanidade não é importante lhe irá aparecer. Este será o convite para você atravessar o olho do dragão. É o que chamamos de vôo abstrato. Na verdade, ele implica a travessia de enorme abismo para chegar a uma esfera que não pode ser descrita porque o homem não é a sua medida. A finalidade da recapitulação é romper com pressupostos básicos que aceitamos ao longo de nossas vidas. Enquanto não forem rompidos, não poderemos impedir que o poder da recordação obscureça nossa percepção. O mundo é uma enorme tela de lembranças; se determinadas pressuposições são rompidas, o poder da recordação não é apenas controlado, mas até mesmo cancelado.


[Taisha lembra que quando pequena via as sombras se movendo]


Nunca ficar de sapatos enquanto estivesse recapitulando, pois comprimindo os pés, a circulação energética é interrompida.


[Taisha]


Movi a cabeça da direita para a esquerda, inspirando a energia que ainda estava irremediavelmente presa no auditório. Quando virei a cabeça novamente para a direita, expirei todo o constrangimento e autopiedade que havia tomado conta de mim. Movimentei a cabeça repetidamente, realizando uma respiração de varredura após a outra, até que todo o turbilhão emocional foi liberado. Então virei a cabeça da direita para a esquerda e voltei sem respirar rompendo dessa maneira todos os laços com aquele momento específico de meu passado. [recapitulação da pratica de karatê]


[Clara Grau]


Seu inventário está mudando muito natural e harmoniosamente. Não se preocupe demais. Simplesmente concentre-se na recapitulação, e todo o resto virá por si mesmo. As pessoas que criaram a recapitulação viveram há centenas, senão milhares, de anos. Você não deve, portanto, considerar este milenar processo de renovação como uma psicanálise moderna. A recapitulação é um ato mágico, no qual o intento e a respiração representam um papel fundamental. Respirar concentra energia e promove sua circulação. Ela é então conduzida pelo intento preestabelecido da recapitulação, que é libertar-nos de nossas amarras biológicas e sociais. O intento da recapitulação é uma dádiva que nos é concedida por aqueles videntes da antiguidade que criaram esse método e transmitiram-no a seus ancestrais. Cada pessoa que realiza a recapitulação precisa acrescentar seu próprio intento, mas este intento é simplesmente o desejo ou a necessidade de fazer a recapitulação. O intento de seu resultado final, que é a liberdade total, foi estabelecido pelos videntes da antiguidade. E como foi estabelecida independentemente de nós, constitui uma dádiva inestimável. A recapitulação revela-nos uma faceta crucial de nosso ser: a possibilidade de, por um instante, pouco antes de mergulharmos em qualquer ato, avaliar acuradamente seu resultado, nossas chances, motivações e expectativas. Este conhecimento nunca é conveniente ou satisfatório para nós, por isso nós suprimimos imediatamente. Esse momento de conhecimento direto foi chamado de O VIDENTE pelas pessoas que formularam pela primeira vez a recapitulação, pois ele nos permite ver diretamente as coisas com olhos límpidos. No entanto, não obstante a clareza e a precisão das avaliações do vidente, nunca prestamos atenção a ele, nem lhe damos a oportunidade de se fazer ouvido. Com a contínua repressão, paralisamos seu crescimento e o impedimos de desenvolver todo o seu potencial. Ao final, o vidente dentro de nós se enche de amargura e ódio. Os sábios da antiguidade que inventaram a recapitulação acreditavam que, como nunca paramos de reprimir o vidente, ele finalmente nos destrói. Mas esses sábios também nos asseguraram que, por meio da recapitulação, podemos permitir ao vidente crescer e desenvolver-se como deveria ocorrer originalmente. A finalidade da recapitulação é assegurar ao vidente a liberdade de ver. Dando-lhe espaço, podemos deliberadamente transformar o vidente em uma força que é ao mesmo tempo misteriosa e eficaz, uma força que eventualmente nos conduzirá até a liberdade, em vez de nos matar. Por esta razão peço-lhe sempre para relatar o que descobriu através de sua recapitulação. Você deve trazer o vidente até a superfície e dar-lhe a oportunidade de falar e dizer o que está vendo.


[Taisha]


Sabia perfeitamente bem que existe algo dentro de mim que sempre sabe o que é o quê. Sempre soube que eu reprimia sua capacidade de aconselhamento, pois o que ele me diz em geral é contrário àquilo que espero ou quero ouvir. A única ocasião em que invoquei a orientação do vidente dói quando contemplei o horizonte sul e busquei seu auxílio deliberadamente, embora jamais tivesse conseguido explicar porque fizera aquilo.


[Clara Grau]


Para nos esvaziarmos temos de mergulhar em um estado de recapitulação profunda e permitir que a energia flua através de nós livremente. Apenas na quietude podemos conceder ao vidente pleno domínio, ou a energia impessoal do universo pode transformar-se na própria força pessoal do intento. Quando nos esvaziamos suficientemente de nosso inventário obsoleto e obstaculizante, recebemos a energia que se acumula naturalmente; quando uma quantidade suficiente se aglutina, ela se transforma em poder. Qualquer coisa pode anunciar sua presença: um ruído alto, uma voz suave, um pensamento que não é nosso, uma onda inesperada de vigor e bem-estar. Não faz diferença se o poder desce sobre nós em estado de vigília ou em estado onírico; ele é igualmente válido em ambos os casos, sendo o último, contudo, mais impalpável e poderoso. Aquilo que experimentamos na vigília, em termos de poder, deve ser colocado em prática nos sonhos e todo poder que vivenciamos nos sonhos deve ser usado enquanto estamos acordados. O que realmente importa é estarmos consciente, estejamos nós acordados ou adormecidos. O que importa é estar consciente. Quando crianças freqüentemente fazemos promessas e depois ficamos presos a elas, embora não consigamos mais nos lembrar de que as fizemos. Ela disse que existem momentos na vida de cada pessoa, sobretudo na tenra infância, nos quais queremos tanto alguma coisa que automaticamente fixamos todo nosso intento nesse alvo que, uma vez fixado, permanece o mesmo até realizarmos nosso desejo. Votos, juramentos e promessas aprisionam nosso intento de tal modo que, a partir deles, nossos atos, sentimentos e pensamentos são sistematicamente direcionados para a realização ou manutenção desses compromissos, não importa se lembramos ou não que os fizemos. Rever, durante a recapitulação, todas as promessas que já se tenha feito na vida, especialmente aquelas feitas às pressas, fruto do desconhecimento ou de julgamento errôneo, pois, a menos que se retire o intento das mesmas, este intento jamais poderá surgir para expressar-se livremente no presente.


[Dom Juan]


Inspirar profundamente, girando suavemente a cabeça para a esquerda. Então expirar até o fim, girando bem suave a cabeça para a direita. Por último, girar a cabeça do ombro direito até o esquerdo e de volta para o direito sem respirar, voltando depois ao centro. Quando expirar, jogue fora todos os pensamentos e sentimentos que estiver revendo. Não fique apenas girando a cabeça com os músculos do pescoço. Conduza-a com as linhas de energia invisíveis de seu abdômen. Estimular essas linhas a sair é uma das tarefas da recapitulação. Bem abaixo do umbigo há um centro de poder fundamental e que todos os movimentos do corpo, incluindo a respiração, tinham de envolver esse ponto energético. Sincronizar o ritmo da respiração com o movimento da cabeça, de modo que juntos eles estimulem as linhas energéticas invisíveis do abdômen ampliar-se rumo ao infinito. Essas linhas invisíveis são parte do corpo sutil, o duplo. Quanto mais energia você estimula com a manipulação dessas linhas, mais forte se torna o duplo. O corpo físico é um revestimento, um recipiente. Quando crianças, tínhamos plena consciência de nosso duplo; à medida que fomos crescendo, aprendemos a valorizar cada vez mais o lado físico e menos o etérico. O corpo sutil é uma massa de energia. Temos consciência apenas de seu revestimento externo e sólido. Nós nos tornamos conscientes de nosso lado etérico permitindo que nosso intento volte até ele. Nosso corpo físico está inseparavelmente ligado a sua contraparte etérea, mas eu este elo tem sido toldado por nossos pensamentos e sentimentos. Para transferir a percepção de nossa aparência concreta para sua contraparte fluida, precisamos em primeiro lugar dissolver a barreira que separa os dois aspectos de nosso ser. A recapitulação ajuda a dissolver nossas preconcepções, mas é preciso habilidade e concentração para alcançar o duplo. É perigoso liberar a energia aprisionada dentro de nós, pois o duplo é vulnerável e pode prejudicar-se facilmente durante o processo de mudança de nossa percepção para ele. Você pode criar uma abertura na rede etérica e perder grandes quantidades de energia. Energia preciosa, necessária para manutenção de um certo nível de clareza e controle em sua vida. A rede etérica é a luminosidade que envolve o corpo físico. Esta rede de energia é feita em pedaços durante a vida cotidiana. Grandes porções se perdem ou se entrelaçam nas faixas de energia de outras pessoas. Se uma pessoa perde excessivamente a força vital, ela adoece ou morre. A respiração atua nos níveis físico e etérico. Ela repara qualquer dano existente na rede etérica e a mantém forte e maleável. É isso o que se faz na recapitulação. Retirando filamentos de energia da rede etérica, os quais se perderam ou emaranharam em conseqüência da vida cotidiana. Você estará trazendo de volta tudo o que dispersou ao longo dos anos e em milhares de lugares.


[Nélida Abelar]


A respiração purificadora realizada durante a recapitulação acabará permitindo recordar tudo o que já se fez, incluindo os sonhos. O futuro não existe. É tempo de você perceber isso. E quando concluir a recapitulação e apagar completamente o passado, tudo que restará será o presente. Então você saberá que o presente é apenas um instante, nada mais.


[Taisha]


Sentada sobre um galho robusto, as costas apoiadas no tronco da árvore, minha recapitulação assumiu um tom completamente diferente. Eu conseguia recordar os menores detalhes das experiências de minha vida, sem medo de qualquer envolvimento emocional inferior. Eu ria a plenos pulmões de coisas que outrora tinham sido traumas profundos para mim. Minhas obsessões não mais despertavam autopiedade. Enxergava tudo sob uma perspectiva diferente, não como a pessoa urbana que sempre fora, mas como o habitante de árvore despreocupada e livre que eu me tornara.

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