sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

A Recapitulação 2


Recapitular é uma atividade especializada dos espreitadores pela qual suas rotinas de vida e relacionamento são impiedosamente expostas. A componente da socialização em nossas vidas, ao fixar o ponto de aglutinação numa posição específica, nos torna padronizados e monotonamente repetitivos no nosso relacionamento com as pessoas e com o mundo que nos cerca.. É um círculo vicioso sem fim. A recapitulação traz isso à tona e inicia gradualmente o processo de transformação.
Já que é um trabalho “para a vida inteira e mais além”, a recapitulação exige no início muita energia, determinação e paciência. Nossa tendência é sempre adiar, procurar uma ocasião mais propícia para iniciar a prática, mas o Nagual deixa claro que o melhor momento para começar é agora..
Ele diz abaixo que “a totalidade de um caminho se resume em seu primeiro passo. Isso significa que as condições ideais são aqui e agora".
Se atentarmos para o fato de que através da recapitulação o espreitador engendra um meio de atender uma exigência inexorável do ”mar escuro da consciência” dando a ele as experiências pessoais reivindicadas e espertamente ficando com a vida (consciência), não há dúvida de que essa é a atividade mais importante de nossas vidas, ou seja, manter a sua consciência individual em evolução mesmo sem o organismo humano.
Com a passagem dos anos, o inevitável sentimento de urgência que sutilmente começa a aparecer, vai deixar claro que não estamos atendendo nesta vida a nossa mais alta vocação e potencialidade de “ser humano” que é levar nossa consciência ao infinito.
A recapitulação é uma oportunidade e como tal não deve ser ignorada ou subestimada, pois é um privilégio ter tido nesta existência contato com tal ensinamento.
De acordo com o que Dom Juan ensinava a seus discípulos, a recapitulação era uma técnica descoberta pelos feiticeiros do antigo México e usada por todos os xamãs praticantes dali por diante, de examinar e reviver todas as experiências de suas vidas para alcançar dois objetivos transcendentais:
- o objetivo abstrato de cumprir um código universal que exige que a consciência seja abandonada no momento da morte e
- o objetivo extremamente pragmático de adquirir fluidez perceptiva.
Ele dizia que a formulação do primeiro objetivo era o resultado de observações que os feiticeiros fizeram através da sua capacidade de ver a energia diretamente como ela flui no universo. Eles tinham visto que no universo existe uma força gigantesca, um imenso conglomerado de campos de energia que eles chamaram a águia ou o mar escuro da consciência Eles observaram que o mar escuro da consciência é a força que empresta consciência a todos os seres vivos, do vírus ao homem. Acreditavam que a força empresta consciência a um ser recém-nascido e que este ser aumenta aquela consciência através das suas experiências de vida até um momento em que a força exige sua devolução.
No entendimento dos feiticeiros, todos os seres vivos morrem porque são forçados a devolverem a consciência que lhes foi emprestada. Através das eras, os feiticeiros têm entendido que não existe nenhuma maneira do que o homem moderno chama de o nosso modo linear de pensamento explicar um fenômeno como esse, porque, para uma linha de raciocínio de causa e efeito, não há como explicar por que e como a consciência é emprestada e depois retomada. Os feiticeiros do antigo México viam isso como um fato energético do universo, um fato que não pode ser explicado em termos de causa e efeito ou em termos de um propósito que pudesse ser determinado a priori.
Os feiticeiros da linhagem de Dom Juan acreditavam que recapitular significava dar ao mar escuro da consciência o que ele estava buscando: as suas experiências de vida. Entretanto acreditavam que, através da recapitulação, poderiam adquirir um grau de controle que lhes permitiria separar as experiências de vida da sua força vital. Para eles, as duas não estavam insoluvelmente entrelaçadas; só estavam unidas circunstancialmente.
Esses feiticeiros afirmavam que o mar escuro da consciência não quer tirar a vida dos seres humanos; só quer as experiências de vida. A falta de disciplina nos seres humanos os impede de separar as duas forças e, no final, eles perdem suas vidas, onde se esperava que perdessem apenas a força das experiências de vida. Os feiticeiros viam a recapitulação como o procedimento através do qual eles poderiam dar ao mar escuro da consciência um substituto para as suas vidas. Eles abriam mão das suas experiências de vida relatando-as, mas retinham a sua força vital.
Quando examinadas em termos dos conceitos lineares do nosso mundo ocidental, as alegações perceptivas dos feiticeiros não fazem absolutamente nenhum sentido. A civilização ocidental tem estado em contato com os xamãs do Novo Mundo há quinhentos anos e nunca houve, por parte dos acadêmicos, uma tentativa genuína de formular um discurso filosófico sério baseado nas declarações feitas pelos xamãs. Por exemplo, para qualquer membro do mundo ocidental, a recapitulação pode parecer coerente com a psicanálise, algo na linha de um procedimento psicológico, uma espécie de técnica de auto-ajuda. Nada poderia estar mais distante da verdade.
De acordo com Dom Juan Matus, o homem sempre perde por negligência. No caso das premissas da feitiçaria, ele acreditava que o homem ocidental está perdendo uma tremenda oportunidade para intensificar a sua consciência e que a maneira como o homem ocidental se relaciona com o universo, a vida e a consciência é apenas uma entre múltiplas opções.
Para os xamãs praticantes, recapitular significava dar a uma força incompreensível - o mar escuro da consciência - a própria coisa que ela parecia estar procurando: as suas experiências de vida, isto é, a consciência que eles ampliaram através daquelas próprias experiências de vida. Já que provavelmente Dom Juan não poderia me explicar esses fenômenos em termos de lógica clássica, ele dizia que tudo o que os feiticeiros podiam desejar fazer era realizar a façanha de reter sua força vital sem saber como isso era feito. Também dizia que havia milhares de feiticeiros que tinham conseguido fazer isso. Tinham conservado a sua força vital após terem dado ao mar escuro da consciência a força das suas experiências de vida. Para Dom Juan, isso significava que esses feiticeiros não morreram no sentido usual como entendemos a morte, mas transcenderam-na retendo sua força vital e desaparecendo da face da terra, embarcando em uma viagem definitiva de percepção.
A crença dos xamãs da linhagem de Dom Juan era que, quando a morte acontece dessa forma, todo o nosso ser transforma-se em energia, um tipo especial de energia que conserva a marca da nossa individualidade. Dom Juan tentava explicar isso em um sentido metafórico dizendo que nós somos compostos de um número de nações unitárias: a nação dos pulmões, a nação do coração, a nação do estômago, a nação dos rins e assim por diante. Às vezes cada uma dessas nações funciona independentemente das outras, mas no momento da morte todas elas são unificadas em uma única entidade. Os feiticeiros da linhagem de Dom Juan chamavam esse estado de liberdade total. Para os feiticeiros, a morte é uma unificadora e não uma exterminadora, como ela o é para o homem comum.
- Esse estado é a imortalidade, Dom Juan? - perguntei.
- Isso de modo algum é a imortalidade - respondeu ele. - É simplesmente a entrada em um processo evolucionário, usando o único meio para a evolução que o homem tem à sua disposição: a consciência. Os feiticeiros da minha linhagem estavam convencidos de que, biologicamente, o homem não poderia evoluir mais; conseqüentemente, consideravam a consciência do homem o único meio para evoluir. No momento de morrer os feiticeiros não são aniquilados pela morte, mas transformados em seres inorgânicos: seres que têm consciência, mas não um organismo. Para eles, serem transformados em um ser inorgânico era evolução e isso significava que um novo tipo indescritível de consciência lhes era emprestado, uma consciência que permaneceria por verdadeiramente milhões de anos, mas que algum dia também precisaria ser devolvida ao doador: o mar escuro da consciência.
Uma das descobertas mais importantes dos xamãs da linhagem de Dom Juan foi que, como todas as outras coisas no universo, o nosso mundo é uma combinação de duas forças opostas e ao mesmo tempo complementares. Uma dessas forças é o mundo que conhecemos, que os feiticeiros chamavam o mundo dos seres orgânicos. A outra força é algo que eles chamavam o mundo dos seres inorgânicos.
- O mundo dos seres inorgânicos - dizia Dom Juan - é povoado por seres que possuem consciência, mas não um organismo. Eles são conglomerados de campos de energia, exatamente como nós o somos. Aos olhos de um vidente, em vez de seres luminosos, como os seres humanos o são, eles são bastante opacos. Não são configurações energéticas arredondadas, mas sim alongadas, como uma vela. Em essência, são conglomerados de campos de energia que, assim como nós, têm coesão e limites. São mantidos unidos pela mesma força aglutinadora que mantém os nossos campos de energia unidos.
- Onde fica esse mundo inorgânico, Dom Juan? - perguntei.
- É o nosso mundo gêmeo - respondeu ele. - Ocupa o mesmo tempo e o mesmo espaço que o nosso mundo, mas o tipo de consciência do nosso mundo é tão diferente do tipo de consciência do mundo inorgânico que nós nunca notamos a presença dos seres inorgânicos, embora eles notem a nossa.
Os seres inorgânicos são seres humanos que evoluíram? perguntei.
- Absolutamente não! - exclamou ele. - Os seres inorgânicos do nosso mundo gêmeo têm sido intrinsecamente inorgânicos desde o início, do mesmo modo como temos sido sempre intrinsecamente seres orgânicos, também desde o início. Eles são seres cuja consciência pode evoluir exatamente como a nossa, e sem dúvida o faz, mas não tenho nenhum conhecimento direto de como isso acontece. Entretanto o que sei é que um ser humano cuja consciência evoluiu é um ser inorgânico brilhante, luminescente e arredondado de um tipo especial.
Dom Juan me deu uma série de descrições desse processo evolucionário, que eu sempre assumi como metáforas poéticas. Eu escolhia a que me agradava mais, que era a da liberdade total. Imaginava um ser humano que entra em liberdade total como sendo o ser mais corajoso, mais imaginativo possível. Dom Juan dizia que eu não estava fantasiando absolutamente nada - que, para entrar em liberdade total, um ser humano deve invocar o seu lado sublime que, dizia ele, os seres humanos têm mas que nunca lhes ocorre usar.
Dom Juan descrevia o segundo, o objetivo pragmático da recapitulação, como a aquisição de fluidez. O fundamento lógico dos feiticeiros por trás disso tinha a ver com um dos assuntos mais evasivos da feitiçaria: o ponto de aglutinação, um ponto de intensa luminosidade, do tamanho de uma bola de tênis, perceptível quando os feiticeiros vêem um ser humano como um conglomerado de campos de energia.
Feiticeiros como Dom Juan vêem que trilhões de campos de energia na forma de filamentos de luz vindos de todo o universo convergem ao ponto de aglutinação e o atravessam. Essa confluência de filamentos dá ao ponto de aglutinação a sua luminosidade. O ponto de aglutinação possibilita que um ser humano perceba aqueles trilhões de filamentos de energia transformando-os em dados sensoriais. Depois o ponto de aglutinação interpreta esses dados como o mundo da vida cotidiana, isto é, em termos da socialização e do potencial humano.
Recapitular é reviver todas ou quase todas as experiências que tivemos e, fazendo isso, deslocar o ponto de aglutinação, ligeiramente ou bastante, impelindo-o pela força da memória a adotar a posição que tinha quando o acontecimento que está sendo recapitulado ocorreu. Esse ato de ir de um lado para o outro de posições anteriores à atual proporciona aos xamãs praticantes a fluidez necessária para suportarem diferenças extraordinárias em suas viagens pelo infinito. Para os praticantes da Tensegridade, a recapitulação proporciona a fluidez necessária para suportarem diferenças que não fazem parte, de modo algum, de sua cognição habitual.
Como um procedimento formal, a recapitulação era feita nos tempos antigos recordando-se de cada pessoa que os praticantes conheciam e de cada experiência em que tomaram parte. Dom Juan sugeria que, no meu caso, que é o caso do homem moderno, eu fizesse uma lista por escrito de todas as pessoas que eu tinha conhecido em minha vida, como um estratagema mnemônico. Uma vez que eu tivesse escrito a lista, ele continuaria a me dizer como usá-la. Eu precisava pegar a primeira pessoa da minha lista, que retrocedia no tempo do presente até a época da minha primeiríssima experiência de vida, e, na minha memória, estabelecer a minha última interação com aquela primeira pessoa. Essa ação é chamada de organizar o acontecimento a ser recapitulado.
Uma detalhada recordação de minúcias é requerida como o meio apropriado de afiar a capacidade de lembrar. Essa recordação envolve obter todos os detalhes físicos pertinentes, tal como o ambiente no qual o acontecimento recordado ocorreu. Uma vez que o acontecimento está organizado, a pessoa deve realmente entrar no local em si, prestando especial atenção a quaisquer configurações físicas relevantes. Por exemplo, se a interação aconteceu em um escritório, o que deve ser lembrado é o chão, as portas, as paredes, os quadros, as janelas, as mesas, os objetos sobre as mesas, todas as coisas que poderiam ter sido observadas em um relance e depois esquecidas.
Como um procedimento formal, a recapitulação deve começar pelo relato minucioso de acontecimentos que acabaram de ocorrer. Dessa forma, a primazia da experiência tem precedência. Alguma coisa que acabou de ocorrer é algo que a pessoa pode se lembrar com grande precisão. Os feiticeiros sempre confiaram no fato de que os seres humanos são capazes de armazenar informações detalhadas das quais não estão conscientes e de que aquele detalhe é o que o mar escuro da consciência procura.
A verdadeira recapitulação do acontecimento requer que a pessoa respire profundamente, abanando a cabeça, por assim dizer, muito lenta e delicadamente, de um lado para o outro, começando por qualquer que seja o lado, esquerdo ou direito. Esse abano da cabeça era feito tantas vezes quantas fossem necessárias, enquanto a pessoa se lembrava de todos os detalhes acessíveis. Dom Juan dizia que os feiticeiros falavam sobre esse ato como inalar todos os sentimentos que a pessoa teve no acontecimento sendo recordado e expelir todos os humores indesejáveis e os sentimentos irrelevantes que permaneceram nela.
Os feiticeiros acreditam que o mistério da recapitulação reside no ato de inalar e exalar. Uma vez que a respiração é uma função de manutenção da vida, os feiticeiros têm certeza de que através dela a pessoa também pode entregar ao mar escuro da consciência o fac-símile das suas experiências de vida. Quando eu pressionava Dom Juan por uma explicação racional sobre essa idéia, sua posição era que coisas como a recapitulação só podiam ser experimentadas e não explicadas. Ele dizia que no ato de fazer a pessoa pode encontrar a libertação e que explicar isso era dissipar nossa energia em esforços infrutíferos. Seu convite era coerente com todas as coisas relacionadas ao seu conhecimento: o convite para entrar em ação.
Na recapitulação, a lista de nomes é usada como um estratagema mnemônico que impele a memória em uma viagem inconcebível. A posição dos feiticeiros a esse respeito é que relembrar acontecimentos que acabaram de ocorrer prepara o solo para a recordação de acontecimentos mais distantes no tempo com a mesma clareza e proximidade. Recordar experiências desse modo é revivê-las e extrair dessa recordação um ímpeto extraordinário que é capaz de despertar a energia dispersada dos nossos centros de vitalidade e fazê-la retornar para eles. Os feiticeiros se referem a essa redistribuição de energia que a recapitulação causa como obter fluidez após dar ao mar escuro da consciência o que ele está procurando.
Em um nível mais mundano, a recapitulação proporciona aos praticantes a capacidade de examinar a repetição em suas vidas. A recapitulação pode convencê-los, além de qualquer sombra de dúvida, de que todos nós estamos à mercê de forças que definitivamente não fazem nenhum sentido, embora à primeira vista pareçam perfeitamente razoáveis; como, por exemplo, ficar à mercê do galanteio. Parece que para algumas pessoas o galanteio é a busca de toda uma existência. Pessoalmente, tenho ouvido falar de pessoas com idade avançada cujo único ideal era encontrar uma companhia perfeita e cuja aspiração era terem talvez um ano de felicidade no amor.
Dom Juan Matus costumava me dizer, sob meus veementes protestos, que o problema era que ninguém queria realmente amar alguém, mas que cada um de nós queria ser amado. Ele dizia que para nós essa obsessão pelo galanteio, tomado pelo significado visível, era a coisa mais natural do mundo. Ouvir um homem ou uma mulher de 75 anos dizer que ainda está à procura de um companheiro perfeito é uma afirmação de algo idealista, romântico e belo. No entanto, examinar essa obsessão no contexto das repetições intermináveis de uma existência faz com que ela apareça como realmente é: algo grotesco.
Dom Juan me assegurava que, se alguma mudança comportamental está para ser realizada, precisa ser feita através da recapitulação, já que ela é o único veículo que pode intensificar a consciência liberando a pessoa das exigências não expressas da socialização, que são tão automáticas, tão desvalorizadas, que não são sequer notadas sob condições normais e muito menos examinadas.
O verdadeiro ato de recapitular é um empreendimento de toda uma vida. Demora anos para esgotar a lista de pessoas, especialmente para aqueles que conheceram e interagiram com milhares de indivíduos. Essa lista é aumentada pela lembrança de acontecimentos impessoais nos quais nenhuma pessoa está envolvida, mas que precisam ser examinados porque de algum modo estão relacionados à pessoa sendo recapitulada.
Dom Juan afirmava que o que os feiticeiros do antigo México procuravam avidamente ao recapitularem era a lembrança da. interação porque, na interação, residem os efeitos profundos da socialização, que eles lutavam para superar por quaisquer meios disponíveis.
Passes Mágicos, págs. 112 a 118

· Florinda riu, descrevendo o choque que teve. O velho a tinha levado a uma participação ativa na sua própria cura. Além do mais, com o pretexto da exigência da curandeira, ele a colocava dentro do engradado diariamente durante seis horas pelo menos, a fim de que ela realizasse uma tarefa específica a que ele dava o nome de "recapitulação".
O Presente da Águia, pág. 227

· Por isso seu benfeitor teve de se mudar para outra região do México e ela teve de ficar escondida na casa dele durante anos; essa situação favoreceu Florinda, pois ela tinha de realizar a tarefa de "recapitular" e necessitava de absoluto silêncio e solidão.
Explicou que a recapitulação é o ponto forte dos espreitadores, como o corpo sonhador é o ponto forte dos sonhadores. Consistia em recordar sua vida até os mínimos detalhes. Para isso seu benfeitor lhe tinha dado aquele engradado como um instrumento e um símbo­lo. Era um instrumento que lhe permitia aprender a se concentrar, pois tinha de se sentar lá durante anos até que toda sua vida tivesse passado diante dos seus olhos. E era um símbolo dos estreitos limi­tes da nossa pessoa. Seu benfeitor lhe disse que quando terminasse a recapitulação quebrasse o engradado para simbolizar que não mais mantinha as limitações da sua pessoa.
O Presente da Águia, pág. 228

· Florinda me deu então os fundamentos da recapitulação. Disse que o primeiro estágio é um breve relato de todos os incidentes da nossa vida, que se apresentam de uma maneira óbvia para exame.
O segundo estágio é uma recordação mais detalhada, que sistematicamente vai desde a época anterior ao espreitador ter se sentado dentro do engradado, e teoricamente se estende ao momento do nas­cimento.
Ela me assegurou que uma recapitulação perfeita pode mudar um guerreiro tanto, se não mais, quanto o controle total do corpo sonhador. Nesse particular, o sonho e a espreita têm a mesma finalidade, entrar na terceira atenção. É importante, entretanto, que o guer­reiro saiba e pratique os dois. Disse que para a mulher há configu­rações diferentes do corpo luminoso para se aperfeiçoar em uma ou em outra. Os homens, ao contrário, podem realizar os dois com facilidade, mas ao mesmo tempo não podem nunca chegar ao grau de eficiência que as mulheres atingem em cada arte.
O Presente da Águia, pág. 228

· Florinda explicou que o elemento-chave na recapitulação é a respiração. Respirar para ela era uma mágica, por ser uma função que produz a vida. Disse que essa recordação é fácil se se consegue reduzir a área de estímulo em volta do corpo. Por isso existia o engradado; a partir daí a respiração produz memórias cada vez mais profundas. Teoricamente, os espreitadores têm de se lembrar de cada sentimento que tiveram na vida, e esse processo se inicia com uma respiração. Ela me avisou que o que estava me ensinando eram apenas preliminares, que mais tarde, em condições diferentes, me ensinaria as complexidades do processo.
Florinda disse que seu benfeitor lhe orientou a escrever uma 1ista de acontecimentos a serem revividos. Falou que a técnica se iniciava com uma respirada inicial. Os espreitadores começam com o queixo sobre o ombro direito e lentamente inspiram à medida que viram a cabeça num ângulo de cento e oitenta graus. A respirada termina no ombro esquerdo. Uma vez terminada a inspiração, a cabeça volta a ficar relaxada. Eles expiram olhando para a frente.
O espreitador então pega o primeiro acontecimento da lista e se concentra, até que todos os sentimentos que nele se encerram tenham sido recontados. Enquanto se lembram dos sentimentos que tiveram durante o acontecimento recordado, inspiram lentamente, movendo a cabeça do ombro direito para o esquerdo. A função dessa respiração é restaurar energia. Florinda disse que o corpo luminoso está cons­tantemente criando filamentos semelhantes a teias de aranha, que são projetados para fora da massa luminosa, impulsionados por qualquer tipo de emoções. Portanto, cada situação de interação ou cada situa­ção que envolve sentimentos é potencialmente drenada para o corpo luminoso. Respirando da direita para a esquerda enquanto se lem­bram de um sentimento, os espreitadores, através da mágica da respi­ração, pegam os filamentos que foram deixados para trás. A próxima respirada imediata é da esquerda para a direita e é uma expiração. Com ela os espreitadores soltam os filamentos deixados neles por outros corpos luminosos envolvidos no acontecimento que está sendo recordado.
Ela declarou que essas eram as preliminares essenciais da espreita que todos os membros do seu grupo tinham passado como introdução a exercícios mais apurados da arte. Sem fazer os exercícios prelimi­nares para recuperar os filamentos deixados no mundo, e particular­mente para desprezar os que os outros deixaram neles, não há possi­bilidade de manipular a loucura controlada, pois esses filamentos estranhos são a base da capacidade ilimitada de auto-importância de uma pessoa. Para exercitar a loucura controlado, já que ela não visa a enganar ou punir as pessoas ou se sentir superior a elas, tem-se de ser capaz de rir de si próprio. Florinda disse que um dos resultados de uma recapitulação detalhada é a graça de se ver face a face com a repetição monótona da auto-estima de alguém, que está no cerne de toda a interação humana.
Ela enfatizou que o regulamento definia a espreita e o sonho como artes, portanto, a serem representadas. Disse que a natureza produtora de vida da respiração é também o que dá sua capacidade de limpeza. É essa capacidade que faz da recapitulação uma questão prática.
O Presente da Águia, pág. 229

· “Disse que seu benfeitor considerava as três técnicas básicas da espreita - o engradado, a lista de acontecimentos a serem recapitulados, e a respiração do espreitador - como sendo as tarefas talvez mais importantes de um guerreiro. Ele achava que uma recapitulação profunda era o meio mais eficiente para se perder a forma humana. Portanto, seria fácil para os espreitadores, depois de recapitularem suas vidas, fazer uso de todos os não fazeres do seu eu, tais como apagar sua história pessoal, perder a auto-importância, quebrar as rotinas, e assim por diante.”
O Presente da Águia, pág. 230

· - Recordar não é o mesmo que relembrar - continuou. - Relembrar é ditado pelo tipo de pensamento cotidiano, enquanto recordar é ditado pelo movimento do ponto de aglutinação. Uma recapitulação de suas vidas, que os feiticeiros fazem, é a chave para mover seus pontos de aglutinação. Os feiticeiros começam sua recapitulação pensando, relembrando os atos mais importantes de suas vidas. Após apenas pensar a respeito deles, movem-se então para estar realmente no local do evento. Quando conseguem fazer isso, estar no local do evento, foi porque moveram com sucesso seu ponto de aglutinação ao lugar preciso onde estava quando o evento teve lugar. Trazer de volta o evento total por meio do movimento do ponto de aglutinação é conhecido como a recordação dos feiticeiros.
Olhou para mim por um instante, como se tentando assegurar-se de que eu estava escutando.
- Nossos pontos de aglutinação estão constantemente se movendo, movimentos imperceptíveis. Os feiticeiros acreditam que, para fazer seus pontos de aglutinação se moverem a pontos precisos, devemos empenhar por intento. Uma vez que não há maneira de saber o que é o intento, os feiticeiros deixam que seus olhos o chamem.
- Tudo isso é de fato incompreensível para mim - retruquei.
O Poder do Silêncio, pág. 129

· Morri naquele campo. Senti minha consciência fluindo para fora de mim e dirigindo-se na direção da Águia. Mas como eu havia recapitulado impecavelmente minha vida, a Águia não me devorou a consciência. A Águia cuspiu-me para fora. Por­que meu corpo estava morto no campo, ela não me deixou se­guir diretamente para a liberdade. Era como se me dissesse para voltar e tentar outra vez.”
O Poder do Silêncio, pág. 187

· Eu chegara ao ponto de ter medo de dormir nos dias em que sabia que teria aquele sonho.
- Você ainda não está verdadeiramente pronto para fundir sua realidade de sonho com sua realidade cotidiana. Precisa recapitular mais a sua vida.
- Mas eu já fiz toda a recapitulação possível - protestei.
- Venho recapitulando há anos. Não há mais nada que eu possa lembrar sobre minha vida.
- Deve haver muito mais - ele disse, inflexível. – De outro modo não acordaria gritando.
Não gostei da idéia de ter de recapitular outra vez. Eu tinha feito isso, e acreditava que fizera tão bem que não precisaria nunca mais tocar no assunto.
- A recapitulação de nossa vida nunca termina, não importa que tenhamos recapitulado direito - disse Dom Juan. - O motivo das pessoas comuns não terem vontade própria nos sonhos é nunca terem recapitulado, e suas vidas ficam cheias até a borda de emoções como lembranças, esperanças, medos etc. etc.
"Os feiticeiros, por outro lado, são relativamente livres de emoções pesadas e opressivas, por causa da recapitulação. E se alguma coisa faz com que eles fiquem bloqueados, como está acontecendo com você, a suposição é que ainda existe alguma coisa neles que não está suficientemente clara.”
- Recapitular é um negócio envolvente demais, Dom Juan.
- Talvez exista alguma outra coisa que eu possa fazer.
- Não, não existe. Recapitular e sonhar andam lado a lado. À medida que regurgitamos nossas vidas nós ficamos mais e mais leves.
Dom Juan me dera instruções detalhadas e explícitas sobre a recapitulação. Consistia em reviver a totalidade das experiências de vida lembrando-se de cada detalhe possível. Ele via a recapitulação como o fator essencial na redefinição e reestruturação da energia do sonhador.
- A recapitulação liberta a energia aprisionada dentro de nós, e sem essa energia liberada o sonhar não é possível.
A Arte do Sonhar, pág. 166

· Anos antes Dom Juan me levara a fazer uma lista de todas as pessoas que conhecera na vida, começando no presente. Ele me ajudou a arrumar a lista de modo ordenado, separando-a por áreas de atividade, como os empregos que eu tivera, as escolas onde estudara. Em seguida guiou-me para ir, sem qualquer desvio, da primeira pessoa em minha lista até a última, revivendo cada uma das interações que eu tivera com elas.
Explicou que a recapitulação de um evento começa com a mente arrumando tudo que tem a ver com o que está sendo recapitulado. Arrumar significa reconstruir o evento, peça por peça, começando pela lembrança dos detalhes físicos ao redor, e em seguida passando à pessoa com quem compartilhamos a interação, e em seguida para nós mesmos; para o exame de nossos sentimentos.
Dom Juan me ensinou que a recapitulação é realizada junto com uma respiração natural e rítmica. São feitas longas expirações enquanto a cabeça se move devagar e suavemente da direita para a esquerda; e são tomadas longas inalações quando a cabeça se move da esquerda para a direita. Ele chamava de "arejar o evento", esse ato de mover a cabeça de um lado para o outro. A mente examina o evento do princípio ao fim, enquanto o corpo ventila tudo em que a mente se concentra.
Dom Juan disse que os feiticeiros da antigüidade, os inventores da recapitulação, viam a respiração como um ato mágico, vivificante, e usavam-na como um veículo de magia; a expiração era usada para ejetar a energia estranha deixada neles enquanto a interação era recapitulada, e a inalação servia para recuperar a energia que eles tinham deixado para trás durante a interação.
Devido ao meus estudos acadêmicos eu tomei a recapitulação como o processo de analisar a própria vida. Mas Dom Juan insistiu que havia mais coisa envolvida do que uma psicanálise intelectual. Ele postulava a recapitulação como uma manobra dos feiticeiros para induzir um deslocamento minúsculo, porém firme, do ponto de aglutinação. Disse que, sob o impacto de rever sentimentos e ações do passado, o ponto de aglutinação fica indo e voltando do posicionamento atual para o que ele ocupava quando aconteceu o evento que está sendo recapitulado.”
A Arte do Sonhar, pág. 167

· Dom Juan afirmava que o raciocínio dos feiticeiros antigos, para explicar a recapitulação, era sua convicção de que existe uma inconcebível força de dissolução no universo, que faz os organismos viverem emprestando-lhes consciência. A mesma força também faz os organismos morrerem, para extrair deles a mesma consciência emprestada, que os organismos aprimoraram através de suas experiências de vida. Dom Juan explicou o raciocínio dos feiticeiros antigos. Eles acreditavam que, como essa força estava atrás de nossa experiência de vida, era de suprema importância o fato de que ela poderia se satisfazer com um fac-símile de nossa experiência de vida: a recapitulação. Ao receber o que deseja, a força de dissolução deixa os feiticeiros livres para expandir sua capacidade de perceber e de chegar com ela aos confins do tempo e do espaço.
Quando comecei a recapitular de novo tive a grande surpresa de ver meus treinamentos de sonhar suspensos automaticamente. Perguntei a Dom Juan sobre esse recesso indesejado.
- O sonhar exige toda a energia disponível - respondeu ele. - Se houver uma preocupação profunda em sua vida, não existe possibilidade de sonhar.
- Mas eu já estive profundamente preocupado antes, e meus treinamentos nunca se interromperam.
- Pode ser então que, toda vez que você achou que estava preocupado, estivesse apenas egomaniacamente perturbado - ele disse rindo. - Para os feiticeiros, estar preocupado significa que todas as nossas fontes de energia foram utilizadas. Essa é a primeira vez que você envolve a totalidade de suas fontes de energia. No resto do tempo, mesmo quando recapitulou antes, você não estava completamente absorvido.
Dessa vez Dom Juan me deu outro padrão de recapitulação. Eu deveria construir um quebra-cabeça recapitulando, sem qualquer ordem, diferentes fatos de minha vida.
- Mas vai ser uma confusão - protestei.
- Não, não vai - ele assegurou. - Será uma confusão se você deixar sua mesquinharia escolher os eventos a serem recapitulados. Em vez disso deixe o espírito decidir. Silencie, e em seguida vá até o evento que o espírito escolher.
Os resultados desse padrão de recapitulação foram chocantes em muitos níveis. Achei impressionante descobrir que, toda vez que silenciava meus pensamentos, uma força que parecia independente lançava-me de imediato numa lembrança detalhada de algum evento de minha vida. Mas foi ainda mais impressionante descobrir que daquilo resultava uma configuração bastante ordenada. O que imaginei que seria caótico acabou mostrando-se extremamente eficaz.
Perguntei a Dom Juan por que ele não me fizera recapitular daquele jeito desde o início. Ele respondeu que existem dois ciclos básicos para a recapitulação: o primeiro era chamado de formalidade e rigidez, e o segundo de fluidez.
Eu não tinha a menor idéia de como minha recapitulação seria diferente. A capacidade de concentração, que eu adquirira através dos treinamentos de sonhar, permitiu-me examinar minha vida numa profundidade que nunca imaginaria possível. Demorei mais de um ano para ver e rever tudo que podia sobre minhas experiên­cias. No final precisei concordar com Dom Juan: eu tinha uma imensidão de emoções escondidas tão profundamente a ponto de se tornarem virtualmente inacessíveis.
A Arte do Sonhar, pág. 168

· Tudo que esses feiticeiros faziam girava em torno de cinco preocupações:
- primeira, os passes mágicos;
- segunda, o centro energético no corpo humano chamado de centro para decisões;
- terceira, a recapitulação - as maneiras para aumentar o campo de ação da consciência humana;
- quarta, sonhar, a arte genuína de romper os parâmetros da percepção normal;
- quinta, o silêncio interior - o estágio da percepção humana do qual esses feiticeiros empreendiam cada uma das suas consecuções perceptivas.
Essa seqüência das cinco preocupações foi um conjunto moldado na compreensão que aqueles feiticeiros tinham do mundo ao seu redor.
De acordo com o que Dom Juan ensinava, uma das descobertas estarrecedoras daqueles xamãs foi a existência no universo de uma força aglutinadora que une campos de energia em unidades concretas e funcionais. Os feiticeiros que descobriram a existência dessa força descreveram-na como uma vibração ou condição vibratória que permeia grupos de campos de energia e os mantém unidos.
Em termos desse conjunto de cinco preocupações dos xamãs do antigo México, os passes mágicos preenchem a função da condição vibratória da qual falavam os xamãs. Quando aqueles feiticeiros juntaram essa seqüência xamanística das cinco preocupações, copiaram
O padrão da energia que lhes era revelado quando eles eram capazes de ver a energia como ela flui no universo. A força de ligação eram os passes mágicos. Os passes mágicos eram a unidade que permeava as quatro unidades restantes e as agrupava em um único todo funcional.”
Passes Mágicos, pág. 99

· OS PASSES MÁGICOS PARA A RECAPITULAÇÃO
A recapitulação afeta algo que Dom Juan chamava de corpo energético. Ele explicava formalmente o corpo energético como um conglomerado de campos de energia que são a imagem espelhada dos campos de energia que constituem o corpo humano quando ele é visto diretamente como energia. Dizia que no caso dos feiticeiros o corpo físico e o corpo energético são uma única unidade. Os passes mágicos para a recapitulação trazem o corpo energético para o corpo físico, o que é essencial para navegar no desconhecido:
13. Forjando o Tronco do Corpo Energético
14. Esbofeteando o Corpo Energético
15. Estendendo Lateralmente o Corpo Energético
16. Estabelecendo o Núcleo do Corpo Energético
17. Forjando os Calcanhares e as Panturrilhas do
18. Forjando os Joelhos do Corpo Energético
19. Forjando as Coxas do Corpo Energético
20. Despertando a História Pessoal Tomando-a Flexível
21. Despertando a História Pessoal Batendo Repetidamente com o Calcanhar no Chão
22. Despertando a História Pessoal Sustentando o Calcanhar no Chão
23. As Asas da Recapitulação
24. A Janela da Recapitulação
25. As Cinco Respirações Profundas
26. Extraindo Energia dos Pés
Passes Mágicos, págs.118 a 125

· “No mundo dos xamãs, perceber a energia de tal maneira é o primeiro passo obrigatório para uma visão mais livre, mais abrangente, de um sistema diferente de conhecimento. Para provocar em mim a resposta de ver, Dom Juan utilizou outras estranhas unidades de cognição. Uma das mais importantes chamava-se recapitulação, que consistia em um escrutínio sistemático da própria vida, segmento por segmento, um exame feito não à luz da crítica e da descoberta de falhas, mas à luz de um esforço para entender a própria vida e mudar o seu curso. O argumento de Dom Juan era que, uma vez que o praticante visse sua vida da maneira distanciada que a recapitulação exige, não havia mais a possibilidade de voltar à mesma vida.”
A Roda do Tempo, pág. 11

· Para Dom Juan Matus, recapitular significava reviver e remanejar tudo de nossa vida numa única ação. Ele nunca se preocupou com as minúcias das elaboradas variações daquela antiga técnica. Florinda, por sua parte, tinha uma meticulosidade totalmente diferente. Ela gastava meses treinando-me em aspectos da recapitulação que até hoje sou incapaz de explicar.
- É a vastidão do guerreiro o que você está experimentando - ela explicou. - As técnicas estão aí. Grande coisa. O que é de suprema importância é o homem que as usa e seu desejo de ir até o fim com elas.
A Roda do Tempo, pág. 230

· - A premissa dos feiticeiros é que para se introduzir algo, precisa-se de espaço para colocá-lo - disse ele. - Se você estiver cheio até a borda com itens da vida cotidiana, não há espaço para nada novo. Esse espaço precisa ser construído. Percebe o que eu quero di­zer? Os feiticeiros dos tempos antigos acreditavam que a recapitulação da sua vida abria esse espaço. Ela faz isso e muito mais, claro.
A maneira como os feiticeiros realizam a recapitulação é muito formal. Consiste em fazer uma lista de todas as pessoas que conhe­ceram, desde o presente até o início de suas vidas. Uma vez feita essa lista, pegam a primeira pessoa dela e lembram-se de tudo o que pu­derem sobre essa pessoa. E quero dizer tudo, cada detalhe. É melhor recapitular do presente para o passado, porque as memórias do pre­sente estão frescas e dessa maneira a capacidade de lembrar é afiada. O que os praticantes fazem é lembrar e respirar. Inspiram lenta e deliberadamente, girando a cabeça da direita para a esquerda, num balanço quase imperceptível, e expiram da mesma forma?
Disse que o inspirar e o expirar devem ser naturais; se forem rápidos demais, uma pessoa entraria no que se chama de respira­ção cansativa: respirações que depois precisam de respirações len­tas a fim de acalmar os músculos.
- E o que devo fazer, Dom Juan, com tudo isso? - perguntei. - Comece a fazer a sua lista hoje - disse ele. - Divida-a por anos, por ocupações, organize-a da maneira que quiser, po­rém faça-a em seqüência, com a pessoa mais recente primeiro e terminando com a sua mãe e o seu pai. Depois, lembre-se de tudo sobre elas. Não há mais nada para se fazer além disso. A medida que você pratica, perceberá o que está fazendo.
O Lado Ativo do Infinito, pág. 180

· - O poder da recapitulação - disse Dom Juan - é que revolve todo o lixo das nossas vidas e o traz para a superfície.
Depois Dom Juan delineou as complexidades da consciência e percepção, que eram as bases da recapitulação. Começou dizendo que ia apresentar um conjunto de conceitos que sob nenhuma condição deveriam ser tomados como teorias de feiticeiros, porque era um conjunto formulado pelos xamãs do México antigo como um resultado de ver a energia diretamente enquanto ela flui no universo. Ele me preveniu que iria me apresentar as unidades desse conjunto sem qualquer tentativa de classificá-las ou categorizá-las por qualquer padrão predeterminado.
- Não estou interessado em classificações - continuou ele. - Você tem classificado tudo na sua vida. Agora vai ser forçado a ficar longe das classificações. Outro dia, quando lhe perguntei se sabia alguma coisa sobre nuvens, você me deu os nomes de todas as nuvens e o percentual de umidade que se deve esperar de cada uma delas. Foi um verdadeiro meteorologista. Porém, quando lhe perguntei se sabia o que poderia fazer pessoalmente com as nuvens, não teve a menor idéia do que eu estava falando.
O Lado Ativo do Infinito, pág. 183

· “Explicou que os feiticeiros do México antigo viram que o universo como um todo é composto de campos energéticos na forma de filamentos luminosos. Viram milhões deles, onde quer que se virassem para ver. Também viram que esses campos ener­géticos se organizam em correntes de fibras luminosas, fluxos que são constantes, forças perenes no universo, e que a corrente ou o fluxo de filamentos que está relacionado com a recapitulação foi chamado por esses feiticeiros o mar escuro da consciência, e tam­bém a Águia.”
O Lado Ativo do Infinito, pág. 184

· “- Os feiticeiros acreditam - Dom Juan continuou - que à medida que recapitulamos as nossas vidas, todo o entulho, como lhe disse, chega à superfície. Percebemos as nossas inconsistências, nossas repetições, mas algo em nós coloca uma tremenda resis­tência para recapitularmos. Os feiticeiros dizem que o caminho fica livre somente depois de uma revolução gigantesca, depois de aparecer na nossa tela da memória um evento que mexe com as nossas bases com uma clareza de detalhes aterrorizadora. É o evento que nos arrasta para o momento exato em que o vivemos. Os feiticeiros chamam aquele evento de condutor, porque daí em diante cada evento que mencionamos é revivido, não meramente lembrado.”
O Lado Ativo do Infinito, pág. 186

· Caminhar é sempre algo que precipita as memórias. Os fei­ticeiros do México antigo acreditavam que tudo o que vivemos armazenamos como uma sensação na parte posterior de nossas pernas. Consideravam a parte posterior das nossas pernas como o armazém da história pessoal do homem. Portanto, vamos ago­ra caminhar nas montanhas.
Caminhamos até quase escurecer.
- Acho que já o fiz caminhar longe o suficiente - Dom Juan disse, quando voltamos para a sua casa - para que já esteja pronto para começar essa manobra dos feiticeiros de encontrar um con­dutor: um evento na sua vida que você lembrará com tal clareza que servirá como holofote para iluminar todo o resto da sua recapitulação com a mesma clareza, ou com clareza comparável. Faça o que os feiticeiros chamam de recapitulando peças de um quebra-cabeça. Alguma coisa o levará a se lembrar do evento que servirá como o seu condutor.
Dando-me um último aviso, me deixou só.
- Dedique a isso o seu melhor - disse ele. - Faça o seu melhor.
Fiquei extremamente silencioso por um momento, talvez de­vido ao silêncio à minha volta. Experimentei então uma vibra­ção, um tipo de solavanco em meu peito. Tive dificuldade em respirar, mas de repente algo abriu caminho em meu peito, per­mitindo que eu respirasse profundamente, e uma visão total de um evento esquecido de minha infância irrompeu em minha memória, como se tivesse ficado preso e de repente fosse libertado.
O Lado Ativo do Infinito, pág. 186

· “A claridade do condutor trouxe um novo ímpeto para a minha recapitulação. Uma nova disposição substituiu a anti­ga. Dali em diante, comecei a relembrar eventos de minha vida com uma clareza enlouquecedora. Era exatamente como se uma barreira tivesse sido construída dentro de mim, que me manteve rigidamente preso a lembranças pobres e embaçadas, e o condutor a derrubou.”
O Lado Ativo do Infinito, pág. 199

· - Há uma opção secreta para a recapitulação - disse Dom Juan. - Assim como lhe disse que há uma opção secreta para morrer, uma opção que somente os feiticeiros fazem. No caso de morrer, a opção secreta é que os seres humanos podem reter a sua força vital e renunciar somente à sua consciência, o produto de suas vidas. No caso da recapitulação, a opção secreta que somente os feiticeiros fazem é escolher intensificar as suas mentes verdadeiras.
A memória inquietante de suas recordações só poderia vir de sua mente verdadeira. A outra mente que todos temos e compartilhamos, eu diria, é um modelo barato: um poder econômico, o mesmo tamanho serve para todos. Porém, esse é um assunto que discutiremos mais tarde. O que está em jogo agora é o advento de uma força desintegradora. Mas não a força que o está desintegrando, não é isso que quero dizer. Ela está desintegrando o que os feiticeiros chamam de instalação forânea, que existe em você e em todo o ser humano. O efeito da força que está surgindo em você, que está desintegrando a instalação forânea, é que puxa os feiticeiros para fora da sintaxe delas.
O Lado Ativo do Infinito, pág. 208

· “- As circunstâncias a sua volta fizeram com que fosse possí­vel para você ter mais energia - continuou ele. - Você come­çou a recapitulação de sua vida; olhou para seus amigos pela primeira vez como se estivessem numa vitrine; chegou ao seu ponto de ruptura, completamente sozinho, levado pelas suas pró­prias necessidades; se desfez do seu negócio; e acima de tudo acu­mulou suficiente silêncio interior. Tudo isso fez com que fosse possível para você fazer essa viagem através do mar escuro da cons­ciência.”
O Lado Ativo do Infinito, pág. 219

· “Dom Juan tinha incutido um axioma de feiticeiros em mim: "Os guerreiros-viajantes pagam elegantemente, genero­samente e com inigualável facilidade cada favor, cada serviço prestado a eles. Dessa maneira, livram-se do peso de estar endi­vidados."
Tinha pago, ou estava em processo de pagar, a todos que me
honraram com seus cuidados ou preocupações. Tinha recapitu­lado minha vida a tal ponto que não deixara nem uma pedra sem tocar. Naquela época, acreditava verdadeiramente que não devia nada a ninguém. Expressei minhas crenças e hesitações para Dom Juan.
Dom Juan disse que com certeza eu tinha recapitulado minha vida minuciosamente, mas acrescentou que eu estava longe de estar livre de dívidas.
- E os seus fantasmas? - continuou ele. - Aqueles que não pode mais tocar?
Ele sabia o que estava falando. Durante minha recapitulação, contei-lhe cada incidente de minha vida. Das centenas de inci­dentes que lhe relatei, ele isolara três como exemplos de dívidas que contraí no início de minha vida, e somado a isso minha dívi­da para com a pessoa que tinha sido fundamental para que eu o encontrasse. Agradeci ao meu amigo profusamente, e tive a sen­sação de que algo lá fora reconheceu os meus agradecimentos. Os outros três permaneceram histórias de minha vida, histórias de pessoas que me deram um presente inconcebível, a quem eu nunca agradecera.
O Lado Ativo do Infinito, pág. 295

· "Percebam o que vocês têm e não o desperdicem! O sexo é dinheiro, dinheiro vivo! Nosso destino cósmico é expandir a consciência, por isso fomos dotados com uma porção do poder criativo da águia. O sexo foi feito para ensonhar".
Afirmou que, teoricamente, o intercâmbio sexual dos casais não tem porque afetar a disponibilidade luminosa de cada um dos participantes, já que o homem toma da mulher tanto quanto ela toma dele. E o resultado é um equilíbrio neutro. Em todo caso, o indesejável da operação é que a energia se mistura, razão pela qual são gerados laços de dependência que restringe nossa liberdade e que exigem longos anos de recapitulação para serem desfeitos.”
Encontros com o Nagual, pág. 72

· Em uma determinada ocasião, comentou que apesar da drenagem de energia a que a interação social nos expõem, todos nós temos uma opção, pois a característica lacrada de nossa constituição luminosa nos permite reiniciar continuamente do zero para recuperar nossa totalidade.
"Nunca é tarde afirmou. Enquanto nós estivermos vivos, sempre há um modo de conquistar qualquer tipo de bloqueio. O melhor modo para recuperar as fibras luminosas que temos dissipado é chamando de regresso à nossa energia. A parte mais importante é dar o primeiro passo. Para esses que estão interessados na economia e recuperação da energia, o único caminho aberto é a recapitulação.”
Encontros com o Nagual, pág. 78

· Os compromissos emocionais que contraímos com as pessoas são como investimentos feitos ao longo do caminho. É preciso ser muito insensato para deixar nosso patrimônio jogado por aí!
A única forma através da qual podemos estar completos de novo é recolhendo esse investimento, reconciliando-nos com nossa energia e dissipando a carga dos sentimentos. O melhor método que os bruxos descobriram para isto, é recordando os eventos de nossa história pessoal até a sua completa digestão. A recapitulação nos ajuda a sair do passado e nos insere no agora.
"Não podemos evitar o fato de termos nascido como resultado de sexo aborrecido, e nem ter investido a maioria de nossa luminosidade em fazer filhos ou manter relações extenuantes. Mas nós podemos recapitular; isso cancela o efeito energético desses atos.”
Encontros com o Nagual, pág. 79

· "Recapitular é espreitar nossas rotinas, submetendo-a a um escrutínio sistemático e impiedoso. É a atividade que nos permite visualizar nossa vida como totalidade e não como uma sucessão eventual de momentos. Porém, e ainda que isto possa parecer estranho, só os bruxos recapitulam como norma; o resto das pessoas apenas o faz por casualidade.”
Encontros com o Nagual, pág. 79

· Em outra conferência, Carlos se referiu à estagnação luminosa que descreveu como uma fixação de nossa atenção que bloqueia o fluxo da energia. Ele disse que isto acontece quando nós nos recusamos a enfrentar os fatos e nos escondemos atrás de ações evasivas. E também quando deixamos assuntos pendentes ou contraímos compromissos que nos amarram.
A conseqüência da estagnação é que a pessoa deixa de ser ela mesma. Ao ficar pressionada pela cadeia de decisões pela qual foi tomada durante sua vida, já não pode agir de um modo deliberado e se emaranha nas circunstâncias. Esta situação pode chegar ao ponto de se transformar em uma doença mental ou física, e só se pode resolver isso através da recapitulação.
Encontros com o Nagual, pág. 80

· Sustentou que, em essência, recapitular consiste em fazer uma lista das feridas causadas por nossas interações. O passo seguinte é viajar de retorno ao momento quando aconteceram os fatos para absorver de volta o que nos pertence e devolver o alheio.
O guerreiro começa a rebobinar seu dia. Reconstrói as conversações, decifra os significados, recorda os rostos e os nomes, procura matizes, insinuações, disseca as reações emocionais próprias e das outras pessoas. Não deixa nada ao acaso, agarra as lembranças do dia uma por uma e as limpa através da respiração.
Também examina capítulos e categorias completas de sua vida. Por exemplo, as namoradas que teve, as casas onde viveu, escolas, lugares de trabalho, amigos e inimigos, brigas e momentos felizes, e assim por diante. O ideal é atacar a tarefa por ordem cronológica, da memória mais recente até a mais distante que for possível evocar. Mas, para começar, é mais fácil fazê-lo por tópicos.
"Uma forma muito rentável do exercício, acessível a todos nós, é a recapitulação fortuita. Se vocês perceberem, nós estamos constantemente recapitulando. Todas as recordações que conformam nosso diálogo interno podem ser classificadas como tal. Porém, nós os evocamos de forma involuntária. Em vez de os observar em silêncio, nós os julgamos, interagimos visceralmente com eles. Isso é lamentável. Um guerreiro tira proveito da oportunidade, porque essas recordações, aparentemente ao acaso, são avisos de nosso lado silencioso".
Mostrou que para recapitular não são necessárias condições especiais. A pessoa pode tentar o exercício em qualquer momento e lugar em que se sinta animado a fazê-lo.
"Os guerreiros recapitulam quando vão caminhando, no banheiro, ao trabalhar ou ao comer, quando for possível! O importante é fazê-lo".
Acrescentou que não há uma posição definida. O único requisito é estar confortável, de forma que o corpo físico não demande atenção nem interfira com as recordações.
Encontros com o Nagual, pág. 80

· A recapitulação parte de dentro e se sustenta sozinha. É uma questão de silenciar a mente e então nosso corpo energético toma o controle, fazendo o que para ele é uma delícia fazer. Você se sente bem, confortado; longe de dar trabalho, o deixa descansado. Seu corpo percebe isso como uma ducha inefável de energia.
Mas você deve ter a atitude correta. Não confunda o exercício com uma questão psicológica. Se o que você necessita são interpretações, vá até o psiquiatra! Ele dirá o que fazer para que você continue sendo o idiota que é. E menos ainda você deveria andar atrás de uma lição. As histórias com moral só existem nos contos para crianças.
A recapitulação é uma forma especializada de espreita e vocês devem empreender isto com um alto sentido de estratégia. Trata-se de entender e pôr em ordem nossas existências, vendo-as tal e qual são, sem remorsos, repreensões ou felicitações, com desapego total e um ânimo leve, até de humor, porque nada em nossa história é mais importante que nada e todas as relações, afinal, são efêmeras.
O importante é começar, porque a energia que nós recuperamos desde o primeiro intento nos dará forças para continuar recapitulando aspectos mais e mais intrincados de nossas vidas. Primeiro, é necessário começar pelo investimento mais forte que são os sentimentos mais desgarrados. Depois seguimos por aquelas memórias tão profundas que nós já acreditávamos esquecidas, mas que estão ali.
Encontros com o Nagual, pág. 82

· No princípio, recapitular pode nos dar algum trabalho, porque nossa mente não está acostumada à disciplina. Mas, depois de fechar as feridas mais dolorosas, a energia se reconhece a si mesma e nós vamos ficando viciados no exercício. Dessa maneira, cada partícula de luz que recuperamos nos ajuda a ganhar mais.
"No momento em que vocês se disponham a desemaranhar voluntariamente o enredo das suas histórias pessoais, estarão dando o passo decisivo".
"No momento em que vocês se disponham a desemaranhar voluntariamente o enredo das suas histórias pessoais, estarão dando o passo decisivo".
Respondendo a outra pergunta, ele disse que a recapitulação não tem fim, deve durar até o final de nossos dias e mais adiante.
"Eu estiro minhas fibras ao rememorar cada noite o que ocorreu durante o dia. Assim, minha lista de eventos se mantém atualizada. Mas uma vez por ano eu realizo um exercício mais completo e total, para o qual eu me distancio de tudo durante várias semanas".
Encontros com o Nagual, pág. 83

· Outras das perguntas que lhe fizeram foram concernentes aos efeitos da recapitulação sobre a consciência.
Sustentou que o exercício tem dois efeitos principais.
De imediato, corta nosso diálogo interno. Quando um guerreiro consegue parar seu diálogo está estreitando relações com sua energia. Isso o libera da obrigação da memória e da carga dos sentimentos, e deixa um resíduo energético que pode ser investido no aumento das fronteiras da percepção. O guerreiro começa a apreciar a coisa genuína, não a interpretação. Pela primeira vez, faz contato com o consenso dos bruxos que é a descrição de uma realidade inconcebivelmente integrada.
É normal que um guerreiro nesta fase ria à toa, porque a energia provê alegria. Graças à recapitulação, está contente, transbordante, salta como um menino. Por outro lado, começa a ser uma pessoa temível, já que, ao ter intacta sua luminosidade e sua vida limpa, as decisões já não serão um obstáculo para ele. Vai decidir o que seja necessário no momento em que queira e isso assusta aos outros.
Também é aqui que se requer do guerreiro uma dose extra de sobriedade e sensatez, porque do contrário ele correrá riscos desnecessários, pondo em perigo a segurança dele e de outros.
"Outro efeito da recapitulação é que funciona como um convite ao espirito para que venha e faça morada conosco. Dito em outros termos, relembrar nosso passado é o método mais efetivo para unificar os corpos físico e energético que estiveram separados durante anos".
Continuou dizendo que o bruxo que logra recompactar o mais grosso de sua energia está em condições de se propor uma proeza perceptual: intentar uma cópia de sua experiência vital para enganar a morte.
"Tal é o objetivo final da recapitulação: criar um duplo e se preparar para ir. Não é necessário ser um bruxo para entender a importância de tudo isso. Morrer em dívida é uma forma lamentável de morrer. Por outro lado, ter um duplo para oferecer à águia é a garantia de seguir adiante.”
Encontros com o Nagual, pág. 83

· Em outra de suas conversas, referiu-se a um método desenhado pelos novos videntes que pode ajudar no exercício da recapitulação.
Afirmou:
"Uma das tarefas dos bruxos é analisar constantemente as insinuações do espírito. Para isto, eles costumam elaborar um livro de eventos memoráveis, um mapa das ocasiões em que o espirito interveio em suas vidas, obrigando-lhes a tomarem decisões de um modo voluntário ou involuntário".
Explicou que a vantagem desta técnica é que, ao escrever, nós nos desapegamos um mínimo das coisas e conseguimos focalizá-las com mais objetividade.
"Não se trata de descrever nossa rotina diária, mas de estar atentos aos raros momentos em que o intento se manifesta. Essas são conjunturas mágicas, porque produzem mudanças e nos põem diante do sentido de nossa existência".
A pedidos, apresentou alguns exemplos de eventos desse tipo.
"Embora os sinais do espirito sejam um assunto do mais pessoal, há eventos comuns que em geral marcam a vida das pessoas, como nascer, escolher uma carreira, entrelaçar o destino com o de outra pessoa ou ter filhos. Também as doenças e acidentes graves, porque eles estabelecem uma ligação com a morte. Para aqueles que têm a fortuna de achar um conduto do espírito sob a forma de um nagual, este é sem dúvidas o evento mais memorável de todos.”
Encontros com o Nagual, pág. 85

· Porém, o método favorito dos guerreiros é a recapitulação. A recapitulação para a mente de um modo natural.
O principal combustível de nossos pensamentos são os assuntos pendentes, as expectativas e a defesa do ego. É muito difícil de achar uma pessoa cujo diálogo interno seja sincero; o comum é que nós dissimulemos nossas frustrações indo até o extremo oposto. Deste modo, o conteúdo de nossa mente se torna uma ode ao eu.
Recapitular acaba com tudo isso. Depois de um tempo de esforço contínuo, algo cristaliza aí dentro. O diálogo habitual fica incoerente, incômodo; não existe outro remédio senão pará-lo.
É normal que um aprendiz nesta fase se depare com um fogo cruzado. Por um lado, está a homogeneização do seu ponto de aglutinação; e por outro, uns enormes parênteses de silêncio que se metem em sua mente, fragmentando-a.
Quando se esgota a inércia do diálogo interno, o mundo se refaz novamente. A onda de energia se sente como um insuportável vazio que se abre debaixo dos pés. Por tal motivo, o guerreiro pode passar anos de instabilidade mental. A única coisa que o conforta em tal situação é manter claro o propósito do seu caminho e não perder, de nenhuma maneira, sua perspectiva de liberdade. Um guerreiro impecável jamais perde a sensatez.
Encontros com o Nagual, pág. 95

· Como vai sua recapitulação?
A pergunta dele me pegou desprevenido. Respondi que ainda não havia intentado o exercício porque estava esperando para ter condições favoráveis em minha casa.
Lançou-me um olhar muito sério, quase de repreensão, e comentou que, para os bruxos, a totalidade de um caminho se resume em seu primeiro passo.
"Isso significa que as condições ideais são aqui e agora".
Encontros com o Nagual, pág. 104

· Os bruxos manipulam a mente forasteira tornando-se caçadores de energia. É com essa finalidade que minhas companheiras e eu desenhamos para as massas os exercícios de tensegridade que têm a virtude de nos libertar da mente do voador.
Nesse sentido, o bruxo é um oportunista. Aproveita o empurrão que lhe deram e diz a seu captores: 'Obrigado por tudo, nos vemos por aí! O acordo que vocês fizeram foi com meus antepassados, não comigo!'. Ao recapitular sua vida, literalmente está tirando a comida da boca do voador. É como se você chegasse à uma loja e devolvesse o produto ao negociante, exigindo-lhe: 'Devolva-me o dinheiro!'. Os inorgânicos não gostam disso, mas não podem fazer nada.
Nossa vantagem é que somos dispensáveis, há muita comida por aí! Uma posição de alerta total, que não é outra coisa senão disciplina, cria tais condições em nossa atenção que nós deixamos de ser saborosos para esses seres. Em tal caso, eles dão meia volta e nos deixam tranqüilos.
Encontros com o Nagual, pág. 157

· Considerando que há duas formas de viver e de morrer, há também dois tipos de pessoas: aqueles que pensam que são imortais e aqueles que já estão mortos. Os primeiros guardam esperanças, os últimos não. Um guerreiro é alguém que sabe que o tempo dele já terminou, mas continua lutando, porque essa é sua natureza. Se você olhar nos olhos dele, contemplará o vazio".
Então, em que consiste realmente a alternativa do bruxo?".
Há uma única forma na qual o homem pode se adiantar ao seu fim: através da manipulação de sua energia. Esse trabalho consiste de ensonho, espreita e recapitulação. As três técnicas se fundem em um mesmo resultado: o complemento do corpo energético.
Em um sentido geral, a duração de nossa existência depende em grande medida de como tratamos nossa energia. Nós deixamos a vida por assim dizer 'grudada' nos assuntos diários, vamos nos desgastando nas coisas que vemos e tocamos, e por isso morremos. Mas se nós chamarmos de volta toda essa força vital através da recapitulação, a morte já não poderá ser a mesma, porque teremos nossa totalidade.
Encontros com o Nagual, pág. 173

· Tanto o sonho como a recapitulação torna possível a criação do "duplo" energético, uma entidade praticamente indestrutível, capaz de atuar por conta própria.
Um dos descobrimentos mais relevantes dos videntes toltecas, foi que os seres humanos possuem uma configuração luminosa ou campo de energia ao redor de nosso corpo físico. Eles também viram que algum poucos vinham com uma configuração especial dividida em duas partes. A estes chamaram naguais, quer dizer, "pessoas duplicadas". Por sua particular conformação, o nagual tem maiores recursos do que a maioria das pessoas. Eles também viram que, por causa de sua duplicidade e excepcional energia, eles são líderes naturais.
Encontros com o Nagual, pág. 237

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