sábado, 27 de fevereiro de 2010

Cacos do Mundo


Aforismos sobre a globalização das crenças

Em tempos imemoriais, Brahmam (a Luz eterna) entrou em movimento gerando Vishnu (a Força) e Shiva (a Forma).
A Vishnu foi entregue a tarefa de criação e de manutenção de todo o Universo.
E a Shiva foi dada à missão de sua constante destruição.
E assim, viveram os três por muito tempo, com a criação e a transformação do Cosmo se alternaram diante do vazio imutável.
Certa vez, o “mais velho dos” deuses, entediado com o nada e com os ciclos de tempo gerados pela luta eterna entre Vishnu e Shiva, criou um espelho para se admirar.
Surgiu então a deusa Maya.
Disse então Brahmam: “Maya, vamos brincar?”
Ao que Maya respondeu: “Só se você criar o mundo”.
E Brahmam criou: o céu, a terra, o mar, o sol, a lua, as estrelas, o homem e os outros animais.
“Do que vamos brincar agora?” – perguntou Brahmam.
“De esconde-esconde” – disse Maya e tomando Brahmam pelas mãos, rasgou-o em milhões de pedacinhos, colocando o deus criador em cada um de suas criaturas.
E desafiou: ”Quero ver agora você se achar, Brahmam!”

Há um Deus tentando se lembrar de si mesmo dentro de cada um de nós e só conseguiremos que ele se torne consciente em nós, se conseguirmos vê-lo também nós outros. “Pelo caminho que viemos, é por ele teremos que voltar”. Mas, a globalização não é, por si só, a re-unificação da consciência cósmica de Brahmam. Por isso, discute-se aqui também que diferentes fragmentos tradicionais – as técnicas do Reiki, do Feng Shui, do xamanismo tolteca, da meditação vipassana - são simplificados e distorcidos pelo consumismo da Nova Era. Há também as crenças transversais, inter-culturais, em que a universalidade encontra diferentes interpretações, como na questão da reencarnação. Interessa-nos, sobretudo, pensar sobre as possibilidades terapêuticas da Ayahuasca dentro do cenário da globalização e do choque de diferentes identidades culturais.

#1 Reiki e Feng Shui

Recentemente, fiz um curso sobre Reiki Tradicional (isto é, sobre como essa técnica é conhecida e utilizada lá no Japão) e descobri que tudo ou quase tudo que eu havia aprendido desta técnica não era verdadeiro, ou pelo menos, que havia sido reinventado pelo esoterismo ocidental. Os símbolos, que muitos acreditavam vir de Atlântida e Lemúria, não desempenham um papel importante na técnica, há um verdadeiro ritual (com cantos e meditação) antes da prática e há vários procedimentos (escaneamento, limpeza, utilização diferente das mãos: à esquerda, voltada para cima, capta energia; a direita aplica a energia captada no doente) que foram deixados de lado.

Quando me interessei por Reiki, me disseram que o Dr. Mikao Usui foi o principal elaborador da técnica, que transmitiu, por volta de 1930, a 16 professores, entre eles ao Doutor Chujiro Hayashi. Esse abriu um hospital em Tóquio e foi responsável pela cura de um câncer de uma havaiana, a senhorita Hawayo Takata, que trouxe o Reiki para o Ocidente. Hoje há pelo menos três grupos internacionais que disputam o legado do Dr. Hayashi e da Srt. Takata: a Aliança Reiki, a Associação Americana Internacional de Reiki (AIRA) e o Usui System. Osho também decidiu abrir sua própria linha de Reiki.

Um de seus discípulos, Frank Arjana Petter, para aprofundar seus estudos, decidiu ir ao Japão e empreender uma pesquisa sobre as origens da técnica. Foi então que se descobriu um Reiki bem diferente do que aquele que se conhecia. O mestre Usui, além de passar seus conhecimentos para o Dr. Hayashi, criou uma sociedade secreta, a Gakkai, que conta com milhares de participantes. Apesar da origem budista, o Reiki tradicional está inserido em um contexto Xintoísta (uma religião japonesa de culto aos antepassados de caráter extremamente nacionalista): antes das aplicações recitam-se os versos do imperador Hiroíto (aliado de Hitler e Mussolini na 2a Grande Guerra), pratica-se a meditação Gassho (de mãos unidas) e a respiração abdominal desempenha um papel muito mais importante que a visualização dos símbolos.

O mais interessante desta descoberta, no entanto, é perceber o que fizemos de uma prática espiritual retirando-a de seu contexto cultural. Transposto para ocidental como uma mercadoria, o Reiki passou a ser uma ‘franquia’ de trabalho espiritual, onde as iniciações (na verdade, venda de símbolos) substituíram procedimentos rigorosos de desenvolvimento moral e energético. E mais: é curioso como erigimos sistemas de crenças próprias sobre um fragmento cultural descontextualizado. Mas, como dizia meu finado pai: “no caminho da vida espiritual não existem enganadores, apenas os enganados”. Não foi ninguém que me enganou, fui eu que me enganei. Mais uma vez.

Porém, diante de mais esse engano, vejo três atitudes diferentes: os desenganados (que abandonaram o uso da técnica), os que aderiram ao Reiki tradicional (mas, não ao xintoísmo, espero) e os que ignoram solenemente a descoberta de Petter, uma vez que o importante é a prática de difusão da luz e não as teorias que a sustentam. De certa forma, me incluo nesse último grupo. Embora, prefira sempre saber a verdade, acredito que Destino escreve certo por linhas tortas e que todos os enganos são necessários para nos tornarmos conscientes.

Mais um exemplo de engano transcultural: o Feng Shui, a arte chinesa de organização ambiental da energia, que estuda a relação do homem com seu ambiente, baseado na observação das estrelas, o relevo das montanhas, a forma dos rios, ruas e construção e a disposição dos móveis. Esse saber teve sua origem em antigos mestres taoístas que estudavam a natureza e compreenderam como a energia em volta deles se comportava, e como poderia afetar uma residência. Constataram que o ambiente era influenciado por duas forças fundamentais: vento e água. Em um segundo momento, também se considerava as estrelas da data de fundação do imóvel e do nascimento de seus habitantes (em geral, pelo método dos quatro pilares: hora, dia, mês e ano). Além do estudo das forças fundamentais do ambiente e das diversas técnicas astrológicas, o Feng Shui orienta a escolha do local em que a edificação deve ser construída; determina o pólo norte através de uma bússola astrológica, Lu Pan, associando-o sempre a entrada da casa; e, finalmente, analisa e propõe mudanças na organização interna do ambiente de acordo com harmonia entre os cinco elementos chineses: a madeira, o fogo, a terra, o metal e a água.

Porém, boa parte do Feng Shui ‘de Nova Era’ que é divulgado na mídia deriva do sistema da Escola Americana, que não é propriamente de origem taoísta, mas sim partidária do budismo tântrico, da ‘Seita do chapéu preto’, Escola que simplifica consideravelmente o sistema tradicional do Feng Shui, eliminando sua referência macro-cósmica e dando mais ênfase a decoração de ambientes do que a construção de casas. Assim, não há influências astrológicas e um espelho (representando o elemento água) fica sempre na entrada, independentemente de sua posição em relação aos pontos cardeais. Assim, o Feng Shui ficou reduzido à harmonização do ambiente interior através da teoria dos cinco elementos e de seus dois ciclos: o ciclo da criação (de acordo com a rotação no sentido horário na mandala) e o ciclo do controle (formado pelas setas interiores). No ciclo da criação a madeira é combustível do fogo, cujas cinzas vitalizam a terra, que cria o metal, que mineraliza a água; no ciclo do controle: a madeira se nutre da terra, que represa e absorve a água, que apaga o fogo, que por sua vez derrete o metal, que corta a madeira. Os consultores de Feng Shui, de acordo com isso, analisam qual o elemento dominante ou em desequilíbrio, e, conforme os dois ciclos, adicionam ou retiram outros elementos harmonizando assim o ambiente.

Porém, esta análise e mudança dos ambientes internos através dos cinco elementos descontextualizada das técnicas astrológicas é uma simplificação. Nela, há uma ênfase na relação simbólica entre o corpo do morador e sua residência; enquanto, nos sistemas chineses tradicionais, a relação era o ambiente micro e o universo macro. Na verdade, há várias escolas do Feng Shui e diferentes métodos e ênfases. A Sociedade Taoísta do Brasil ensina de forma tradicional todo o conhecimento de duas importantes escolas: Escola das Oito Casas (Ba Zhai) e a Escola das Estrelas Voadoras (Fei Xin). Outro ponto polêmico em relação a este aspecto macro-cósmico do Feng Shui tradicional é a questão de sua aplicabilidade no hemisfério Sul, uma vez que há vários fatores simétricos e invertidos em relação à estrutura simbólica chinesa. Por exemplo, há uma analogia entre as estações do ano e a mandala do Pa Kua, que orienta a construção do imóvel. Abaixo do equador, no entanto, as estações são simétricas às do hemisfério norte, invertendo toda simbologia do sistema. Além disso, a própria gravidade tem sua rotação no sentido contrário, determinando que os movimentos dos ventos e das correntes marítimas se desenvolvam inversamente. Levando em conta essas inversões, vários autores apresentam uma adaptação do Feng Shui para o hemisfério sul; substituindo as plêiades da Ursa Maior (que representam o pólo norte estelar e o centro da astrologia chinesa) pela constelação do Cruzeiro do Sul (e pelo pólo sul estelar como centro do céu). Também é preciso dizer que o Feng Shui evoluiu em novas disciplinas: a Radestesia, a Biogeologia e a Permacultura.

Outro caso de auto-engano esotérico interessante, que comporta essas mesmas três atitudes – o desiludido, o que não aceita a verdade e aquele que convive parcialmente com decepção – é o dos seguidores das idéias de Carlos Castaneda, o grande adaptador e divulgador do xamanismo mexicano. O que queremos ressaltar é que, assim como o Reiki, o xamanismo tolteca foi reinventado formando um novo sistema de crenças, bem diferente daquele que pretendia originalmente seguir.

O importante para nós é ressaltar agora, com esses três exemplos de apropriação simplificante de fragmentos das culturas tradicionais pelo movimento new age (o Reiki tradicional tornado comercial, a ‘toltequidade’ transformada em Tensegridade e o Feng Shui reduzido à decoração de ambientes), é que a globalização nos deu uma vasta gama de técnicas e saberes específicos voltados para o autoconhecimento, mas que o desejo de se enganar continua sendo dominante e universal.

# 2 Meditação Vipassana

Mas, há também nesse cenário globalizado, ‘adaptações bem sucedidas’, fragmentos tradicionais que se revitalizaram com a globalização, interagindo com outras culturas sem perder sua força original, como é o caso da meditação Vipassana.

No dia 10 ao dia de janeiro de 2008 fiz meu primeiro retiro de dez dias de meditação Vipassana em Miguel Pereira, no Rio de Janeiro. Vipassanā (Pāli) ou vipaśyanā (sânscrito) significa “insight”, ver as coisas como elas realmente são. Foi elaborada por Sidarta Gautama, o 1º Buda, há 26 séculos. É a observação da experiência da percepção direta.

E o princípio subjacente é a investigação e entendimento dos fenômenos manifestados nos 5 agregados (skandhas), nomeados como apego à forma física (rūpa), às sensações ou sentimentos (vedanā), à percepção (saṃjñā, Pāli saññā), às formações mentais (saṃskāra, Pāli saṅkhāra) e à consciência (vijñāna, Pāli viññāṇa). Minha interpretação: nos tornarmos conscientes das sensações do corpo; dos afetos individuais; da sintaxe da percepção; dos padrões coletivos de cognição do pensamento; e, finalmente, conscientes de nossa própria consciência. No entanto, devido ao enquadramento social, a maioria se limita a observação do corpo-mente, e dificilmente chega-se à consciência do contexto de enunciação da própria consciência.

Eu já havia feito, em 1985, quatro dias de meditação vipassana no mosteiro budista em Santa Tereza, com Don, um ex-monge Theravada que havia sido discípulo direto do Krisnamurti. Nesta versão, a meditação Vipassana tinha uma parte andando e notas mentais para pontuar a observação. Além disso, ele supervisionava o processo interior de cada um bem de perto, diferente do método do Goenka que é para 100 pessoas de cada vez (no mínimo dez dias) e que as palestras pré-gravadas em CDs.

A técnica tradicional é dividida em duas etapas: Anapana, em que a pensa concentra atenção em um ponto específico do corpo (o mais comum é a entrada e a saída de ar das narinas), e Vipassana propriamente dita, que consiste em movimentar a atenção pelo corpo no sentido ascendendo e descendente, como um scaner - o que é bastante difícil e demorar alguns dias para conseguir. Não há mantras, visualizações ou respiração específica, mas sim a observação da respiração (esteja ela profunda ou rápida). A meditação Vipassana foca a interconexão entre mente e corpo, a qual pode ser experimentada diretamente por meio da atenção disciplinada às sensações físicas, que constituem a vida do corpo, e que continuamente se interconectam com a vida da mente e a condicionam. Essa técnica de meditação, utilizada por dez dias consecutivos dentro do nobre silêncio e de uma dieta vegetariana de baixa caloria, leva a observação da mente pela consciência como algo objetivo, externo à percepção. No nível de consciência normal, a consciência habita dentro da mente.

Em outras técnicas que pratiquei (tomando Daime ou como as meditações dançantes do Osho), houve uma expansão dessa consciência que extrapola os limites do ego, mas essa permaneceu dentro da mente. A consciência, em estado de percepção ampliada, acessou níveis profundos do inconsciente, mas permaneceu dentro dos limites da estrutura mental-emocional. O que acontece com a técnica Vipassana é diferente: através da focalização da atenção na respiração (fronteira sensorial entre o intencional e o involuntário), sem a utilização de quaisquer sons ou visualizações, acessam-se os padrões profundos do inconsciente, vistos pelo lado de fora. As sensações de dor e sofrimento emocional devido às restrições perceptivas do enorme esforço cognitivo voltado para atenção sobre o corpo e a respiração fazem emergir desejos de aversão e as sensações de bem estar corporal fazem emergir desejos de cobiça (não só sexuais, mas de repetição de situações prazerosas).

Normalmente, em outras técnicas ou terapias com foco sensorial, esses desejos são vistos como positivos, mas quando vistos objetivamente, como a consciência posta para o lado de fora da estrutura mental-emocional, mostram-se apenas uma camada mais profunda do inconsciente individual. E mais: é a fala que organiza a memória com sua narrativa. Com ‘o nobre silêncio’, há um aumento da memória e sua reorganização fora dos padrões discursivos. Não apenas lembramos de mais coisas, como também a forma como nos recordamos dos eventos não é tão ego-centrada. Com silêncio, a memória não funciona mais por lembranças, mas sim por recordações.

A experiência me rendeu também um paradoxo cognitivo produzido pela própria meditação. Os paradoxos são temas recorrentes, sem solução, que, contraditoriamente e ao mesmo tempo, são também uma forma de resistência e uma forma de aprofundamento da mente durante o processo de observação. Meu paradoxo se referia a uma desconfiança neokantiana de que meus esforços de concentrar minha atenção na respiração e nas sensações físicas eram, de fato, imaginários.

Eu estava realmente sentindo ou imaginava que estava sentindo? Há alguma diferença entre as duas percepções? Entre a observação e a imaginação? Será que a consciência pode observar a mente do lado de fora ou eu (ou a minha mente) havia criado um observador imaginário aparentemente exterior à mente?

Esse paradoxo do ser sujeito-objeto tem vários níveis e não tem solução. Por exemplo: a contradição entre aceitação e reação/ação consciente. A prática da meditação vipassana traz a hermenêutica budista embutida em si, seus conceitos e seus valores, sua estrutura metafísica. A idéia de não-reação perpassa toda doutrina budista. Para aprofundar a meditação não devemos reagir nem às dores e nem às outras manifestações cognitivas (sensações, sentimentos, percepções, etc) – apenas observar.

Mas, para mim, as éticas espirituais guerreiras (os samurais, os toltecas, os guaranis, entre tantos) estão bem além dos padrões do paradoxo budista de ‘reação-aceitação’. Ao invés de reagir ou não-reagir, é preciso espreitar; é preciso entender “o dar a outra face” como ação consciente criativa e não como aceitação da violência sofrida ou como uma reação. A meditação Vipassana consiste justamente em se domesticar para não reagir a nada. Então, surgiu dentro de mim uma luta interior entre aceitar o mundo como ele é e o inconformismo de não agir para transformá-lo. E uma reflexão sobre o contraste ente a moralidade budista e a ética guerreira.

Esses paradoxos entre observação/imaginação e aceitação/rejeição, vividos dentro do processo de meditação como resistências/aprofundamentos, funcionam como desafios de desenvolvimento, impedimentos que nos provocam a vencê-los.

# 3 O uso terapêutico da Ayahuasca

Gostaria agora de estabelecer alguns parâmetros para o uso terapêutico da ayahuasca como também procedimentos para dar contingência às emergências espirituais; e discutir os fatores que determinam a adaptação criativa e a descaracterização cultural de uma determinada tradição religiosa ou técnica espiritual do mundo globalizado, dando ênfase, evidentemente, ao processo de expansão internacional da Ayahuasca.

Uma primeira distinção necessária é sobre as noções de ‘uso religioso’ e de ‘uso terapêutico’ de substâncias químicas que promovem a expansão da consciência. Alguns pesquisadores argumentam que essa distinção não faz nenhum sentido e que o ‘uso’ indígena seria mais terapêutico que religioso. Em minha perspectiva, o uso religioso caracteriza-se principalmente por ser vertical, enfatizando a relação entre o Ego e o Eu Superior (ou a divindade); enquanto o uso terapêutico é horizontal, focado na relação entre o ‘Eu’ e o ‘Outro’. Embora essa seja uma distinção teórica, pois na prática os dois aspectos são indissociáveis, há intenções e ambientes (sets and settings) bem diferentes nas duas propostas. E essa diferença nos faz levantar várias questões.

Por exemplo: será que um dependente químico de drogas não tem maiores chances de recuperação em um paradigma (= ambiente + intenção) religioso, em que sua dependência transmuta-se em autonomia espiritual, do que em um paradigma psicológico onde ela pode ser transferida para o terapeuta ou para outros objetos horizontais? Ou ainda: será que Ayahuasca facilita ou amplifica a catarse emocional? Por que a exposição de sentimentos e emoções negativas (como a raiva e a tristeza) tão apropriadas no processo terapêutico pode gerar obsessões psíquicas e espirituais, quando realizada em estados de consciência alterada? O louvor ao sagrado cura devido sua gratuidade, já dar suporte ao desenvolvimento de resiliências (trabalho terapêutico) é uma atividade profissional remunerada – como conciliar essas questões?

O uso religioso tem por objetivo o desenvolvimento ético e moral dos participantes do culto em geral, enquanto o uso terapêutico pressupõe um problema específico a ser resolvido por alguém em particular. Mas , é preciso definir melhor como se pode (e como não se deve) usar a DMT e suas bebidas enteógenas para tratar de uma resistência específica ao desenvolvimento individual. E não estabelecer um ‘novo uso’ para a bebida.

A tradição daimista prescreve rigorosamente a não-intervenção, seja a forma de toque corporal, massagem corporal ou tentativa verbal de comunicação, quando um participante do culto faz uma ‘passagem’, isto é, encontra com alguma resistência em seu processo de desenvolvimento e sofre algum tipo de mal-estar.

Nesta perspectiva, é aconselhável que ‘a bebida e a pessoa se entendam’ ou que o processo psíquico desencadeado seja resolvido através de uma auto-adaptação da pessoa à situação emergente sem interferências. Tal prescrição é extremamente válida, principalmente no âmbito das igrejas e templos religiosos em que pessoas sem preparação (sem formação profissional específica) podem querer ajudar outras em um momento crítico circunstancial, através de um toque corporal.

Por outro lado, o uso consorciado da ayahuasca com algumas experiências com mudanças dos padrões corporais se mostrou bastantes produtivas, devido ao relaxamento muscular propiciado pela ingestão da bebida, como as aplicações sucessivas de massagem da técnica desenvolvida por Ida Roofing. O processo de alinhamento postural pode ser potencializado através de alongamentos e de exercícios regulares diários (de Pilates, RPG ou de Iso-stretching), sem ingestão de nenhum aditivo químico. Os exercícios preparariam para um realinhamento postural e comportamental profundo e permanente, feito em estado de consciência alterado.

Nesse caso, a ayahuasca é utilizada dentro de um processo de longo prazo, com objetivos e outras práticas terapêuticas. Não são as práticas terapêuticas que são inseridas no ritual e sim o ritual que é inserido em um processo terapêutico.

Já o uso da Ayahuasca consorciado diretamente às práticas catárticas da bioenergia e das meditações dançantes do Osho não apresentaram para mim nenhum benefício visível e certamente podem reforçar, ao invés de dissolver, as resistências psicológicas, sejam elas ‘couraças energéticas’ ou complexos comportamentais. Ou seja: a tradição espiritual desaconselha a prática da intervenção terapêutica no paradigma religioso, mas a experiência psicológica incentiva o uso de enteógenos como uma forma de intervenção espiritual no paradigma terapêutico.

Portanto, não se trata de utilizar técnicas e práticas de outras paragens para ‘completar’ ou ‘aperfeiçoar’ os rituais associados à Ayahuasca e às plantas de poder brasileiras, mas sim de aprender a utilizar estes rituais e estas plantas em processos terapêuticos. E, dentro de processos terapêuticos, dentro das experiências que organizei e presenciei, a Ayahuasca tem se mostrado muito mais adequado às técnicas de regressão biográfica através de sugestão hipnótica do que, diretamente, aos movimentos corporais e as massagens voltados para catarse.

Há também outras possibilidades de integração, como as técnicas de roda, os exercícios de respiração (1) e as metodologias de re-organização da memória e da vida presente (2).

As técnicas de roda, ou a ciranda de vozes e de dança, é um suporte de transmissão de memória e conhecimento anterior ao advento da escrita, quando os contextos de recepção e de transmissão de informação eram comuns. A roda centralizava o acesso ao conhecimento e instituía um tempo circular, simultâneo, sem continuidade. Com a escrita (e a memória social), surgiu a história (e o tempo linear baseado na acumulação de informação), os contextos de recepção passaram a ser múltiplos e distintos do contexto da fala.

Percebe-se que os cantos e a dança em roda fazem parte da Ayahuasca. A química prescinde de práticas rituais para se realizar com sentido para seus usuários. Ao anular os rituais e práticas associadas ao culto da bebida, também se perde o que há de espiritual no efeito da substância psicoativa. A DMT descontextualizada é apenas uma droga psicodélica, que provoca acessos visuais.

Hoje (graças à Internet) retornamos parcialmente ao tempo simultâneo e a esse suporte arcaico da cultural oral. O próprio ritual do Daime, o hinário bailado e cantado, é um excelente exemplo de uso da roda de vozes e danças como estrutura trifásica (de movimento, canto e pensamento), como forma de propiciar um aprendizado existencial significativo e de transmitir conteúdos simbólicos, integrado ao paradigma histórico da escrita e do pensamento objetivo. O bailado também tem suas limitações criativas em relação a outras formas de roda de dança e canto.

As técnicas aqui descritas não têm por objetivo aperfeiçoar o modelo do bailado (acrescentando novas possibilidades terapêuticas ao ritual religioso), mas sim, de integrar esse modelo a outras técnicas de roda dentro de um contexto terapêutico atual, múltiplo e aberto. Nesse sentido, em relação às técnicas de roda, destaco dois trabalhos: o círculo de repetição (3), danças sagradas circulares e da paz universal.

4# tratamento de dependência química

Além dessas discussões sobre as técnicas adequadas, a questão do uso terapêutico da Ayahuasca levanta ainda várias questões paralelas, como a da emergência de surtos psicóticos e a da possibilidade de recuperação de dependentes químicos.

A ayahuasca tem o efeito de agravamento dos sintomas, ele promove e desenvolve mudanças existenciais, levando as situações contraditórias a níveis críticos. Assim, outro tema correlato ao uso terapêutico da ayahuasca, é que ele desencadeia crises psíquicas e emergências espirituais. A experiência atesta que tais casos tanto podem ser vistos como uma superação de tendências psicóticas como podem causar danos irreversíveis, caso o sujeito das crises não encontre o apoio e a compreensão necessários para entender a situação em que se encontra. O papel da família, da comunidade religiosa e do ambiente profissional parece ser preponderante para a recuperação e a superação das crises.

Daí a necessidade de se estabelecer critérios e parâmetros para propiciar a emergência espiritual de conteúdos psíquicos não se torne uma psicose ou uma esquizofrenia irreversível.

Muitas instituições religiosas acreditam se defender dessas situações através de uma rigorosa entrevista (chamada incorretamente de anámnese), que realizada de forma burocrática por pessoas despreparadas faz uma triagem preconceituosa e de baixa qualidade. Uma entrevista preliminar com as pessoas que vão tomar ayahuasca pela primeira vez é fundamental para o aproveitamento adequado da experiência, mas não deve tentar enquadrar os entrevistados em categorias de risco, pois essa prática além de moralista e politicamente incorreta é ineficaz no sentido de identificar comportamentos problemáticos ou possíveis emergências espirituais.

A verdade é que nada substitui uma conversa franca e compreensiva. Mais do que perguntar, o entrevistador deve responder as dúvidas e questões postas pelo entrevistado. E mesmo que identificados fatores de risco nos entrevistados, isto não deve ser motivo para exclusão ou para constrangimento, mas sim como uma informação relevante para compreensão do processo de transformação que se iniciará.

Não basta informar os possíveis prejuízos da utilização de outras substâncias (como o álcool e a cafeína) e de excessos sexuais em conjunto com a ayahuasca, é preciso explicar, sem fanatismo ou superstições, quais sãos esses danos e quais são as conseqüências do uso indisciplinado da ayahuasca.

Porém, se os próprios adeptos dos cultos não obedecerem às prescrições que professam aos neófitos, as restrições necessárias à experiência soarão como hipocrisia e farisaísmo. E se é incorreto tentar escapar às crises antecipadamente pela triagem e exclusão, também é errado tentar encobri-las depois que emergem.

Nesses casos, além de um atendimento terapêutico individualizado, deve-se manter a participação do sujeito em crise nos rituais religiosos ou nas práticas terapêuticas de grupo (caso isto seja possível) sem o consumo da ayahuasca ou com doses simbólicas. A exclusão do sujeito em crise do contexto da emergência espiritual (e seu deslocamento para outros cenários) é prejudicial à conclusão satisfatória do processo.

Em relação à recuperação de dependentes químicos através de processos terapêuticos utilizando a Ayahuasca, há várias iniciativas bem sucedidas em curso, mas também vários equívocos. Não podemos tratar desse assunto aqui me profundidade, mas gostaria de apontar dois enganos bastante freqüentes que tenho observado: a) a substituição do consumo de drogas pelo consumo da Ayahuasca; e b) a substituição da medicação apropriada pela Ayahuasca.

Essas duas ‘substituições’ são interpretações equivocadas. A Ayahuasca pode ajudar na recuperação de dependentes químicos caso seja compreendida como ‘sacramento’ e não como uma droga ou um remédio. E, é claro, de nada adianta o uso sacramental da ayahuasca sem um processo terapêutico que inclua o confinamento em ambiente adequado, a mudança de hábitos alimentares e, essencialmente, da motivação emocional do recuperando através de diferentes tipos de práticas. Prescreve-se, pois, tais fatores em conjunto ao uso sacramental, e não a dupla substituição.

Boa parte da literatura acadêmica mais recente sobre Ayahuasca trata de seu uso terapêutico, principalmente da possibilidade de sua utilização em tratamentos de dependência química, uma vez que já existe um alto de número de ex-usuários recuperados entre os adeptos das religiões ayahuasqueiras.

O texto coletivo Considerações sobre o tratamento da dependência por meio da ayahuasca (LABATE, SANTOS, ANDERSON, MERCANTE, BARBOSA, 2009) faz uma revisão bibliográfica específica desta literatura e sistematiza as principais reflexões sobre o potencial terapêutico do uso ritual da ayahuasca no tratamento ao abuso de substâncias psicoativas.

O texto analisa a experiência de dois centros terapêuticos que combinam elementos da medicina e da psicologia ao uso da ayahuasca: o Instituto de Etnopsicologia Amazônica Aplicada (IDEAA), próximo à comunidade do Santo Daime Céu do Mapiá, no município de Pauini (AM), no Brasil e o Takiwasi, em Tarapoto, no Peru. São ainda discutidas perspectivas para uma futura agenda de pesquisas científicas interdisciplinares sobre este tema, refletindo sobre as possibilidades de diálogo entre biomedicina, antropologia e psicologia, além dos dilemas éticos e metodológicos envolvidos neste tipo de investigação.

A aparente melhora de muitos casos de abuso e dependência de substâncias psicoativas, segundo o relato de vários grupos terapêuticos e religiosos voltados para o uso ritual da ayahuasca, bem como de antropólogos, psicólogos e psiquiatras que estudam o tema, representa um fenômeno de saúde promissor. Esse pode ser melhor compreendido a partir de estudos interdisciplinares sistemáticos que combinem a abordagem quantitativa com uma sutileza qualitativa e etnográfica. Tal esforço interdisciplinar deve ser acompanhado também de uma tentativa de diálogo com os saberes nativos, colaborando para que o conhecimento adquirido durante décadas pelos diferentes grupos que utilizam a ayahuasca no tratamento da dependência auxilie futuros estudos clínicos de terapias psicodélicas voltadas para abordar o problema.

#5 Pesquisa Acadêmica

Uma boa introdução à pesquisa do Ayahuasca é o livro Religiões ayahuasqueiras: um balanço bibliográfico (2008), de Beatriz Caiuby Labate, Isabel Santana de Rose e Rafael Guimarães dos Santos. O balanço das pesquisas realizadas sobre Santo Daime, Barquinha e UDV, contabilizou 52 livros (13 em inglês), 35 dissertações de mestrado, sete teses de doutorado, nove pesquisas em andamento e um número incalculável de monografias e artigos - em 11 áreas distintas de conhecimento.

Os primeiros artigos são dos anos 50. O marco fundador do campo na academia é a tese O Palácio de Juramidam (1983), de Clodomir Monteiro. Em 1984, Alex Polari, Cefluris, lança seu 1º livro. Em 1986 saiu o primeiro artigo acadêmico sobre a UDV, do Anthony Henman, em uma revista mexicana chamada América Indígena. Em 1993 foi realizado o Hoasca Project. A Barquinha tem seu primeiro livro em 1999. A década de 90 é marcada pela expansão do campo de estudos no Brasil e, a partir do ano 2000, começam a ser produzidos trabalhos no exterior. Outro marco importante é a pesquisa, realizada em 2003, sobre adolescentes da UDV. Os estudos sobre Ayahuasca hoje se multiplicam em progressão geométrica, levando os autores a declarar de que a “lista já nasce desatualizada, porque enquanto estamos falando tem alguém publicando alguma coisa”. E, de fato, de lá para cá várias teses, dissertações e monografias foram defendidas, e diversos artigos científicos e ensaios foram escritos em nome da Pesquisa da Ayahuasca.

Gostaria de destacar o trabalho de José Eliézer Mikosz, A arte visionária e a Ayahuasca: Representações Visuais de Espirais e Vórtices Inspiradas nos Estados Não Ordinários de Consciência (2009). Mikosz estuda várias formas visuais (espirais, mandalas, labirintos, universos em camadas) e suas possíveis significações. Apesar de usar como referência os Estados Não Ordinários de Consciência (ENOC), em vários momentos aproxima-se bastante da idéia de sonhos lúcidos, de Stephen LaBerge (4).

A ayahuasca talvez permita entrar no rio mercurial (streaming of consciousness) que corre entre a vigília e o sono, a interseção entre a realidade cotidiana e seu fluido reflexo nos infinitos mundos da imaginação. A ayahuasca, como outras plantas e substâncias psicointegradoras, possui a potencialidade de aproximar o ser humano do lugar, por assim dizer, de onde os mitos procedem. Essa suspeita surgiu pela semelhança da experiência vivida com a ayahuasca e os estados hipnagógicos e mesmo dos sonhos. De onde vêm os pensamentos, são deliberados por volição, são sempre escolhas do “pensador” ou surgem como acontecimentos independentes, interagindo então com o indivíduo? Os devaneios, o estado hipnagógico, este muitas vezes similar às mirações, parecerem se desenvolver em uma corrente de consciência que passa como pano de fundo, independentemente da direção consciente do indivíduo. Essa corrente pode ser comparada a um filme contendo uma mistura de conteúdos pessoais e impressões e experiências vindas do meio ambiente. É possível interagir com esse conteúdo à medida que o estado de vigília vai relaxando seu controle, seja no início do sono, seja pela ação de psicoativos como a ayahuasca. Estudos mais profundos sobre essa característica da consciência certamente trarão conhecimentos maiores sobre os esforços cognitivos da mente. (MIKOSZ, 2009,249 )

Em relação à cognição visual (a miração) resultante dos efeitos da Ayahuasca, o trabalho de Mikosz baseia-se em boa parte nas pesquisas de Rick Strassman sobre a substância psicoativa do Ayahuasca, a DMT (a dimetiltriptamina), e não sobre a bebida propriamente dita ou no sistema de crenças que configura seu uso.

Strassman (2001) diz o corpo produz naturalmente DMT na hora da morte para favorecer a lembrança dos momentos marcantes da vida. O xamanismo tolteca chama isto de 'recapitulação' e corresponde a limpeza dos vínculos cármicos adquiridos durante a vida. A DMT permite a utilização consciente da memória visual através do lado direito do cérebro, em oposição à nossa memória discursiva ordinária organizada através da fala. É a fala que transforma a memória em narrativa, se simplesmente contarmos nossa estória, oscilaremos entre os papéis de vítima e de herói. É o hemisfério esquerdo do cérebro que acessa a memória e quer comunicar a lembrança resgatada a alguém.

Com a DMT, ao contrário, feita em estado de silêncio interior, sem interlocutor ou escuta analítica externa, as lembranças emergem objetivas, permitindo a reintegração emocional dos momentos vividos com distanciamento, vistos de fora, como em um filme narrado por outra pessoa.

E essa pode ser a principal aplicação terapêutica da DMT em um futuro breve: fechar (reviver e superar) as feridas emocionais que jorram do inconsciente individual.

O acesso consciente à memória visual também pode ser colocada sob a forma de ‘sonhos lúcidos’, isto é, a ocorrência de estado de funcionamento cerebral de alto desempenho - o sono REM (rapid eye moviment) – que normalmente acontece enquanto o sujeito está dormindo, durante o estado de vigília (5).

Vários místicos tradicionais opõem sonho e consciência. A consciência está sempre presente no aqui e agora. O sonho é memória passada e previsão do futuro. O sonho lúcido (ou o Estado de Consciência Alterada através da DMT) é visto por eles como uma alucinação a ser vencida pela consciência, como uma passagem por reinos intermediários ou como realidades subjetivas que aprisionam a alma. O xamanismo em suas diferentes versões, no entanto, acredita no desenvolvimento através dos sonhos.

Para Strassman, há quatro estágios progressivos do efeito do DMT: o estado eufórico, o ‘caleidoscópio colorido’, o estado de diálogo com as entidades e a transcendência do ego. Para isso, ele teria que trabalhar suas dosagens cada vez maiores de DMT (e não de IMAO). A experiência, no entanto, comprova que o mero aumento de dosagem química não basta para se alcançar estados de percepção mais profundos e intensos, é preciso também ter a ligação espiritual - que só vem através de treinamento em alguma técnica ou ritual. Aliás, quando maior a capacidade mental de alteração o estado de percepção, menor a dosagem necessária – como pode ser visto na maioria dos adeptos mais antigos dos cultos.

“Eu só miro as situações em que estou envolvido” – confessou-me certa vez um experiente ayahuasqueiro. E, certamente, as imagens psíquicas, sejam elas arquétipos universais ou lixo subconsciente, em nada ajudam ou enriquecem a experiência espiritual da DMT. O importante é compreender o quadro de relações (sociais, cósmicas, afetivas, políticas, etc) em que se está inserido. E mais: “Mirar com firmeza resolve os problemas” – me ensinou o caboclo. A ‘firmeza no mirar’ é permanecer em estado de consciência alterada intenso, profundo e por longos períodos de tempo (e baixas dosagens de DMT) e conseguir reverter as relações de conflito, submissão ou enaltecimento que se apresentem.

A idéia de ‘miração’ ou ‘sonho lúcido’ (e de diferentes estágios progressivos do transe quimicamente induzido) não pode ser desvinculada do sistema de crenças do sonhador. Eu, por exemplo, reconheço quatro paradigmas diferentes sobrepostos e simultâneos no trabalho espiritual com DMT: o paradigma da luta do bem contra o mal; o paradigma de ajuda aos espíritos sofredores vivos e mortos; o paradigma de diálogo/conflito do Eu com o Outro; e, finalmente, o paradigma da Consciência da Divindade (ou da recapitulação da biografia pela consciência/identificação com narrativas míticas e simbólicas).

O modelo de estágios progressivos de estados de consciência de Strassman tem seu valor, mas é preciso perceber que ele também se baseia em um sistema de crenças, mesmo que sejam crenças científicas céticas.

Outra grande contribuição ao estudo do Ayahuasca é o trabalho de Benny Shanon (2003), que faz um levantamento estatísticos das imagens psíquicas geradas a partir da experiência do Ayahuasca. Shanon tornou-se muito conhecido devido sua hipótese de Moises teria acidentalmente consumido DMT (uma vez que a Arca da Aliança seria feita de Acácia - um tipo de jurema) e entrado em transe no monte Sinai.

Shanon destaca ainda quatro aspectos relevantes em relação ao efeito do Ayahuasca: a percepção do pensamento como uma cognição coletiva, a indistinção entre o interior e o exterior, as experiências desindentificação pessoal e a percepção de tempo não-linear. Sob o efeito da DMT os pensamentos não são individuais, mas sim ‘recebidos em rede’ (a mente como um rádio); que não existe a distinção entre o sensorial e o sensível; podem se transformar em animais (jaguares e águias são freqüentes) ou em outras pessoas; e finalmente percebem o transcorrer do tempo de forma desigual, em que alguns segundos demoram séculos e horas se sucedem rapidamente e em que alguns momentos se experimentam a simultaneidade (ou a sensação de eternidade) temporal.

Desses quatro aspectos relevantes o mais interessante é o que trata de nossa percepção do tempo. Quando baixamos arquivos no computador percebe-se que alguns segundos demoram mais que outros, em função do peso do arquivo e da aceleração da conexão da internet (6). O que Shanon suspeita é que o mesmo acontece com a memória humana, mas só é perceptível sob o efeito da DMT. É a pesquisa da mente através do ayahuasca (e não mais do efeito do ayahuasca na mente).

Tanto Shanon como Strassman enfatizam a idéia de tempo descontínuo. A DMT nos recoloca novamente dentro da simultaneidade. Com base nessas pesquisas e em minha vivência pessoal pode-se dizer que a experiência de ‘mirar’ ou ter ‘sonhos lúcidos’ se aproxima muito mais de uma supercognição (envolvendo os dois hemisférios cerebrais simultaneamente) do que de uma alucinação ou de apenas ilusões visuais. Supercognição que permite à consciência enraizada no presente ativar as memórias do passado com objetividade visual e prever (ou até mesmo influenciar) acontecimentos futuros.

Segundo o professor Oscar Calávia Saez (2008), quando os Yaminawa tentam explicar o que o ayahuasca é para eles, usam comparações como o ‘cinema do índio’, a ‘televisão’ do índio e até ‘o avião do índio’. O ayahuasca é o que permite uma visão ao longe e media o modo de ver o universo em seu conjunto. Todavia, além de ser uma tecnologia de transcendência do tempo/espaço, o Ayahuasca tem outro função menos evidente: criar uma linguagem xamânica comum entre grupos étnicos diferentes.

O que eram praticas xamânicas muito diferenciadas tem se transformado, talvez nos últimos 100 anos, numa espécie de ecumene indígena organizada em volta do uso da ayahuasca e dos cantos que acompanham esse uso. O xamanismo dos Shipibo-Conibo, dos Kokama, dos Kaxinawa, dos Yaminawa, dos Kampa, não são mais o que poderíamos chamar de xamanismos locais, étnicos, pertencentes a um pequeno grupo etnolingüístico. Há muito tempo que esse xamanismo se transformou numa linguagem comum, num mundo extremamente comunicado onde as canções da ayahuasca se transmitem de um grupo a outro. Enfim, a ayahuasca tem contribuído de modo muito importante para dar forma a um xamanismo que, apesar pensarmos que é extremamente antigo, provavelmente adquiriu a sua forma atual com a expansão, através da comunicação, da tradução facilitada pelo uso desse veículo, da ayahuasca.

Hoje, vendo os hinos do Daime cantados em vários idiomas, não se pode deixar de pensar que se trata do mesmo fenômeno. Mais não é só isso! Segundo Saez, os Yaminawa quando bebem Ayahuasca, além das canções em línguas exóticas, entoam as canções em sua própria língua de um modo diferente. “É um modo de tratar a língua de uma qualidade poética minimalista realmente surpreendente e lembra aqueles poemas curtos japoneses, os Hai-kai’s; evocando detalhes quase infinitesimais que existem nas folhas, na pele dos animais.” Experiência estética semelhante a dos hinos do Daime cantados em português mundo a fora. As pessoas cantam e compreendem telepaticamente o conteúdo, mas não sabem o que exatamente significam. “Aprender a tomar ayahuasca significa aprender a entender esse modo de poesia”.

O debate envolvendo a globalização cultural das técnicas religiosas tradicionais e o uso terapêutico da Ayahuasca está apenas começando. Porém, o aspecto fundamental neste turbilhão de acontecimentos é o fato da sociedade atual – ou a cultura pós-moderna ainda em construção – criar as condições sociais necessárias a um novo uso da ayahuasca, que nos permite (ou nos permitirá em uma escala de massas) experimentar a morte e a transformação existencial de uma forma mais acentuada.

# 6 Viva a Morte!

Negação, raiva, negociação, depressão e aceitação. Observando os doentes terminais, os médicos chegaram a constatação de cinco reações emocionais em relação à morte. No estágio de negação e Isolamento, não acreditamos: “Isso não pode estar acontecendo comigo”. No estágio de Cólera (Raiva), reclamamos: “Por que eu? Não é justo.” Depois negociamos: “Me deixe viver apenas até meus filhos crescerem.” Em seguida vem a depressão: “Estou tão triste. Por que se preocupar com qualquer coisa?” E, finalmente, compreendemos a situação e a aceitamos: “Vai tudo acabar bem.”

Originalmente aplicaram-se estes estágios para qualquer forma de perda pessoal catastrófica, desde a morte de um ente querido e até o divórcio ou separações entre amigos antigos e familiares. Com o tempo, no entanto, se percebeu que qualquer mudança pessoal significativa pode levar a estes estágios. Por exemplo, advogados criminalistas de defesa experientes estão cientes de que réus que estão enfrentando a possibilidade de punições severas com pouca possibilidade de evitá-las freqüentemente experimentam estes estágios, sendo desejável que atinjam o estágio de aceitação antes de se declararem culpados.

Também se observou que estes estágios nem sempre ocorrem nesta ordem, nem são todos experimentados por todos os pacientes, mas afirmou que uma pessoa sempre apresentará pelo menos dois. Há pessoas que vencem suas doenças mortais pela negação obstinada. Outras são derrotadas pela aceitação precoce, outras ainda vitimadas pela própria piedade durante o estágio de tristeza ou sucumbem afogados na própria raiva. Os estágios são progressivos, mas não são hierárquicos. Um não é melhor que outro.

A raiva e a tristeza são, na verdade, em minha opinião de ser vivente diante da morte, intervalos entre estágios mentais mais organizados, são descargas emocionais, mais que estágios em si: a raiva transforma a negação em negociação, a tristeza faz com que a negociação se torne aceitação. Osho diz que são humores polares e aconselha que sejam utilizados um contra o outro, para neutralizá-los mutuamente: quando estiver com raiva, tente se entristecer com o que lhe enraivece; em contrapartida, quando estiver triste procure se indignar com os motivos que te deprimem.

Isto é particularmente válido se pensarmos que há pessoas com uma maior propensão a tristeza (que geralmente têm dificuldades em lutar por seus objetivos) e também pessoas com um caráter predominantemente colérico, pouco sensíveis a reconhecer as próprias falhas como resultantes de suas ações. Raiva e tristeza são reações emocionais contrárias, que todos temos em maior ou menor proporção, diante de nossas perdas irreversíveis e da eterna impermanência do tempo de vida. Aliás, o ciclo maniáco-depressivo, descoberto por Willis e Freud e reinventado como transtorno bipolar atualmente, é uma prova de que esses estágios devem ser vistos como momentos opostos de re-equilíbrio emocional do corpo e não como reações específicas diante da morte e da perda.

Portanto, excluídos a raiva e a tristeza de nosso modelo dos estágios de luto, restam três momentos genuínos de reação à morte: a negação, a negociação e a aceitação. Talvez se trate apenas de uma questão de correlação de forças: quando temos muita energia, negamos a morte; quando não temos, a aceitamos; na dúvida, negociamos. Estágios universais, é verdade, mas com variações infinitas refletindo uma grande diversidade de pessoas e reações. Em uma tipologia ternária geral, como a tipologia do Eneagrama de Naranjo, por exemplo, pode-se dizer que as pessoas mais mentais são mais propensas ao medo, que as pessoas do tipo sentimental são mais ansiosas e que as pessoas com ênfase na motricidade é que têm, principalmente, essa oscilação polar dos temperamentos agressivos e deprimidos. Aliás, pode-se inclusive reconhecer uma tipologia ternária com base nos diferentes tipos de reação precoce à própria morte: os negadores neuróticos (ou os contestadores), os negociadores compulsivos (ou os dominadores) e os aceitadores profissionais (ou os submissos) (7).

Acontece que o momento de enfrentamento da morte é um momento de superação das neuroses e das recorrências psicológicas. E muitos comportamentos padrões automatizados são reconhecidos, aceitos e dissolvidos. Todos os caminhos levam à aceitação (até mesmo a aceitação neurótica, que acredita poder perdoar antes de sofrer, leva, após outros estágios dramáticos, à aceitação verdadeira). As pessoas e as formas de reação ao catastrófico são muitas, mas a morte e sua aceitação nivelam tudo a dois pontos comuns: o fim do tempo e a necessidade de mudança.

Nesse contexto, a consciência ocupa um lugar central. Antigamente, evitava-se contar aos doentes terminais sua situação porque se acreditava que isso aceleraria seu processo. Depois, em uma onda humanista, investiu-se na atitude contrária, dizendo aos doentes suas chances reais (ou não) de recuperação e quando tempo de vida lhes restava. Hoje, os dois procedimentos são utilizados dependendo da maturidade das pessoas, dos princípios éticos do médico e, principalmente, do interesse particular das famílias envolvidas (o que, muitas vezes, é ‘particularmente’ cruel).

Consciência tanto no sentido de ter acesso à informação (consciouness) como no sentido da percepção direta (conscience), afetiva e efetiva, de seu estado terminal. Uma coisa é a informação (“fumar faz mal a saúde” - por exemplo), outra é a percepção. Aliás, a própria definição do ‘momento da morte’ é uma questão complexa (8). Geralmente, percebemos inconscientemente que estamos morrendo, ou que (uma vez que todos estão morrendo desde que nascem) estamos próximos de partir do mundo material. Trata-se de assumir mentalmente o que já percebemos involuntariamente através do corpo.

Os grandes mamíferos (elefantes, baleias), não apenas sabem o momento de sua morte mas também aceitam seu destino com uma sabedoria que nós, seres humanos, dificilmente alcançamos. Isto porque são (foram e serão) raros os homens que conhecem o dia da própria da morte e várias são as tradições consideram o ‘conhecimento e a aceitação do dia determinado’ como uma prova de espiritualização humana incontestável. Há, inclusive, várias narrativas lendárias e literárias sobre o tema de conhecer e aceitar o próprio destino.

Eis aqui o primeiro ponto que gostaria de firmar: a flor já existe na semente, a morte é imanente à vida, e não sua transcendência para outro plano. E, nesse sentido imanente, ela não apenas é um mecanismo de aperfeiçoamento genético da evolução biológica, mas, sobretudo, um mecanismo de aperfeiçoamento ético e evolução espiritual da consciência. Ou seja: a morte não se refere só à vida mas também à consciência.

Assim, a verdadeira questão não é se existe vida após a morte, mas sim se há consciência após a morte. E essa é a segunda questão que eu gostaria de abordar. O conceito de Experiência de Quase-Morte (EQM) (9), que refere-se a um conjunto de sensações associadas a situações de morte iminente, associadas a hipóxia cerebral, como o efeito ‘túnel de luz’ e a ‘experiência fora-do-corpo’ (autoscopia). O termo foi cunhado pelo Dr. Raymond Moody em seu livro escrito em 1975, “Vida Depois da Vida”.

Para nós, o importante é que, após a EQM os pacientes parecem alterar o próprio ponto de vista em relação ao mundo e as outras pessoas. As mudanças comportamentais são significativamente positivas. O principal fator para a mudança é a perda do medo da morte; passam a valorizar mais as suas vidas e a dos outros; reavaliam os seus valores, ética e prioridades habituais; tornam-se mais serenos, confiantes e … conscientes.

Em outros tempos, essas EQMs eram rituais de iniciação. O confronto com a própria morte era um mecanismo social para qualificação da consciência e fazia parte das ‘tradições cívicas da tribo’. Na verdade, nossa sociedade não aboliu completamente esse mecanismo, ela pulverizou esse rito de passagem em diversas micro-mortes, em diversas perdas e frustrações pelos quais nos lembramos da vida e afiamos nossa consciência. ‘Quase-morremos’ várias vezes em uma única vida.

E isto nos leva a um terceiro ponto: a vida pós-moderna e a morte da morte. Edgar Morin, na esteira da morte de Deus (postulada por Nietzsche) e a morte do Homem (sustentada por Foucault) tentou assassinar a própria morte, com a noção de ‘amortalidade científica’ (em oposição à ‘imortalidade’ tradicional). A medicina e a ciências atuais querem estender o tempo de vida ao máximo, querem vencer a morte. Tanto a Tradição como a Ciência querem vencer a morte, mas enquanto a primeira, romântica, aspira a imortalidade dos deuses na eternidade, a última, mais realista, estuda modos de aumentar a longividade e de diminuir a dor, o sofrimento e os efeitos do envelhecimento no próprio mundo material. E a esse projeto científico da modernidade, neurótico e sem sabedoria, Morin chamou ‘amortalidade’.

Outra grande diferença entre as sociedades tradicionais e a nossa é que, enquanto antes enfrentávamos principalmente perigos e ameaças externas, atualmente nós fabricamos artificialmente nossos riscos para otimizar nossa vida em sociedade. “Nossa época não é mais perigosa ou menos arriscada que as de gerações precedentes, mas o equilíbrio entre riscos e perigos se alternou”. (GIDDENS, 2003, p. 44) E mais: agora somos nós mesmos a nossa maior ameaça: hoje o risco de uma catástrofe ecológica provocada pelo crescimento industrial; ontem, vivemos o risco de uma guerra termonuclear; amanhã, viveremos o risco de uma vida de crescentes incertezas (e a incerteza é um risco que não pode ser calculado). Os motivos que nos assustam são reais, mas são também artificiais.

A experiência da morte imanente à da própria vida. Ela é, simultaneamente, uma meta e um limite: não se trata de uma ameaça eventual ou um medo inconsciente, mas de uma presença constante a cada segundo que mantém todos internamente submissos às redes sociais. É como se a vida fosse uma corrida de maratona, em que, para chegarmos ao final, precisamos dosar respiração, cuidar da postura, da hidratação para não sairmos machucados ou doentes. Na vida contemporânea é preciso sempre ‘estar no limite’ e manter um cuidado obsessivo com o corpo. A noção de morte como risco permanente é uma nova forma de produção de sentido existencial. A morte como companhia constante, que antes era uma experiência exclusiva de poucos místicos, se tornou agora um modo de sujeição das elites na cultura contemporânea. E um modo fragmentado em vários micro-mortes simuladas, em vários choques existenciais do corpo em risco, em vários momentos finais antecipados de um único tempo irreversível. Não se trata mais de ‘viver a morte’ mas sim de sobreviver às muitas mortes. E não adianta negar ou negociar, ter raiva ou ficar triste, é preciso aceitar as mudanças e se adaptar à transformação.

Então, esses são os três pontos que queria ressaltar sobre a morte e sobre o morrer contemporâneo: a morte é imanente à vida; ela existe em função do desenvolvimento da consciência; e, atualmente, foi (ou é) fragmentada e dramatizada em vários eventos parciais menores, ao mesmo tempo em que a vida é artificialmente estendida pela ciência e pela cultura atual.

E a Ayahuasca?

Certamente desempenha um papel muito importante nesse processo. Não apenas porque nos permite vislumbrar essas relações que descrevemos, sobretudo porque pode propiciar essa nova experiência de morte a prazo a um grande número de pessoas, ou melhor, pode potencializar um processo social em curso neste sentido de tornar a experiência de morte mais intensa e mais segura.

NOTAS

(1) Minhas experiências com a jurema e com modos alternativos de trabalhar com Ayahuasca me levaram ao estudo dos exercícios e técnicas de respiração taoísta. Ao contrário dos exercícios respiratórios catárticos de outras tradições (o Pranayana, a respiração holotrópica do Groff, a respiração tolteca do fogo) que enfatizam a hiperventilação (ou no aumento da profundidade e da intensidade dos ciclos respiratórios), as técnicas de respiração taoísta são basicamente suaves e delicadas, exigindo do praticante mais atenção e bastante tenacidade. Dennis Lewis (1997) tem vários exercícios interessantes, envolvendo o controle do ar pelo diafragma (respirações torácica superficial e ampliada pelo abdômen), a respiração risonha com a mentalização de órgãos direcionada para cura e os três tipos funcionais de respiração. Para Lewis, a respiração é energizante quando a inspiração for maior que a expiração; a respiração é depurativa quando a expiração for maior que inspiração; e, quando inspiração e expiração forem iguais, a respiração é equilibrada. Uma forma simplificada de experimentar as três respirações funcionais taoístas é prender a respiração alternamente com os pulmões cheios (respiração energizante) e com os pulmões vazios (respiração depurativa). Assim, por exemplo, podem-se começar todos juntos, com as mãos dadas, subindo os braços na inspiração e baixando-os na expiração, com três respirações equilibradas, três respirações prendendo o ar nos pulmões (mentalizando luz, vida, alegria), novamente três respirações equilibradas, três respirações prendendo os pulmões sem ar (e mentalizando a morte e a descarga de energias negativas); e finalmente três respirações equilibrantes. Depois de realizar o exercício coletivamente, ele também pode ser feito individualmente em silêncio, cada um no seu tempo.

(2) Outra técnica individual, particularmente adequada ao uso de plantas de poder, é a recapitulação da tradição tolteca. A técnica consiste em revisar minuciosamente a própria vida com ajuda da respiração visando reviver os eventos traumáticos passados e resgatar a energia gasta com essas cicatrizes psíquicas no presente.

(3) O Círculo de Repetição é uma técnica que consiste em todos imitarem cada um dos participantes da roda. Tanto se pode deixar livre a ordem e o tempo de participação de cada um, de modo orgânico; como também estabelecer uma seqüência (o sentido horário do círculo, por exemplo) e um tempo (mínimo e/ou máximo) de fala para cada um, mas a imitação deve ser a mais perfeita possível em termos de movimento, voz e intenção – devendo-se evitar o máximo ‘interpretar’ o outro, embora isso seja inevitável e as pessoas acabem vendo como são vistas pelos outros. Esse não é a principal função do exercício, apenas um estágio inicial. Com o tempo (uns 30 minutos), cria-se uma corrente semi-telepática entre os participantes, que passam a sentir a presença de si nos outros e dos outros dentro de si, e se estabelece um jogo profundo de troca de identidades e modos de ver e pensar. O Círculo comporta diferentes aplicações pedagógicas (ensino de línguas, de música, contar estórias míticas), terapêuticas (expressão de conteúdos emocionais reprimidos, ampliação da identidade individual) e psicoespirituais (canalização de mensagens e novas compreensões, viagens da imaginação – a repetição de vozes com os olhos fechados), embora a verdadeira essência desta prática esteja em seu caráter lúdico e aberto à improvisação.

(4) + sobre os sonhos lúcidos: http://www.lucidity.com/

(5) Em 1952, Leitman e Aserinsky (2003) estabeleceram, através de eletroencefalogramas, o ciclo fisiológico do sono, composto por pelo menos três estágios com diferentes propriedades neurofisiológicas: o estágio hipnagógico (início do sono em que os pensamentos consistem em imagens fragmentadas e pequenas cenas), o estágio do sono de ondas lentas (em que as ondas cerebrais do neo-cortex apresenta freqüências baixas e grande amplitude) e o estágio do sono REM. Durante o sono REM, o cérebro apresenta um funcionamento das sinapses cerebrais superior ao estado da vigília em momentos da maior atividade (confronto com perigo, luta pela sobrevivência, contato sexual iminente).

(6) A propósito, todos trabalhos citados podem ser baixados da Biblioteca Virtual dos Pesquisadores do Ayahuasca. http://www.4shared.com/dir/18370815/2ce564a0/sharing.html

(7) LEWIN (1965, 1989) definiu esse três comportamentos a partir do estudo de vários grupos de animais (insetos, mamíferos, répteis). Em outros trabalhos, os redefini como “pastores, ovelhas e lobos” (GOMES, 2000).

(8) Há a morte aparente, a morte celular, a cerebral, a morte das funções vitais, a decomposição orgânica. Na verdade, a morte é um processo não é um momento.

(9) Artigo com revisão da literatura cientifica <http://www.hcnet.usp.br/ipq/revista/vol34/s1/116.html> e
Vídeos com entrevistas com pessoas que quase-morreram. <http://youtube.com/watch?v=XPzTa-HDV3A>

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
 
GIDDENS, Anthony. O Mundo em descontrole – o que a globalização está fazendo de nós. Rio de Janeiro: Record, 2003.

GOMES, Marcelo Bolshaw. Um Mapa, Uma Bússola – Hipertexto, Complexidade e Eneagrama. Rio de Janeiro, Editora Mileto, 2001.
 
LEWIS, Dennis. O Tão da respiração natural – para saúde, o bem-estar e o crescimento interior. Tradução Marta Rosas. São Paulo: Pensamento, 1997.

Pai Nosso da Transformação

Forma primeira e última,
Que está no início dos tempos e do espaço.


Santificados sejam todos os nomes do Todo;
Vamos nós à Unidade do Universo;
Seja Tua Vontade desejada por cada parte;
Assim na real como no virtual.


Dai-nos agora, a informação de cada segundo.


Verticalizai-nos - assim como nós nos horizontalizamos.


(Mas) Não nos deixeis cair em desordem
E livra-nos das demandas entrópicas do ruído.
Amém!

Budismo

A LIBERDADE É UM DESAFIO
Quando o monge budista Bodhidharma (1) chegou à China, no século VI, foi se apresentar na corte do Imperador Wu (Ryo no Butei). O Imperador Wu levou o monge então a grande salão onde havia vários guerreiros treinando lentamente Tai-chi Chuan, levitando pesadas bolas de metal entre as mãos.

E disse: “Esses são nossos guerreiros; através do controle da energia eles podem vencer qualquer um que ataque a China”.

Depois, o Imperador foi a outro salão em que vários médicos curavam as pessoas através de técnicas de imposição das mãos nos canais de energias do corpo (Shiatzu e Do-in) e de pequenas agulhas esquentadas no fogo (acumputura e mosha). Outros faziam poções e chás, davam banhos e compressas nos doentes.

E disse: “Esses são nossos curadores; eles recuperam e revigoram a vida do povo”.

E finalmente, o Imperador Wu levou Bodhidharma a um terceiro salão, onde vários sábios estudavam o I Ching – o livro das transmutações – e faziam previsões através das rachaduras de cascos de tartaruga.

E disse: “Esses sãos nossos aprendizes dos mestres do Destino, que estudam o tempo e profetizam nosso futuro”.

Ante a falta de interesse do monge, o Imperador então colocou:

- Este é o taoísmo, o tesouro espiritual da cultura chinesa. E você, indiano, qual é o ensinamento sagrado que trouxe para nos ensinar?

- Nada sagrado, apenas um grande vazio (2) – respondeu humildemente Bodhidharma e se retirou do palácio para as montanhas Shaolin.



O Grande Vazio

Sempre me fascinou o fato das religiões se fundarem em belas idéias filosóficas: o Cristianismo se funda nos dois princípios éticos do amor ao Pai (eixo vertical e dialético) e ao próximo (eixo horizontal e dialógico); o Islã se baseia na entrega absoluta ao universal Alá e na submissão incondicional a seu profeta e mensageiro; o Budismo (ou os budismos) se baseia(m) na crença de que tudo é ilusão (maia) e que a iluminação (ou nirvana) consiste da transcendência de todo desejo pela consciência.

O Budismo é um sistema de crença que acredita que está acima dos demais sistemas de crenças. Por isso, se diz que ele não é mais uma religião e sim uma filosofia transcendental. Nas versões mais ortodoxas e antigas, a filosofia budista é um empirismo absoluto formatado pela observação e pela experiência mística. Porém, assim como o Cristianismo ou Islamismo, o Budismo tem também uma idéia/crença central: o ‘grande vazio’.

Na verdade, há vários budismos. Hoje, há três escolas principais com várias ramificações (3). Há mais antiga é a Theravada (do páli thera, "anciãos" e vada, "palavra, doutrina", "Doutrina dos Anciãos"). É predominante em: Sri Lanka, Tailândia, Mianmar, Laos, Camboja, Bangladesh, Vietnã e Malásia. E o maior no Ocidente também. Atualmente o número de budistas desta escola em todo o mundo excede 100 milhões de pessoas.

Em segundo lugar, em antiguidade e em tamanho, é o Zenbudismo. Zen é o nome japonês da tradição Ch'an, surgida na China, por volta do século II. Cultivado sobretudo na China, Japão, Vietnã e Coréia. Alguns estudiosos consideram estas escolas como uma linhagem Mahayana. Outros, no entanto, dizem que, pela ênfase ser diferente, e pelo Zen/Chan ser "descendentes" também do Taoísmo, devem ser considerados uma escola à parte.

E, finalmente, a Vajrayana é a mais recente das principais escolas budistas. O Budismo tibetano, também chamado de lamaísmo, por ser o mais numeroso nessa categoria, tem suas práticas de meditação na forma de elaborados rituais, com leitura de saddhanas (textos litúrgicos), visualizações e instrumentos musicais. Possui uma tradição nas artes, como pinturas e esculturas, e também tradição em ordens monásticas, com ênfase no relacionamento alunos e lamas. Apesar de não se organizar como uma instituição, tem sua representação maior na figura do Dalai Lama. As principais escolas são nyingma, kagyu, gelug e sakya.

Neste sentido, o Budismo tântrico tibetano (Vajrayana) é filosoficamente superior tanto ao Zen-Budismo e quanto a antiga escola Theravada porque tem uma visão fenomenológica de si, admitindo que haja um conjunto de idéias (crenças) - ou 'juízos sintéticos a priori', para usar meu Kant - que formatam a experiência da vida budista.

E quais são os juízos sintéticos a priori do Budismo?

São as Quatro Nobres Verdades (4): tudo que vivemos é sofrimento; a ignorância, o desejo e a aversão são as causas do sofrimento; acabando com a ignorância, com o desejo e com a aversão, o sofrimento também acaba; e, finalmente, para acabar com as causas do sofrimento é necessário seguir o Nobre Caminho Óctuplo (5). Enquanto as Nobres Verdades são um diagnóstico, o Nobre Caminho é o remédio.

E este, por sua vez, é formado por oito preceitos: o entendimento correto (do sofrimento e suas causas); o pensamento correto (que reflita a realidade das coisas, sem distorções subjetivas); a linguagem correta (não mentir, caluniar, distorcer os fatos ou exagerar, não ferir ou ofender, não falar inutilmente); a ação correta (não matar, não roubar, não ter má conduta sexual, comer, beber e consumir apropriadamente); o modo de vida correto (encontrar uma forma honesta de viver, um ambiente que propicie a realização dos demais preceitos); o esforço correto (redirecionar a energia, não alimentando mais desejos e aversões em nossa consciência e, em contrapartida, emanar o amor e a compaixão a todos os seres); a atenção correta (desenvolver a capacidade de focar a atenção e de se observar) e, finalmente, a concentração correta (a capacidade de permanecer profundamente absorto no aqui-e-agora por períodos de tempo cada vez mais longos).

Outra forma tradicional de apresentar a doutrina budista é dividi-la em três: a Moral (sila), a Meditação (samadhi) e a Sabedoria (prajña). Sendo que a moral corresponde aos preceitos 3, 4 e 5; a meditação aos preceitos 6, 7 e 8; e a sabedoria aos preceitos 1 e 2 do Nobre Caminho. Todos os preceitos estão inter-relacionados.

E, de todas as formas, o ponto de partida do Budismo é sempre a percepção de que o desejo causa inevitavelmente o sofrimento. Deve-se eliminar o desejo para se eliminar a dor e, assim, atingir a paz interior ou felicidade. O objetivo é o fim do ciclo de sofrimento, Samsara, despertando no praticante o entendimento da realidade última - o Nirvana. Para tanto, o praticante deve apenas evitar o mal, fazer o bem e cultivar a própria mente.

Como foi dito: para maioria das escolas budistas a doutrina budista é resultado da meditação e da observação dos que se iluminaram. Apenas as escolas mais recentes admitem que as Nobres Verdades e o Nobre Caminho são estruturas metafísicas anteriores à experiência que formatam mentalmente a observação. Há ainda muitos outros conceitos secundários, que as diferentes escolas enfatizam ou omitem.

Mas, há, sobretudo, alguns conceitos que são muito mais importantes do que a doutrina budista declarada, pois realmente caracterizam a singularidade do Budismo em relação a outros sistemas de crença.

- a Impermanência (Anicca). Todas as coisas são impermanentes. Tudo muda o tempo todo sem parar. Este é um ponto em comum entre o Budismo e a filosofia de Heraclito e do Taoísmo. “Nunca um mesmo homem se banha em um mesmo rio.” O que nos faz sofrer não é a impermanência em si, mas o nosso desejo de que as coisas sejam permanentes enquanto elas não o são.

- o Não-eu (Anatta). Nada que existe tem existência em si mesmo, separada e independente. Todos os fenômenos estão inter-relacionados. É a Unicidade. Cada coisa precisa estar ligada com todo o universo para poder existir. Não existe nada que é separado do resto, que possa existir de forma independente e definitiva. O ‘eu’ ou a alma (atma) é apenas uma ilusão.

- o Nirvana. Sidarta Gautama descreveu o Budismo como uma jangada que, após atravessar um rio, permite ao passageiro alcançar o Nirvana. Nirvana é a liberação total do sofrimento, um estado de paz inabalável e de indescritível felicidade. É um estado além de todos os conceitos. Nirvana é o estado de absoluta liberdade e de completo silêncio do coração, além de todos os conceitos. Literalmente nirvana significa “extinção”.

Para mim, a grande originalidade do Budismo em relação a outros credos está na concepção de mundo resultante desses três conceitos, que opera uma lógica inclusiva de desconstrução negativa, em que não há transcendência metafísica, comparada por Mircea Eliade ao pensamento neopositivista de Wittgeinstein (1999, 69).

Primeiro porque ele é o único sistema de crenças que acredita na idéia de Liberdade, embora seja uma liberdade completamente subjetiva – como se verá adiante.

Karma e Reencarnação

Em segundo lugar porque (ao contrário do que pensa o leigo em geral) não há, no Budismo, uma alma imortal que se reencarna sucessivamente através das vidas. Para alguns budistas contemporâneos - como Ricardo Sasaki (6) e Luís Dantas (7) - não há reencarnação e sim renascimento.

A noção de Reencarnação, idéia central do Hinduísmo reinventada pelo espiritismo e da religiosidade esotérica contemporânea, é que uma parte do Ser (consciência, espírito ou alma) é capaz de subsistir à morte do corpo e de ligar-se sucessivamente a diversos outros corpos para a consecução de um fim específico, como o auto-aperfeiçoamento moral e/ou a anulação do karma.

Já Karma ou karma (do sânscrito Karmam, e em pali, Kamma, “ação”) é um termo usado para expressar um conjunto de ações dos homens e suas conseqüências. Para o Hinduísmo, karma é a dívida que transportamos de uma vida para outra. O Budismo usa a palavra karma no sentido de “conjunto de deméritos acumulados”, mas não no sentido de transmissão de responsabilidade de almas entre organismos diferentes; preferindo falar de renascimento à reencarnação, pois não aceita a idéia de um ‘eu’ permanente que passe de uma vida a outra (8).

A reencarnação e o karma são crenças fundamentais do espiritismo kardecista e de vários outros tipos esoterismos modernos (teosofia, rosacruz, etc), porém dentro de um quadro de referências culturais bem diferentes: o tempo histórico (e as noções de progresso material e evolução espiritual); o paradigma pseudo-científico, cartesiano e mecanicista, em que os eventos são determinados como “uma lei de causa e efeito”; e, sobretudo, o contexto cultural pós-moderno, ao mesmo tempo, desencantado e supersticioso.

Já no Hinduísmo e em outras tradições, o tempo não é contínuo, progressivo e histórico; e sim simultâneo, complexo e circular, com breves ciclos de duração dentro de ciclos mais longos e até infinitos; e não há ênfase na causalidade na vida individual, mas sim nos acontecimentos coletivos. Os karmas eram grupais e a reencarnação estava inserida em um contexto de retorno dos ancestrais e também das divindades.

Ou seja: há uma grande diferença entre as crenças modernas e antigas de reencarnação e karma diferença entre as concepções de tempo histórico e mítico nas culturas tradicionais e moderna. E para universalizar o valor de suas crenças, os esotéricos atuais tendem a vê-las em todos os lugares e épocas - até aonde eles efetivamente não existem (9).

Há ainda, atualmente, vários cientistas adeptos da idéia da reencarnação como fenômeno objetivo e “não como uma crença religiosa” (10). A ciência, no entanto, também é um sistema de crença empirista (como o Budismo, o espiritismo kardecista e até vários o xamanismos) ‘acredita’ ter sido forjado apenas a partir da experiência pura, ignorando que a experiência é pré-enquadrada em um quadro de referências interpretativas. Então, não adianta tentar convencer o budista, o cientista ou o espírita que as coisas não são como eles pensam, pois eles geralmente sustentam suas opiniões em experiências práticas vividas (e interpretadas pela tradição que sustentam). E embora ‘os fatos’ pareçam ter um valor universal, muitas vezes as diferenças de contexto dão significados bem distintos aos acontecimentos semelhantes.

Não bastasse essa grande diferença cultural entre o passado e o presente (sobretudo a idéia de karma posta de forma mais probabilística que determinística), há também diferentes compreensões do termo entre as religiões tradicionais, que influenciaram a concepção reencarnacionista moderna de forma desigual. O Budismo compreende o karma como uma dívida (como uma contabilidade moral de méritos e deméritos durante a vida) a ser saldada, passivamente, por ações meritórias e pela não-reação à violência; enquanto o Hinduísmo tem no Karma Yoga um sistema voltado para ação. No Bhagavadgita, Krishna instrui Arjuna como guerrear sem adquirir karma – como se verá adiante.

A crença na Liberdade

Trata-se aqui da crença na Liberdade. E não do conceito de Liberdade, tarefa legítima da filosofia analítica (11), ou do mito da Liberdade, como querem os que não acreditam nela (12). Na perspectiva de uma arqueologia dos credos, a crença da liberdade é, universalmente, oposta às outras crenças. Porém, enquanto alguns enfatizam a liberdade como um desemaranhar do karma; outros (como o pensador esotérico brasileiro Trigueirinho, por exemplo) afirmam que o livre-arbítrio é típico de seres espiritualmente atrasados como o homem, ou seja: se fossemos inteiramente crédulos e não duvidássemos, seríamos mais sábios.

Também em inúmeras lendas e mitos, a liberdade aparece como um castigo ou como resultado de uma desobediência da humanidade em relação aos deuses. Em algumas narrativas, a liberdade é dada ao Homem por outros seres, como no mito de Prometeu, em que o fogo dos deuses é roubado para que o homem conquiste a própria liberdade; em outras, é a consciência que, mascarada por diferentes símbolos, é engendrada por conflitos entre deuses, ou seres de outra ordem evolutiva, em que alguns são favoráveis e outros contrários ao desenvolvimento da humanidade.

Entre todos os credos tradicionais, no entanto, apenas o Budismo apresenta a Liberdade como objetivo espiritual a ser alcançado – o que influenciou bastante não apenas a espiritualidade atual, mas também a filosofia contemporânea, que se comporta com se fosse a sua proprietária exclusiva.

Mas, de que liberdade estamos falando?

Como é falastrão e dá opiniões muito subjetivas e contraditórias sobre diferentes temas, há uma imagem muito negativa de Osho (Bhagwan Shree Rajneesh) nos meios acadêmicos. A verdade, no entanto, é que ele em muitos momentos é um pensador sofisticado, inclusive re-pensando o Budismo por dentro. Osho reinventa o Budismo sem negá-lo, procedendo a uma re-interpretação de vários importantes conceitos budistas: a felicidade, a compaixão e a aceitação – como demonstra adiante, a partir da página 67.

Em relação ao tema filosófico da Liberdade, que é o que nos interessa agora, Osho faz uma interessante releitura do Assim falou Zaratrusta de Nietzsche: o camelo (a ‘liberdade para’ fazermos algo), o leão (a ‘liberdade de’ fazer o que quiser) e a criança (a liberdade do silêncio ou intransitiva). Ou ainda: a liberdade política e objetiva, isto é: a ‘liberdade do não’ da autonomia de decidir o que ser e fazer e não o que os outros querem; a liberdade psicológica e subjetiva, ou seja: a ‘liberdade do sim’ da aceitação da vida; e, finalmente, a liberdade espiritual da criatividade. Para Osho, são esses diferentes tipos de liberdade que temos durante a vida, segundo o grau de maturidade e de compreensão espiritual.

1. Em um primeiro estágio da luta pela liberdade, lutamos contra as regras e contra a autoridade. É a liberdade do não. Mas, de nada adianta a ‘liberdade para’ (cantar, por exemplo) senão temos a liberdade de (a capacidade de cantar, a alegria de cantar).

2. Então, o segundo estágio de luta pela liberdade é contra o próprio condicionamento que absorvemos, é o aperfeiçoamento interior para se conseguir usufruir da liberdade exterior. É a liberdade do sim.

3. Em seguida, chega-se ao terceiro estágio da luta pela liberdade, que consiste em libertar os outros através do exercício criativo da própria liberdade (quando, cantando, mudamos sentimentos e situações). É a liberdade do talvez.

Osho observa ainda que apenas recentemente uma pequena parte da humanidade passou a conhecer a liberdade política plena, isto é: viver sem ser escravizado para sobreviver (incluindo aí o trabalho assalariado).

É claro que a crença na Liberdade é uma só, mas a distinção de três dimensões ou profundidades também é muito útil para contextualizar seus diferentes adeptos. Como a liberdade também tem uma dimensão individual e outra coletiva, pode-se utilizar a metodologia dos quadrantes proposta por Ken Wilber (2007) para obter um quadro de referências ainda mais amplo.


 


SUJETIVO


OBJETIVO


INDIVIDUAL


Liberdade Psicológica


Liberdade Política


COLETIVO


Liberdade Cultural


Liberdade Biológica


 
4º quadrante (coletivo/objetivo) - Em uma perspectiva sistêmica, estritamente objetiva, a Liberdade coletiva é a capacidade de autodeterminação da espécie, representando o mínimo de dependência do sistema (ou meio ambiente) e de seus outros elementos (outras espécies). Se uma organização tem um único fornecedor (entrada) ou um único cliente (saída) ficará dependendo dele. E quanto mais diversificar seus insumos e produtos, mais autonomia ela terá em relação às oscilações ambientais e à interferência de outros agentes.

A Liberdade é assim, nas palavras da biologia da complexidade (Umberto Maturana), Autopoesis, ou a capacidade de produzir a si próprio, criativamente, e de centralizar trocas com um número extenso de parceiros diversificados.

3º Quadrante (coletivo/subjetivo) - Essa liberdade da espécie frente ao meio ambiente, no entanto, é mais desfrutada por alguns indivíduos do que outros por razões de ordem cultural. E a verdadeira liberdade interpessoal não reside nem no desregramento pela vontade (“fazer tudo que quiser: é a única lei” – Alesteir Crowley) nem em sua limitação ontológica pela alteridade (“sua liberdade termina onde a do outro começa”), mas na sua habilidade de perceber a realidade e de sua capacidade de re-interpretar o mundo.

Teoricamente para que se considere uma cultura democrática é preciso que seus membros desempenhem papéis reversíveis do processo decisório coletivo (isto é: que não apenas mandem ou obedeçam) e que as regras sejam flexíveis frentes às necessidades. Na prática, no entanto, não se trata de regras ou de papéis e sim da capacidade de se colocar no lugar do outro, simulando/antecipando reações e agindo de modo consensual. A liberdade interpessoal é agir sem imposição ou oposição.

Nesse quadrante em especial, a liberdade é uma crença. E ela sempre anda de mãos dadas com as crenças culturais na objetividade (e da perspectiva de um observador onisciente) e na história (e do tempo contínuo que acumula informação). E como já foi dito, a liberdade é uma crença oposta à maioria dos sistemas de crenças religiosas tradicionais e, por isso mesmo, desempenha também um papel especial em relação aos sistemas de idéias filosóficas e de organização política das sociedades ocidentais. O que nos leva ao próximo quadrante.

2º Quadrante (individual/objetivo) – Pode-se entender a objetividade da liberdade individual de duas formas: a filosófica e a jurídica. A primeira nos remete às três idéias da Revolução Francesa (liberdade, igualdade e fraternidade) e estruturam a modernidade e seu funcionamento ideológico e institucional. Como princípio filosófico abstrato a liberdade individual (oposta à igualdade e temperada pela fraternidade) passou a ser um dos valores democráticos fundamentais nas sociedades atuais.

Já a liberdade jurídica, concretização deste principio, tem segundo o filósofo político Norberto Bobbio duas versões distintas: a liberdade liberal (ou a não-restritiva) e a liberdade democrática (ou auto-organização). Para concepção liberal, a liberdade “é a faculdade de cumprir ou não certas ações sem impedimentos”; e, para concepção democrática, ela é “o poder de não obedecer a outras normas que não as que se propõem”. Montesquieu será o grande defensor da liberdade liberal: “liberdade é o direito de fazer tudo aquilo que as leis permitem” (Espírito das Leis, Cap. II, livro XII). Rousseau, por sua vez, é o advogado da liberdade democrática: “A obediência à lei que nos mesmos prescrevemos, é liberdade” (Contrato Social, Cap. VIII, livro I).

Tanto a liberdade política filosófica, quanto a que se constitui como direito individual, são conquistas históricas que formalizam e garantem a liberdade existencial de fato.

O que inclui também sua dimensão psicológica.

1º Quadrante (individual/subjetivo) – Quando se fala de liberdade individual subjetiva não trata apenas das escolhas individuais, e sim de como cada individuo enfrentar seu destino, lutando para construir alternativas de vida.

Por exemplo: a feminista que defende o aborto porque crê que a liberdade pessoal da mulher está acima do Direito à vida. Aliás, os chamados ‘crimes contra a vida’ (o aborto, o suicídio, a eutanásia), considerados pela Igreja Católica como pecados imperdoáveis (13) são excelentes exemplos das fronteiras entre a liberdade política e a pessoal: a morte.

A liberdade política vive à sombra das ameaças do Poder, já a liberdade pessoal morre pelo seu desafio, ou melhor, faz da morte uma importante aliada no seu aperfeiçoamento ético. A ‘liberdade para’, objetiva, é uma concessão provisória; a ‘liberdade de’, subjetiva, é uma conquista permanente.

Este talvez seja o verdadeiro sentido dos versos do grande poeta português: “navegar é preciso, viver não é preciso”. Não se trata tão somente de diminuir a importância das necessidades da vida em função da liberdade da viagem, mas sim de aceitar a imprecisão da vida (viver não é preciso, é incerto) diante da precisão exigida pela crença na Liberdade, entendida agora como um exercício de autodisciplina diante do destino ou ‘responsabilidade’.

É a porta de entrada na liberdade espiritual. Mas também pode descambar para o individualismo e tem seus exageros: a libertinagem perversa do Marques de Sade, o existencialismo melancólico e egocêntrico de Jean Paul Sartre e o pensamento neoliberal da Haydke. Nesses casos, a liberdade não se sobrepõe à vida, mas sim ao Outro, visto como uma limitação estrutural.

A liberdade é um paradoxo: dever (obrigação) e direito (permissão), um presente roubado dos deuses e um desafio de desenvolvimento, consciência e sonho.

Moral budista e ética guerreira

O Bhagavadgita, a sublime canção, foi introduzido nos Vedas no século II d.C. (ELIADE, 1999, 178). O nascimento de Sidarta Gautama foi entre 600 e 400 aC. É possível que o Gita seja uma resposta do Hinduísmo à doutrina budista do karma, vista como uma dívida a ser paga através da ‘não-reação’. O Gítã é a conclusão de uma grande epopéia mítica, o Mahabarata ou o combate dos irmãos Pandavas com seus primos, os kauravas, pelo reino de Bharata. Enganados no jogo de dados, os Pandavas são exilados, passando dez anos vagando pelos reinos mágicos da Índia. Quando voltam para casa, são impedidos de entrar pelos primos e anuncia-se uma grande batalha. O Gítã narra o momento que antecede a luta, em que Arjuna se recusa a combater, para não matar seus antigos mestres e amigos e assim aumentar seu karma. Então surge Krisna e diz que se Arjuna não cumprir seu destino e derrotar o inimigo, o mundo estará entregue a maldade.

Krisna instrui a Arjuna nas três modalidades de ioga: Jnana para mente, Bhakti devocional, e a karma ioga, ou a arte da ação guerreira sem adquirir karma. Não é a ação em si que gera o karma, mas o sentimento agregado a ela. Assim, para o Hinduísmo, o karma é a ação e não o resultado de sua reação, como no Budismo. Aliás, essa é a idéia essencial no Hinduísmo: a instrução de Karma Ioga (ioga da ação) que Krisna ensina ao guerreiro Arjuna no Bhagavad-Gítã (14).

Para entender as diferenças entre as concepções religiosas é preciso comparar seus propósitos específicos. O objetivo teleológico coletivo dos judeus e dos cristãos é o retorno do messias e o advento da cidade santa no fim dos tempos. O propósito do espírita é a evolução espiritual através de sucessivas reencarnações. E a meta do budista é a iluminação ou a libertação do desejo e do sofrimento. Os credos antigos tinham objetivos coletivos; os modernos, metas individuais. Porém, sempre é o propósito espiritual que dá sentido a todas as práticas e à filosofia das religiões. E o mínimo que se pode dizer do Budismo é que ele tem um foco mais ‘preciso’ que as outras religiões.

Por outro lado, o fato desse foco estar centrado na vida interior, aliena o praticante de sua vida social. O nirvana substitui a utopia social, isto é, o ideal de construção de uma sociedade justa e a favor do desenvolvimento equilibrado.

Na doutrina budista não há espaço para transcendência, imagens ou idéias permanentes. Não existe nada de valor além deste mundo (arquétipos, espíritos ou dimensões) e a realidade é apenas uma descrição feita pela mente. E essa ênfase na imanência espiritual (um anti-platonismo radical e a ausência de um telos coletivo transcendental) é a principal característica do Budismo, influência com uma longa lista de adeptos, com destaque para os filósofos Spinoza e Schopenhauer, e mais recentemente, para os autores esotéricos contemporâneos, como Krisnahmurti, Gurjieff, Osho, e Castaneda – que enfatizam mais o descondicionamento da consciência cotidiana do que à adesão aos sistemas de crenças tradicionais.

Também em relação à reencarnação (considero que) o Budismo está parcialmente correto. A cada vida somos um conjunto de seres que se dispersam após a morte. Apenas os que conseguem realmente evoluir espiritualmente conquistam alguma unicidade a partir dos seus Eus Superiores. Essa posição é explicitamente defendida por vários autores atuais, que simplesmente se percebem com um conglomerado de eu’s que lutam para se unificar, enfatizam a identificação progressiva com o Eu Superior (e da depuração do karma dos diversos agregados psíquicos). Nessas concepções, o conceito de karma é compreendido de forma semelhante ao conceito budista: o destino já está determinado, mas temos plena liberdade de decidir como vamos realizá-lo.

Por exemplo: estamos predestinados a um casamento ou a um acidente, mas a forma como vamos enfrentar esses eventos é de nossa inteira responsabilidade. Há, nos autores modernos, uma dialética entre karma (ou as causas do destino) e livre-arbítrio (ou o modo de vida), expressa na equação: Porque = karma; como = Liberdade.

O karma, assim visto, é uma espécie de inércia, uma tendência do vivente repetir as atitudes do passado diante de situações análogas às que já viveu. Esse processo de repetição aprisiona o homem, moldando um padrão e um destino provável, pois suas ações têm sempre a mesma inflexão e resultados semelhantes. É uma tendência recorrente, uma repetição constante de situações e tipos de pessoas, um mesmo padrão de ocorrência reincidente. Assim, “não há coincidências” e “o acaso não existe”. Assim, o destino é condicionado pelo passado/presente (ou determinado pelo conjunto de condições inerciais) e segue a lógica resultante de suas ações anteriores: “colhemos o que plantamos”.

Bem vistas esses aspectos marcantes positivos (a perspectiva e o foco imanente no auto desenvolvimento, a concepção não determinista de karma e de reencarnação, etc); então, quais os aspectos negativos do Budismo?

Bom, disse no começo que o Budismo é um sistema de crença que acredita que está acima dos demais sistemas de crenças. Ou seja: ele é uma concepção de mundo elitista, que se considera superior às outras concepções de mundo.

Por isso, ele é particularmente adotado pelas elites que não se identificam com suas tradições culturais. E isto não é vale só para as elites atuais de países periféricos em um mundo globalizado (como aqui no Brasil), mas também historicamente para China, o Japão e o sul da Ásia. O Budismo só não cresceu na Índia.

Um breve estudo da história do Budismo mostrará que ele floresce primeiro nas elites (embora, em um segundo momento, desenvolva ‘versões populares’ (15) como também mimetiza formas híbridas com outras religiosidades) através de um distanciamento das culturas locais, com um forte apelo para o individualismo. É como alguém disse: “um credo de ex-intelectuais irracionalistas”.

Sendo um sistema de crenças que não se reconhece enquanto tal, o Budismo apresenta várias incoerências e ambigüidades – em suas diferentes versões. Por exemplo, enquanto as versões mais refinadas afirmam ‘nada existe a ser feito ou realizado’, a ausência de objetivos é o que permite viver o momento e ser felizes aqui e agora; para outras (para maioria), o nirvana é o principal objetivo individual.

Some-se a isso que, no Budismo, a verdade é sempre subjetiva e relativa. Tradicionalmente é dito que o Buda, “em sua infinita compaixão”, ensinou 84.000 ensinamentos, adaptados a cada tipo de seres existentes. O que dá margem a englobar tudo e esconder bem as próprias contradições. Por exemplo: o Budismo não acredita na existência de Deus (ou de deuses), mas muitas versões populares transformam o(s) Buda(s) em uma entidade(s) semelhante(s). Os rituais tibetanos da Tara Vermelha e dos Cinco Budas – bastante conhecidos hoje no ocidente - utilizam-se de expedientes mágicos, associando visualizações, mantras, incensos, oferendas – da forma semelhante a outros cultos mágicos e devocionais - como o candomblé ou a cabala.

O elitismo cultural e a incoerência inclusiva, no entanto, não são o que há de mais nocivo. O mais grave é a conhecida confusão que se faz em torno da noção de Paz. O Budismo não consegue diferenciar aceitação da vida de conformismo social. A idéia budista de paz associa um estado de consciência de transe profundo a uma atitude política de não-reação à violência. E isto tem um apelo especial para a juventude ocidental, pois dá um sentido político à meditação e um sentido espiritual à vida política.

Talvez por isso, que no Kashimir, no Tibet e na Birmânia, o Budismo não consiga de defender contra as agressões de que é vítima, enquanto outras formas de espiritualidade encaram a violência colonial como desafio de desenvolvimento. Falta ao Budismo o sentido de aventura da vida. Mais que isso: mudar a si mesmo não modifica imediatamente o mundo em que se vive e o projeto coletivo de extinção do mal através da renúncia aos sentidos é uma estratégia autista. E é preciso se comportar de um modo diferente do que o Budismo em relação às tiranias do mundo.

Diante de filosofias guerreiras, afirmativas da vida, como a de Nietzsche, o Budismo é “uma religão que aspira ao Nada” (2002, 54). Mais realista que o Cristianismo, é verdade, mas igualmente decadente e submissa às injustiças, à mentira estrutural da representação social, e à ‘crueldade do mundo’.

A capacidade de superar-se a si mesmo (e de transformar o mundo) - a vontade de potência, para usar as palavras do filósofo alemão - só se desenvolve através de desafios e de seus riscos. Espreitar a violência do mundo e a própria morte de modo a aprender com elas e se desenvolver ao máximo – eis em que a espiritualidade guerreira se distingue radicalmente do Budismo em suas diferentes e contraditórias versões.

NOTAS

(1) Bodhidharma (em japonês: Daruma ou Bodaidaruma) é o mestre indiano que levou o Budismo à China. É o primeiro patriarca do Budismo Zen e o 28º na linhagem do Budismo Indiano iniciada por Buda Shakyamuni (Sidarta Gotama). É ainda o introdutor do kung-fu nos templos Shaolin e o criador da cerimônia do chá.


(2) Em outras traduções: “Nada sagrado: espaços abertos”. Esse texto é uma livre adaptação minha do koan 29 do Denkoroku, Registro da Transmissão da Luz, de Keizan Jokin Zenji, reproduzido pelo site http://www.dharmanet.com.br/.

(3) Para uma visão panorâmica das escolas budistas, v.: A que escola pertenço? - um guia para quem está se interessando pelo Buddhismo de Ricardo Sasaki. < http://nalanda.org.br/pdf/aqep.pdf  >

(4) Dhammacakkapavattana Sutta (Samyutta Nikaya LVI.11)

(5) Magga-vibhanga Sutta (Samyutta Nikaya XLV.8)

(6) Segundo Sasaki, no ensinamento budista, há um ciclo de mortes e renascimentos para os seres vivos, mas não de reencarnações. O renascimento descrito pelo Budismo é em vez disso uma herança de agregados impermanentes, não de uma verdadeira identidade permanente. “Note-se que o conceito do não-eu (anatta) não significa que o indivíduo seja inexistente e sim que se deve renunciar ao apego, àquilo que psicologicamente se considera como “eu” e “meu”. Segundo o texto Anatta-lakkhana Sutta (SN 44.10), devemos nos desapegar dos agregados com os quais nos identificamos porque, sendo esses impermanentes, o apego nos leva à insatisfação (Dukkha).” < http://www.nalanda.org.br/sala/reenvibu.php >

(7) Já Dantas : (...) “na reencarnação ocorre sempre com a rigorosa transferência de méritos de um indivíduo específico para outro único indivíduo exclusivamente. Essa crença não pode ser considerada budista.” < http://www.dantas.com/budismo/reencarnacao.htm >

(8) Além disso, o Budismo incorpora a possibilidade de involução e de ‘voltar como’ plantas e/ou animais da metempsicose grega’.

(9) Diversos estudiosos defendem que a reencarnação era admitida pelo cristianismo, tendo sido proscrita pelo Segundo Concílio de Constantinopla, em 553 d.C.. É preciso dizer que essa informação é absolutamente falsa, nunca houve nenhuma menção à reencarnação no referido concílio e não há nenhuma prova da adesão do cristianismo primitivo às teses espíritas.

(10) Destaca-se o trabalho do Dr. Ian Stevenson, da Universidade de Virgínia, EUA, que recolheu dados sobre mais de 2.000 casos em todo o mundo que evidenciam a reencarnação.

(11) COSTA, C. F. Livre-arbítrio para compatibilistas < http://www.filosofia.cchla.ufrn.br/claudio/ >.

(12) SKINNER, B. F. O mito da liberdade. São Paulo: Summus, 1972.

(13) Interpretação atual para passagem evangélica em que Jesus afirma que não há perdão para os pecados cometidos contra o Espírito Santo. Mateus, 12, ver. 31,32; Marcos, 3, 28ss; Lucas 12, 10)

(14) O que levou a alguns comentadores ocidentais do texto a interpretar este diálogo como a relação pedagógica entre o Eu Superior e o Ego (Huberto Rohden, por exemplo). A tradição hinduísta, que considera Arjuna e Krisna como personagens históricos reais, desautoriza esta leitura de Nova Era.

(15) Como as escolas devocionais da Terra Pura (Jodo Shu) e Verdadeira Terra Pura (Jodo Shinshu), trazida para o Brasil pelos imigrantes japoneses.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ELIADE, M.; COULIANO, I. P. O Dicionário das Religiões. Tradução; Ivone Castilho Benedetti. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

OSHO Liberdade – a coragem de ser você mesmo. Tradução Denise de C. Rocha Delela. Dicas para uma nova maneira de viver. São Paulo: Cultrix, 2006d.