terça-feira, 8 de julho de 2014

I CHING




O Livro da Transmutação

 

Marcelo Bolshaw Gomes

 

No início, era o Tao. Uno, indivisível, absoluto e eterno; o Tao é o número 1.

Então, veio a Terra. Receptiva, magnética e aberta à vida; a Terra é o número 2.

Em seguida, surgiu o Céu e a luz das estrelas. Criativo, o Céu é o número 3.

E com base nesses números, os antigos calcularam o valor de todas as coisas. Contemplaram as mutações na escuridão e na luz e de acordo com elas estabeleceram os hexagramas. Provocaram movimentos no firme e no maleável, dando origem, assim, às diferentes linhas. Colocaram-se em harmonia com o Tao e a Vida estabelecendo, de acordo com isso, a ordem do que é correto. Refletindo sobre a ordem do mundo externo até as últimas consequências e explorando a lei de sua própria natureza interna em seu núcleo mais profundo chegaram à compreensão do destino.         

 

História

O I Ching, o livro das mutações, é resultante da reflexão taoísta sobre as mudanças da natureza. Como sistema complexo de relações, ele é um sistema de representação de ‘momentos energéticos’, baseados na combinação da energia criativa (yang) com a energia receptiva (yin). Mais do que um simples oráculo, o I Ching é um livro de sabedoria e está presente em toda cultura chinesa: na arquitetura tradicional (Feng Shui), nas artes marciais (Tai Chi Chuan e Kung Fu) e na medicina (acupuntura, Shiatzu, Do in) taoísta.

Ele é formado por 64 hexagramas, diagramas de seis linhas combinadas, que podem ser yin ou yang. Cada hexagrama possui três tipos de texto: a Imagem, o Julgamento e as linhas. No caso de uma consulta ao oráculo, o consulente joga (através de moedas ou varetas) e chega a um determinado hexagrama, representando a resposta do livro à questão indagada. No texto da imagem, o consulente lerá a situação em que se encontra diante da natureza; no texto do julgamento, receberá conselhos de como agir em relação à situação; e no texto das linhas, verá detalhada todas às mutações do ciclo que o hexagrama representa.

Mas, esse formato é recente. O I Ching é um sistema de três mil anos, composto por várias camadas sobrepostas ao longo do tempo. O I Ching surgiu na pré-história chinesa como um conjunto de oito Kua, figuras formadas por três (oito trigramas) e seis linhas sobrepostas (os 64 hexagramas).

A origem dos 64 hexagramas (o texto da Imagem) é atribuída a Fu Hsi, o criador mítico chinês. O tempo obscureceu a compreensão das linhas, e no começo da dinastia Chou (1150-249 a.C.) surgiram dois textos anexados: o Julgamento, atribuído pela tradição ao rei Wên (em suas meditações quando estava preso), e as Linhas, atribuídas a seu filho, o duque de Chou, ambos fundadores desta dinastia. Mais tarde, quando o significado taoísta desses textos também começou a ficar obscuro, foram acrescentadas as Dez Asas (2006, p. 154-283), atribuídas a Confúcio e a Mêncio, no século VI a.C. O taoísmo e o confucionismo são formas bastante diferentes de pensar. O taoísmo é mais holístico, ligado à natureza e está ancorado na teoria dos cinco elementos (água, metal, madeira, ar e fogo); enquanto o confucionismo é mais voltado para ética de conduta em sociedade e para arte de governar. O livro escapou ainda da grande queima de livros feita pelo tirano Ch'in Shih Huang Ti. Nessa época, o I Ching era considerado um livro de magia e adivinhação, e a doutrina dualista do yin-yang foi sobreposta aos cinco elementos mutantes e à visão holística do taoísmo.

Há duas grandes traduções do I Ching para o ocidente: a do filólogo James Legge, a tradução comentada do chinês para o inglês (1882), que ressalta o aspecto histórico e científico, mas acaba reproduzindo interpretações mais recentes do texto (o confucionismo e o dualismo entre yin e yang); e a tradução do místico taoísta, Richard Wilhelm, do chinês para o alemão (1923), com a supervisão do mestre, Lao Nai Suan, que morreu na noite seguinte a ser concluída a tradução.

Elementos e estrutura

O Criativo conhece através do fácil. O receptivo é capaz de agir através do simples. Aquilo que é fácil; é fácil de conhecer. Aquilo que é simples; é simples de seguir. Aquele que é fácil de conhecer; conquistará lealdade. Aquele que é simples de seguir; conseguirá trabalho. Através do fácil e do simples pode-se aprender as leis do mundo inteiro. Na compreensão das leis de todo o mundo; está a perfeição. Tachuan – o grande comentário (2006, p. 217)

 

O Criativo é dinâmico. Através do movimento ele consegue com facilidade unir o que está dividido. Ele, portanto, está livre do esforço, pois atua sobre o infinitesimal, orientando o movimento a partir desse estado mínimo.

    O Receptivo é estático. Através do repouso o mais simples torna-se possível no âmbito do espaço. Essa simplicidade que surge da pura receptividade torna-se o germe de toda multiplicidade existente no espaço.

O Criativo é o Céu, e por isso é chamado o pai. O Receptivo é a Terra e por isso é chamada a mãe. Na união entre a Terra e o Céu, nasceram seis filhos: três homens (o Incitar ou o Trovão; o Abismal ou a Água; e a Quietude ou a Montanha) e três mulheres (a Suavidade ou o Vento; o Aderir ou o Fogo; e a Alegria ou o Lago).

O Criativo é forte. O Receptivo é maleável. O Incitar significa movimento. A Suavidade é penetrante. O Abismal é perigoso. O Aderir significa dependência. A Quietude significa imobilidade. A Alegria significa contentamento.

O Criativo manifesta-se na cabeça; o Receptivo, no ventre; o Incitar, no pé; a Suavidade, nas coxas; o Abismal, no ouvido; o Aderir (o resplendor), no olho; a Quietude, na mão; a Alegria, na boca.  Shuo Kua (2006, p. 210)

 

O firme e o maleável sucedem-se uns aos outros no interior dos oito trigramas. Assim, o firme torna-se maleável; o maleável endurece, tornando-se firme. Desta forma os oito trigramas se convertem uns nos outros numa sequência, e a alternância periódica dos fenômenos se processa.







Ao se praticar Tai Chi Chuan, algo semelhante acontece: a cada expiração a energia yang deve ascender do centro motor ao mental; e a cada inspiração é a energia yin deve subir, passando pelos três momentos.

A esse arranjo dos trigramas em pares de filhos/filhas chama-se Sequência do Céu Anterior ou Pa Kua Primordial. Esse arranjo remonta a Fu Hsi. Isso significa que essa ordenação já existia na época da compilação do Livro das Mutações, durante a dinastia Chou. Nesse arranjo, o Criativo se localiza no sul (representado do lado de cima) e o Receptivo no norte (representado no lado de baixo), correspondendo ao verão e ao inverno, respectivamente.

Há duas direções de movimento: a progressiva, crescente, no sentido horário; e a retroativa, decrescente, no sentido anti horário.

A primeira parte do ponto mais profundo, o Receptivo, terra do passado para o presente; a segunda parte do ponto culminante, o Criativo, céu, do futuro para o presente. Por exemplo: observando que uma semente do passado se tornou árvore no presente (movimento progressivo), podemos prever (regressivamente) que uma semente semelhante no presente se tornará uma árvore semelhante do futuro.

Além disso, os trigramas em pares simétricos (terra/céu, trovão/vento, água/fogo e montanha/lago) se completam e se anulam, garantindo assim a ordem do cosmo, acima de suas mutações e do acaso.

Céu e Terra determinam a direção. Montanha e Lago unem suas forças. Trovão e Vento estimulam-se um ao outro. Água e Fogo não se combatem. Assim, os oito trigramas se interligam.

Shuo Kua (2006, p. 205)

 

Os ciclos do tempo

O Pa Kua do Céu Anterior vem de um tempo imemorial. Nos últimos três mil anos, o Taoísmo se modificou e apareceram outros esquemas de organização dos trigramas, baseados na teoria dos cinco elementos, que são adotados na arquitetura tradicional (Feng Shui) e na etnomedicina chinesa.

Por exemplo, o arranjo de trigramas conhecido como o Pa Kua do Céu Posterior ou Ordem Interna do Mundo – atribuído ao rei Wen e a dinastia Chou. Nele, a distribuição dos trigramas se dá conforme as estações do ano e há uma nova correspondência com os pontos cardeais. Os trigramas são retirados de seu agrupamento em pares de opostos e apresentados segundo a sequência temporal em que se manifestam no plano fenomênico durante os ciclos anual e diário.

Também se estabelecem correlações novas entre os pontos cardeais e os trigramas. Agora o polo sul será o Aderir (fogo); e o norte, o Abismal (água).

Todos os seres surgem no Incitar, que se encontra a leste. Eles chegam à plenitude na Suavidade, que se encontra a sudeste. O Aderir é a luminosidade, na qual os seres percebem-se uns aos outros, e está no sul. O Receptivo significa cuidado, quando os seres se ajudam uns aos outros, e está a sudoeste. A Alegria é o outono, que proporciona contentamento a todos os seres, e está a oeste. Ele luta no Criativo, quando o obscuro e o luminoso incitam-se um ao outro, e está no noroeste. O Abismal significa o esforço a que todos os seres estão sujeitos, e está no norte. A Quietude, onde se consuma o começo e o fim de todos os seres, está no nordeste.

Shuo Kua (2006, p. 213)

 

O conceito de mutação

Mutação significa uma mudança de um estado para outro: de um trigrama para outro ou de um hexagrama para outro. O Livro das Mutações distingue três tipos de fenômenos: o Tao imutável, a mutação cíclica e a mutação não recorrente.

Toda mutação supõe um ponto de referência. O Tao imutável é espaço permanente que torna possível a mutação. Ele também é uma opção constante e uma decisão permanente que estabelece um sistema de correspondências que interliga todas as coisas. O mundo é um sistema de referências integradas, um cosmos, não um caos; graças à ideia do Tao imutável.

A mutação cíclica consiste numa rotação de fenômenos que se sucedem uns aos outros, até que se chega de volta ao ponto de partida – seja no sentido horário (evolutivo) ou anti-horário (involutivo).

 Trigrama
 Natureza
 Direção
Estação do ano
Horário
Fogo
Aderir
Sul
Verão
10:30~13:30
Terra
Receptivo
Sudoeste
13:30~16:30
Lago
Alegria
Oeste
Outono
16:30~19:30
Céu
Criativo
Noroeste
19:30~22:30
Água
Abismal
Norte
Inverno
22:30~01:30
Montanha
Quietude
Nordeste
01:30~04:30
Trovão
Incitar
Leste
Primavera
04:30~07:30
Vento
Suavidade
Sudeste
07:30~10:30

 

A mutação cíclica é a mudança periódica que se produz na vida orgânica, enquanto que a mutação não recorrente nunca retorna a seu ponto de partida. É uma mudança irreversível, uma passagem de um estado para outro fora das sequencias previstas. Ou, como define o tradutor da versão brasileira: “é uma mudança determinada por uma causalidade mecânica” – desconectada das sequências dos ciclos e do condicionamento simultâneo que as forças da natureza exercem sobre si e sobre o todo universo.

A teoria dos cinco elementos

A teoria dos cinco elementos (Wu Xing) é relativamente recente: foi estabelecida e sistematizada por Tsou Yen (Zou Yan), entre 350 e 270 a.C[1]., integrando diferentes saberes tradicionais de forma filosófica.

Ao contrário da teoria dos quatro elementos do ocidente, que acreditava que o fogo, a água, o ar e a terra seriam elementos primários formadores do mundo material; a teoria chinesa pensa seus elementos como 'estados' intermediários entre as mutações, 'mediações', semelhantes ao Pa Kua do Céu Anterior.

A teoria segue a mesma lógica dos Pa Kua's, em que há um movimento circular contínuo externo (nos dois sentidos) representando as mutações cíclicas; e uma simultaneidade interna, 'a Estrela da Dominação', que representa a interação e controle recíproco entre os cinco elementos, determinando a estabilidade do mundo em constante  mudança.

 

O ESQUEMA DOS CINCO ELEMENTOS

Ciclo da Nutrição *
Estrela da dominação
Madeira alimenta o Fogo
Madeira domina a Terra
Fogo alimenta a Terra
Terra domina a Água
Terra alimenta o Metal
Água domina o Fogo
Metal alimenta a Água
Fogo domina o Metal
Água alimenta a Madeira
Metal domina a Madeira

 

 

 

 

   * Invertido, o Ciclo da Nutrição torna-se Ciclo da Destruição e a Estrela da Dominação transforma-se na Estrela da Liberação.

 

A teoria dos cinco elementos interage diretamente com o Pa Kua do Céu Posterior e estabele um conjunto de analogias simbólicas (ou correspondências 'elementais') entre objetos distintos, gerando matrizes de associação que são utilizadas em diferentes áreas (etnomedicina, arquitetura, artes marciais, etc).

Elemento
Direção
Clima
Cor
Gosto
Emoção
Madeira
Leste
Vento
Verde
Azedo
Raiva
Fogo
Sul
Calor
Vermelho
Amargo
Alegria
Terra
Centro
Úmido
Amarelo
Doce
Preocupação
Metal
Oeste
Seco
Branco
Picante
Tristeza
Água
Norte
Frio
Preto
Salgado
Medo

 

Etnomedicina chinesa

A medicina tradicional chinesa é a denominação usualmente dada ao conjunto de práticas terapêuticas em uso na China, desenvolvidas ao longo dos milhares de anos de sua história. Ela é bem mais antiga que o I Ching e, antes dele, se confundia com xamanismo taoísta arcaico do Pa Kua do Céu Anterior, com o exorcismo de demônios e de espíritos animais.

Com o Pa Kua do Céu Posterior, a medicina chinesa passa a se fundamentar em uma estrutura teórica sistemática e abrangente, de natureza filosófica. Ela inclui entre seus princípios o estudo da relação de yin/yang, da teoria dos cinco elementos e do sistema de circulação da energia pelos meridianos do corpo humano.

A medicina chinesa acredita na auto cura do corpo humano e só utiliza a fitoterapia e outros medicamentos como seu último recurso para combater os problemas de saúde. Para ela, o corpo humano dispõe de um sistema sofisticado para localizar as doenças e redirecionar energia para curar os problemas por si mesmo. Os procedimentos terapêuticos externos devem sempre se focar em ajudar cuidadosamente as funções de regeneração e resiliência do próprio corpo, sem interferências. São sete os principais métodos de tratamento da medicina tradicional chinesa: massagens; acupuntura; moxabustão; ventosaterapia; fitoterapia; terapia alimentar; e práticas físicas, como Tai Chi Chuan: exercícios integrados a prática de meditação relacionada à respiração e à circulação da energia.

Tanto tratamento como o diagnóstico usa como referência o sistema de correspondência baseado nos seguintes princípios do I Ching: a relação de Yin/Yang; o esquema dos cinco elementos; e os oito princípios do Pa Kua; acrescentados os meridianos principais de energia espalhados pelo corpo.

Há 12 meridianos principais, seis yin e seis yang entrelaçados entre si em pares opostos; sendo que dez estão relacionados aos cinco elementos e dois (o do pericárdio e o do triplo aquecedor) desempenham um papel mais geral de supervisão e controle.

 

Sistema de meridianos dos órgãos - Yin

Meridiano
Localização
Elemento
Planeta
Fígado
Pés/tronco
Madeira/yin
Júpiter
Coração
Tronco/mãos
Fogo/yin
Sol
Baço- Pâncreas
Pés/tronco
Terra/yin
Saturno
Pulmão
Tronco/mãos
Metal/yin
Júpiter
Rins
Pés/Tronco
Água/yin
Vênus
Pericárdio
Tronco/mãos
O ‘grande yin’

 

Sistema de meridianos das vísceras - Yang

Meridiano
Localização
Elemento
Planeta
Vesícula biliar
Cabeça/pés
Madeira/yang
Marte
Intestino delgado
Mãos/cabeça
Fogo/yang
Mercúrio/lua
Estomago
Cabeça/pés
Terra/yang
Saturno
Intestino grosso
Mãos/cabeça
Metal/yang
Mercúrio/lua
Bexiga
Cabeça/pés
Água/yang
Lua/Saturno
Triplo aquecedor
Mãos/cabeça
O ‘grande yang’

 

Arquitetura tradicional

Feng Shui é a arte chinesa de organização espaço temporal da energia, que estuda a relação do homem com o meio ambiente, baseado na observação das estrelas, dos fatores externos diversos; e da disposição interior dos móveis, cores e objetos de cada local. Esse saber teve sua origem em antigos mestres taoístas que estudavam a natureza e entenderam como a energia se comporta e como pode ser redirecionada para propiciar saúde e prosperidade. 

Comparem-se os benefícios que o Feng Shui pode proporcionar a um espaço aos resultados que a acupuntura pode oferecer a um enfermo. Da mesma forma que o acupunturista, diagnostica os bloqueios na circulação de energia de um paciente e aplica agulhas em uma parte do corpo para curar outra, o consultor de Feng Shui detecta as influências em um ambiente e recomenda medidas em uma área particular do imóvel que são capazes de alterar as características da circulação de energia no todo.

As práticas de Feng Shui também são anteriores ao aparecimento do texto do I Ching, influenciando e sendo influenciadas por ele. Os mestres antigos constataram que o ambiente era influenciado por duas forças fundamentais: vento e água. Em um segundo momento, também consideraram as estrelas da data de fundação do imóvel e do nascimento de seus habitantes (em geral, pelo método dos quatro pilares: hora, dia, mês e ano).

Com o passar dos séculos várias metodologias e técnicas foram criadas e esquecidas. Além do estudo das forças fundamentais do ambiente e das diversas técnicas astrológicas, o Feng Shui passou orientar a escolha do local em que a edificação deve ser construída; determinar o polo norte através de uma bússola astrológica, Lu Pan, associando-o sempre a entrada da casa; e, finalmente, analisar e propor mudanças na organização interna do ambiente de acordo com harmonia entre os cinco elementos.

As escolas de Feng Shui mais conhecidas na atualidade são: a Escola da Forma, ou das Oito Casas (Ba Zhai) linha taoísta mais tradicional; a Escola da Bússola, ou das Estrelas Voadoras (Fei Xin) da tradição taoísta mais contemporânea e complexa; e a Escola do Chapéu Preto, linha norte americana derivada do budismo tântrico tibetano.

Boa parte do Feng Shui divulgado no ocidente deriva dessa última escola, que simplifica consideravelmente a tradição chinesa, eliminando sua referência macro-cósmica, e dando mais ênfase a decoração interna de ambientes do que a construção de casas. Os consultores de Feng Shui dessa escola, de acordo com isso, analisam qual o elemento dominante ou em desequilíbrio, e, conforme os dois ciclos, adicionam ou retiram outros elementos harmonizando assim o ambiente. O Feng Shui fica, assim, reduzido à harmonização do ambiente interior através da teoria dos cinco elementos e de seus dois ciclos.

Para as escolas taoístas, cada avaliação de Feng Shui é única, relativa às influências magnéticas do local, da edificação e de seus habitantes. A base para o entendimento dessas influências é a orientação do imóvel em relação aos campos eletromagnéticos em geral (pontos cardeais, elementos, etc) e as características (históricas e astrológicas) do momento em que foi construído. As escolas taoístas têm metodologias e técnicas diferentes, mas não utilizam os cinco elementos descontextualizados do meio ambiente no qual o imóvel se encontra inserido.

Artes marciais

Embora na versão oficial da República Popular da China, o Tai Chi Chuan tenha sido foi criado por Chen Wangting (1600-1680) na passagem da dinastia Ming para a dinastia Qing; assim como a medicina tradicional e o Feng Shui, as artes marciais chinesas também são anteriores ao texto do I Ching. E também se baseiam no sistema de trigramas. Durante séculos, assumiu várias formas e se inspirou de diferentes modos no Pa Kua (Oito Trigramas), na relação de yin e yang, nos cinco elementos e no sistema de meridianos.

As sequências de movimentos marciais mais antigas conhecidas são parcialmente baseadas no Pa Kua do Céu Anterior; em um período intermediário, os cinco elementos inspiraram estilos de luta e movimentos miméticos dos cinco animais (tigre-metal, dragão-água, urso-terra, macaco-madeira, grau-fogo); e mais recentemente, em suas aplicações mais terapêuticas, há sequências de movimentos direcionadas para o alongamento e energização dos meridianos. Os criadores originais do Tai Chi Chuan basearam sua arte na observação da natureza - não apenas na observação dos animais, mas também no estudo dos princípios da interação entre os diversos elementos naturais.

Como arte marcial, o Tai Chi Chuan, em sua forma atual, se baseia em treze conceitos fundamentais. Estas posturas/movimentos são reconhecidas nas diversas formas praticadas pelos diferentes estilos. Cada escola interpreta estes treze conceitos com pequenas variações. Os treze movimentos são conhecidas como "as oito portas” (associadas aos trigramas do Pa Kua) e “os cinco passos" (relacionados aos cinco elementos).

O uso oracular

Como oráculo, o I Ching tem algumas diferenças com outros métodos. O Tarô, por exemplo, é formado por imagens iconográficas do inconsciente e é interpretado por outra pessoa. Os hexagramas não são ‘imagens do inconsciente’, mas diagramas que representam ideias sobre as transições e mudanças da natureza que governam nossas vidas. E, o mais importante no livro das mutações, é o próprio consulente que interpreta o oráculo, a partir dos textos e de sua imaginação.

O I Ching nunca falha; quem pode falhar é o consulente! Se a pergunta não foi clara e precisa, se a pessoa não tem clareza sobre o que deseja saber, então não entende a resposta. Há pessoas que, para focar a atenção na consulta, rezam ou fazem rituais antes de jogar. Assim, o livro das mutações, mesmo em seu uso oracular, é uma forma de meditação sobre as mutações da natureza, sobre si mesmo e sobre os contextos social e espiritual, em que se está inserida. O I Ching, abrangendo o significado essencial das diferentes situações da vida, dá ao homem condições de construir para si uma vida significativa, realizando, em cada caso, aquilo que a situação exige - segundo uma ordem e sequência perfeitas.

Para o jogador recorrente, o essencial passa a ser como dar à sua vida uma forma que corresponda a essas ideias, de modo a que a própria vida se torne um com as mutações – ou melhor: uma transmutação. Nesse sentido, o I Ching, ao invés de se subintitular o Livro das Mutações, deve-se ser chamado de O Livro da Transmutação.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

WILHELM, Richard. I Ching: o livro das mutações / tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm; prefácio C. G. Jung; introdução à edição brasileira Gustavo Alberto Corrêa Pinto; tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Pensamento, 2006.




[1]    Wikipedia: 

Um comentário:

  1. Muito bom o texto, parabéns Marcelo.
    Esclareceu vários pontos..
    Gratidão. _/\_

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